San Diego Comic-Con 2020

Notícia

Sem "tecnobaboseiras": a relação saudável entre Star Trek e a ciência

Astrofísicos são consultados até na nova série animada, Prodigy, anunciada na Comic-Con

26.07.2020, às 17H12.
Atualizada em 26.07.2020, ÀS 17H42

Star Trek: Prodigy, a recém-anunciada série animada da saga a ser exibida pelo canal Nickelodeon, terá um olhar especial para a ciência apresentada em seus episódios. A informação é de Erin Macdonald, astrofísica que atualmente trabalha como consultora científica para todas as novas produções de Star Trek.

"Com a série da Nickelodeon eu estive muito envolvida", contou a cientista, durante o painel sobre a ciência de Star Trek promovido durante a San Diego Comic Con (assista acima na íntegra). "Eles estão com uma atitude de que podem influenciar uma nova geração, e por isso estão sendo especialmente cuidadosos."

A nova série terá o formato de animação 3D e acompanhará um grupo de jovens rebeldes que tomam posse de uma antiga nave da Frota Estelar e partem nas mais diversas aventuras. A criação é de Kevin e Dan Hageman (Caçadores de Trolls), e a estreia é esperada para 2021.

Macdonald foi trazida recentemente para a franquia. Ela não teve envolvimento com as duas primeiras temporadas de Star Trek: Discovery, ou a primeira de Star Trek: Picard, mas agora trabalha em todas as seis séries em andamento na franquia. Ela contou que seu grau de envolvimento varia conforme o programa. "Em alguns eles só pedem, 'leia e veja se não ferramos com tudo'", disse, rindo.

Liberdade, sem "tecnobaboseiras"

O painel contou também com outros dois ex-consultores científicos de Star Trek: Naren Shankar (que em outra vida foi engenheiro elétrico e começou em Hollywood nos anos 1990, mas hoje todo mundo conhece como o showrunner da série sci-fi The Expanse, do Amazon Prime Video) e André Bormanis (astrofísico que ocupou a vaga de consultoria de Shankar quando ele foi promovido a roteirista e mais tarde se tornou ele próprio roteirista, hoje trabalhando como escritor na série The Orville e como consultor em Cosmos).

O trio deu uma boa medida de como funciona a relação de "amor e ódio" que Star Trek tem com a ciência; ao mesmo tempo em que a série sempre prezou pela plausibilidade, nunca permitiu que os limites impostos pela ciência obrigassem ao descarte de uma história que os roteiristas consideravam dramaticamente atraente.

O painel não contava com representantes da consultoria científica durante a série original, produzida entre 1966 e 1969, mas mesmo assim eles foram lembrados. O criador de Star Trek, Gene Roddenberry, estava determinado a levar a ciência em consideração desde a largada, e para isso contou com o astrofísico Harvey Lynn, da RAND Corporation, e a consultoria de Kellam de Forrest. No primeiro filme para cinema, em 1979, a franquia teve seu consultor científico mais famoso: Isaac Asimov.

"Se não há uma fundação crível, você perde a audiência", comentou Bormanis. "Essa foi a genialidade de Gene Roddenberry ao criar. Ele queria que a Enterprise parecesse um lugar real."

Naren Shankar veio a bordo durante a produção de A Nova Geração, numa época em que o que ficou conhecido como "technobabble" (ou "tecnobaboseira", as descrições pseudocientíficas usadas nos episódios como forma de prover soluções para a trama) estava atingindo um momento de auge em Star Trek.

"Não era realmente ciência. Era mais sobre a ciência inventada de Star Trek. Mais sobre a lógica interna", disse, em seguida contando uma história divertida que ilustrava bem esse ponto. "Sabe o gerador de tecnobaboseira? Era aquela coisa de uma coluna com uma partícula, uma coluna com um efeito e tal... um amigo meu me mandou aquilo como piada. E eu coloquei na parede do meu escritório, e o pessoal começou a usá-lo de verdade para escrever diálogos! Isso encapsula a situação da ciência na série."

Ficaram famosos na época os roteiros em que os escritores simplesmente escreviam "tech the tech tech" em diálogos, e cabia aos consultores, como Shankar ou Bormanis, preencher os trechos com algo que soasse plausível.

No fim, eles indicam que a relação entre a consultoria científica e a sala de roteiristas precisa seguir ser orientada de forma produtiva. "É importante ser uma influência positiva na sala. Dizer 'Sim, e...', e não simplesmente 'não, a ciência diz não'", ilustrou Macdonald. Bormanis seguiu na mesma trilha: "Eu nunca sugeri derrubar alguma coisa sem ter uma alternativa para propor". E Shankar deu risada, dizendo "eu disse muitos nãos, falei muitos 'isso não faz o menor sentido'".

E houve casos em que os consultores científicos salvaram o dia para os roteiristas? Erin Macdonald, que por ora só trabalhou em episódios não exibidos, riu e respondeu: "Pergunte isso de novo no ano que vem."

(o)

Salvador Nogueira é jornalista de ciência e editor da Coleção Trek Brasilis, série de livros-reportagem que abordam os mais variados aspectos da saga de Star Trek.

 

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Ao continuar navegando, declaro que estou ciente e concordo com a nossa Política de Privacidade bem como manifesto o consentimento quanto ao fornecimento e tratamento dos dados e cookies para as finalidades ali constantes.