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Star Trek: Discovery apresenta bem sua nova heroína, mas não diz a que veio dentro da franquia

Dois primeiros episódios funcionam como prólogo para a história de Michael Burnham

26.09.2017, às 20H09.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H45

Star Trek sempre foi sobre abraçar as diferenças. Nas viagens da Frota Estelar, seja na nave comandada por Kirk, Picard e tantos outros, a ordem é explorar a fronteira final - o espaço - audaciosamente indo onde ninguém jamais esteve antes. Logo, nada mais natural que Star Trek: Discovery, a nova série da criação de Gene Roddenberry, chegue em 2017 estrelada por duas mulheres, uma negra (Sonequa Martin-Green) e outra asiática (Michelle Yeoh). A proposta é levar a franquia de 51 anos para onde a TV jamais esteve.

A temática dos dois episódios de estreia - “The Vulcan Hello” e  “Battle at the Binary Stars” - trabalha não apenas a ideia de diversidade, mas das relações entre os diferentes. Seja pelo conflito com os Klingons, povo que vê o discurso diplomático da federação como uma ameaça a sua cultura, seja pelo arco da Michael Burnham (Martin-Green), a primeira humana a receber educação Vulcana. Sua disputa é individual, usando a lógica como uma ferramenta de defesa para os traumas do seu passado. Essa tática falha quando o seu raciocínio se torna emocional e o mais correto passa a ser quebrar as regras, o que a coloca em conflito com a Capitã Georgiou (Yeoh).

Apesar de ter Sarek (James Frain), o pai de Spock, como mentor, seu drama não é exatamente o mesmo do famoso oficial de ciências vulcano. Burnham não está entre a lógica e a emoção, ou em aprender a aliar uma coisa a outra. Ela precisa apenas lembrar que não existem absoluto, que não existe uma fórmula para cada situação. Os dois primeiros episódios a jogam em meio a um inesperado conflito com os Klingons para explorar completamente a sua personalidade e apontar que o título não se refere apenas ao nome de uma nave ou ao espírito aventureiro da série. Trata-se de uma descoberta pessoal.

Da contribuição de Bryan Fuller, que desenvolveu a série inicialmente, mas se afastou por divergências criativas, Star Trek: Discovery aproveitou o esmero visual do produtor/roteirista. Das cenas com os Klingons, na nave Shenzhou ou em uma simples missão em um planeta desértico, a qualidade e a quantidade de detalhes são impressionantes. Akiva Goldsman, seu substituto, um roteirista veterano da franquia (responsável pelos scripts do filme de 2009 e de Sem Fronteiras, de 2016), ficou encarregado de dar a Discovery um tom familiar, abraçando suas inovações dentro de um universo preexistente. Saru, o oficial alienígena vivido por Doug Jones é um bom exemplo dessa combinação entre as visões de Fuller e Goldsman. Sua aparência se destaca pelo design e o realismo, enquanto seus diálogos são Star Trek puro, cheios de humor involuntário e lições existenciais.

O problema dessa apresentação inicial de Star Trek: Discovery é que, embora inicie bem a jornada da sua protagonista, a série apenas teoriza a que veio. Grande parte do elenco principal, incluindo o Capitão Gabriel Lorca (Jason Isaacs), ainda precisa ser apresentado, tornando o próximo episódio uma nova introdução, o que pode prejudicar a sua relação com um novo público. A sua indecisão narrativa é outra negativa, com os dois primeiros capítulos revelando uma construção tão confusa sobre o que fazer quanto a sua heroína. Idealizada para a era do streaming, a série mantém-se semanal e em uma estrutura de TV aberta, com respiros para comerciais inexistentes. Isso atrapalha o fluxo de uma narrativa escrita por etapas, não por ganchos. 

A nova série de Star Trek ainda precisa provar que está mesmo no caminho da sua proposta de inovação, indo além de um discurso de diversidade que já éintrínseco à franquia. Por enquanto, seus dois primeiros episódios podem ser considerados um prólogo para a jornada de Michael Burnham que, espera-se, descobrirá em breve o seu papel dentro desse universo. 

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