The Leftovers | Final explicado da série
Entenda o desfecho da história que marcou época na TV internacional
Exibida originalmente entre 2014 e 2017, The Leftovers se converteu em uma das séries mais aclamadas de todos os tempos – razão por que é recordada até hoje pelos fãs que angariou em todo o mundo.
Inspirada no romance homônimo de Tom Perrotta (que também atua como roteirista e showrunner da série), a história se desenvolve a partir de um enigmático evento global batizado de “Partida Repentina”, em que 2% da população mundial simplesmente desapareceu da Terra, sem deixar rastros ou qualquer explicação para esse fenômeno.
O fato impactou profundamente a vida daqueles que, como o próprio título sugere, foram “deixados para trás” por seus entes queridos. Enquanto seitas e religiões tentam encontrar em seus dogmas uma justificativa transcendental para algo que a ciência não é capaz de elucidar, amigos e familiares dos que se foram tentam ressignificar suas vidas na ausência daqueles que amam e já não estão.
Entre estes, estão Nora Durst (Carrie Coon), uma mulher que perdeu os dois filhos e o marido na Partida Repentina – e não se conforma com a falta de notícia deles; seu irmão Matt Jamison (Christopher Eccleston), um ex-reverendo que se ressente do fato de ter sido deixado de lado no evento que se assemelha ao arrebatamento prometido na Bíblia; e o chefe de polícia Kevin Garvey (Justin Theroux), cuja esposa, Laurie (Amy Brenneman), abandona-o para se juntar a uma seita niilista que emergiu após os desaparecimentos.
Como termina The Leftovers?
Após três temporadas de imenso sucesso, a série chegou ao fim em 4 de junho de 2017, oferecendo um desfecho carregado de emoção, lirismo e reflexão – embora poucas explicações concretas, inclusive no que tange ao fenômeno que desencadeou o enredo.
Depois de anos vivendo em função do sumiço de sua família, Nora é surpreendida com o contato de uma suposta corporação científica, que afirma ter descoberto uma maneira de transportar pessoas ao lugar onde os desaparecidos estão.
Um misto de esperança, dúvida e aflição toma conta da protagonista. Prudentemente, ela cogita que tudo não passe de um golpe, até porque o “serviço” em questão envolve um preço nada razoável. Em um primeiro momento, Nora chega a supor que os autores da proposta estariam apenas se aproveitando do desespero que tomou conta do mundo após a Partida Repentina para tomar dinheiro de seus clientes e simplesmente incinerá-los.
No entanto, a vontade de reencontrar Doug (Sebastian Arcelus), Erin (Ella Taylor) e Jeremy (Anthony Cieslak) é maior do que o medo de morrer – e, principalmente, de seguir vida sem nunca mais saber nada deles. Nora decide, então, correr o risco e (literalmente) pagar para ver.
O último episódio da série mostra a personagem entrando na suposta máquina telecinética, que começa a se encher de água ao seu redor. Nesse momento, ela entra em desespero e grita algo que o público não entende – e nem vai entender, porque a ação é abruptamente cortada por uma passagem de tempo.
O reencontro entre Nora e Kevin
Vemos então uma Nora mais velha, vivendo uma vida tranquila e isolada, 15 anos depois, em uma casa afastada na zona rural da Austrália. Sua pasmaceira é interrompida por uma visita inesperada de Kevin, tocando-lhe à porta. Para seu desconcerto, ele age como se não se lembrasse do romance que viveram ao longo da série e a trata como se fossem apenas conhecidos de vida.
Mesmo sem entender a atitude do ex-affair, Nora aceita encontrá-lo em outro lugar, onde toma coragem para questioná-lo sobre essa amnésia tão repentina a respeito dela. É aí que Kevin decide abrir o jogo: ele se lembra, sim, de tudo o que viveram juntos – tanto é verdade que passou os últimos 15 anos viajando pela Austrália, à procura da própria Nora.
“Mas eu não sabia o que dizer quando te achei. Então pensei: ‘Dane-se! Vou ‘apagar’ tudo. ‘Apagar’ tudo mesmo, e talvez isso nos dê outra chance.' Mas você estava certa. Não é verdade que eu não me lembrava”, admite o ex-chefe de polícia.
Ele, então, pergunta a Nora o que lhe aconteceu depois que ela se propôs a fazer a viagem telecinética que a levaria até sua família desaparecida. E a explicação dela o deixa de boca aberta.
Nora explica que levou até o fim a experiência pela qual pagou e que, quando concluiu a travessia, viu-se em uma realidade alternativa de seu próprio mundo, onde quem havia desaparecido eram os 98% remanescentes. A situação era, portanto, inversa: ali, eram os outros 2% que haviam sido deixados para trás, chorando a falta de notícias de seus entes queridos.
O tão ansiado reencontro com os familiares, entretanto, não foi o que Nora esperava. Seus filhos Erin e Jeremy estavam mais velhos, mais maduros, haviam seguido com suas vidas e não pareciam sentir tanta falta da mãe como ela deles. Já o marido, Doug, havia engatado um novo relacionamento amoroso, razão por que a volta repentina da ex lhe resultava não um alívio, mas um incômodo.
“Eu entendi que, naquele lugar, eles eram os sortudos. Em um mundo cheio de órfãos, eles ainda tinham uns aos outros, e eu era um fantasma. Eu era um fantasma que não tinha lugar ali”, desabafa ela.
Nora, então, teria descoberto uma forma de voltar à realidade de onde veio e preferido se isolar a procurar qualquer um dos velhos conhecidos – inclusive Kevin. “Eu quis estar com você? Claro que sim. Mas sabia que, se eu te contasse o que aconteceu... Você nunca acreditaria em mim”, justifica.
Para sua surpresa, porém, o ex-marido de Laurie deixa claro que não duvida da veracidade de seu relato – o que provoca uma reação aliviada em Nora. A cena final mostra os dois juntos, de mãos dadas, felizes, reconciliados e rumo a uma nova vida lado a lado.
Uma reflexão sobre a fé
É importante observar que a explicação do que aconteceu com Nora após a suposta viagem telecinética baseia-se pura e exclusivamente no relato da personagem. Não há imagens em flashback, não há testemunhas dos supostos fatos – apenas a palavra dela contra a absoluta falta de evidências.
Mesmo assim, Kevin opta por acreditar em sua amada ao invés de pôr em dúvida o que ela diz. O público, por sua vez, vê-se diante da mesma necessidade de escolha do personagem. Cada telespectador pode entender que Nora inventou tudo isso como uma ferramenta para se justificar diante de Kevin – ou também para consolar a si mesma, após anos de perguntas sem respostas – ou pode fazer como o ex-policial e dar crédito à versão dela, mesmo sem qualquer prova concreta.
O desfecho de Nora e Kevin, portanto, resume a mensagem que permeou toda a narrativa de The Leftovers. Quando a ciência, o saber concreto, não é suficiente para preencher as lacunas da dúvida e da incerteza, resta apegar-se às respostas (talvez vagas, mas alentadoras) que a fé, em seus mais variados tipos, pode oferecer – ou então permanecer cético, abraçar de vez essa irresolução e adaptar-se a ela. Kevin fez sua escolha, o telespectador faz a sua… Todos escolhemos, o tempo todo, de alguma forma e em algum momento.