Um Bom Garoto joga no seguro - até a hora da porrada

A diretora Shim Na-yeon (The Good Bad Mother) parece estar adormecida no volante durante uma parte considerável do primeiro episódio de Um Bom Garoto, novo k-drama do Prime Video. Conforme a produção nos apresenta aos ex-atletas condecorados que protagonizam a sua trama, agora resignados a posições largamente burocráticas dentro de um departamento de polícia no interior da Coreia do Sul, Shim e o roteirista Lee Dae-il (Chefe de Gabinete) vão enfileirando cenas protocolares na chave atrevidamente cômica - por vezes, até em momentos inapropriados - que define tantos dos k-dramas de ambientação contemporânea. O chefe folgado que chuta a canela dos subordinados, o homem de meia-idade sem perspectiva de triunfo econômico, a relação de amor-e-ódio entre os dois protagonistas românticos da trama… enfim, você conhece o procedimento.

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Isso até os últimos 15 minutos do capítulo, é claro. Uma vez que o ex-boxeador Yoon Dong-ju (Park Bo-gum) entra em um barracão suspeito para enfrentar o chefão do crime Golden Bunny (Kang Gil-woo) e seus capangas, Um Bom Garoto se transforma, muito repentinamente, em uma aula de cinema de ação visualmente audacioso. Shim mantém sua câmera obstinadamente focada no protagonista durante o confronto, inicialmente em uma tomada ininterrupta de pelo menos um par de minutos, limitando os movimentos ao absolutamente necessário enquanto ele despacha criminoso após criminoso com socos e pontapés, se enfiando embaixo de um andaime para conseguir enfrentar vários deles de uma só vez, e finalmente utilizando um estoque de tintas neon convenientemente localizado para cegar os oponentes e, no caminho, pintar o cenário ao seu redor em uma obra-prima de arte abstrata clubber dos anos 2000.

Quer mais? O clímax de “Our Twisted Hero” (1x01) não se limita a uma grande cena de ação, porque simultaneamente à luta de Dong-ju também vemos seus companheiros enfrentando desafios próprios A campeã de tiro esportivo Ji Han-na (Kim So-hyun) dá piruetas e saltos impressionantes com um rifle em riste, filmados em gloriosa câmera lenta por Shin, para despachar criminosos que invadem sua casa em busca de um documento. O esgrimista Kim Jong-hyeon (Lee Sang-yi) usa um cabo de vassoura quebrado como espada para enfrentar policiais corruptos, com o ator usando o seu treinamento em musicais teatrais na Coreia para transformar os movimentos do personagem em um verdadeiro balé de violência. E o arremessador de peso Shin Jae-hong (Tae Won-seok) simplesmente levanta uma tampa de bueiro da rua para atirar na direção de um carro que estava prestes atropelá-lo - objetivamente, a coisa mais incrível que vimos em termos de ação este ano. 

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São 15 minutos absurdamente excitantes, de um ponto de vista estético e visceral - mas é o bastante para sustentar uma série? A resposta vai depender da proclividade de cada espectador, do quanto de drama e comédia liminarmente competente ele é capaz de assistir em busca da recompensa de uma dose de adrenalina como poucas que o cinema e a TV de 2025 são ou serão capazes de prover. Não é como se não houvesse nada do que gostar quando Um Bom Garoto ainda não está “nos finalmentes”, mas este começo da série deixa claro que ela foi feita para jogar no seguro - pelo menos, até a página dois.

O seguro, por exemplo, é dar o papel principal para Park Bo-gum. Com um sorriso incandescente e uma abordagem leve às idiossincrasias mais irritantes do personagem, o ator (que acaba de vir do sucesso meteórico de Se a Vida te Der Tangerinas) conquista a aliança do espectador sem nenhum esforço - mas também sabe emprestar profundidade ao seu Dong-ju, e nos emaranhar nas mágoas que ele guarda pela forma como foi tratado após o triunfo esportivo que definiu sua carreira. Um Bom Garoto tem a missão difícil de nos fazer empatizar com pessoas que alcançaram uma glória impossível para a maioria de nós, mas Bo-gum faz bem o trabalho de nos mostrar que vivem angústias e desapontamentos também dentro dessas pessoas.

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É na força dele que a série se apoia durante os momentos menos inspirados em que precisa nos carregar de uma cena de ação para a outra. Funciona até por ser a combinação de dois interesses distintos: Bo-gum e seus colegas de elenco estão preocupados em convencer como personagens, e a diretora Shin está preocupada nos impressionar na próxima trocação honesta entre polícia e ladrão. Um lado ainda funciona melhor do que o outro, é claro, mas a combinação tem seu charme.