Cena de Better Man: A História de Robbie Williams (Reprodução)

Créditos da imagem: Cena de Better Man: A História de Robbie Williams (Reprodução)

Filmes

Entrevista

WETA “não achava que Better Man ia dar certo”, mas filme foi parar no Oscar

André Castelão está no time que foi indicado à premiação pelo trabalho na cinebiografia

Omelete
7 min de leitura
10.03.2025, às 06H00.
Atualizada em 10.03.2025, ÀS 13H11

Parte do time da WETA FX desde 2013, quando foi contratado para trabalhar na trilogia O Hobbit de Peter Jackson, o brasileiro André Castelão revelou ao Omelete que a equipe da empresa de efeitos especiais não levou muita fé no conceito de Better Man: A História de Robbie Williams quando o diretor Michael Gracey bateu à porta apresentando o projeto.

Topar o desafio de criar um macaco inteiramente em CGI para representar o cantor britânico em sua cinebiografia, no entanto, deu frutos: uma indicação ao Oscar 2025 da categoria de VFX. Passado o furor da premiação, e conforme Better Man se aproxima do lançamento no Brasil - o longa chega aos cinemas nacionais em 13 de março - Castelão contou ao Omelete um pouco sobre os bastidores da produção.

OMELETE: Eu acho que Better Man pegou muita gente de surpresa, até por estarmos em um momento de alta das cinebiografias, mas elas sempre seguirem um mesmo padrão, serem um pouco chapa branca. Como você, que leu o roteiro e ficou sabendo da proposta antes de todo mundo, reagiu à ideia do filme, e como foi ver aquilo saindo da página e se tornando realidade?

André Castelão: Realmente, pegou todo mundo de surpresa. Ninguém [na WETA] imaginava que fosse fazer uma biopic, como eles chamam, com um personagem digital. Eu não participei das negociações e do desenvolvimento do roteiro, mas quando chegou para a gente, foi um grande desafio: ‘Vamos ter que fazer um personagem que vai cantar, dançar?’. A WETA já fez muitos macacos antes, seja em King Kong ou na trilogia Planeta dos Macacos, mas isso aqui foi totalmente diferente, principalmente por ele contracenar o tempo todo com pessoas reais no filme. Até então, a gente sempre fez macacos digitais contracenando com outros macacos digitais, com cenários que tinham poucos elementos reais, enfim… Foi estranho mesmo, e no começo a gente pensou: ‘Caramba, isso daí não vai funcionar’. 

Mas, quando a gente começou a receber o modelo do personagem, as ideias de como ele iria contracenar [com as pessoas reais], como seria a edição, começou a entender o ritmo do filme, a parte do drama, isso foi mudando. E quando começamos a ver o resultado final, o nosso personagem renderizado ali e colocado na cena com os humanos reais, nos cenários de verdade, fomos percebendo que estava muito crível, muito real. Todo mundo aqui ficou impactado de ver que realmente estava funcionando, que realmente ia dar certo.

Acho que o público vai ter essa mesma reação. Muita gente vai achar estranho no início, mas após alguns minutos, você acaba ficando envolvido com aquela história, com o drama e com o realismo do personagem, da emoção dele. Foi tudo muito bem detalhado, bem trabalhado. Você pode entrar no cinema pensando ‘caramba, vou ficar olhando para o macaco de CGI por duas horas’, mas esse estranhamento vai sumindo. Temos tido um feedback ótimo até agora, as pessoas estão dizendo que o visual ficou incrível. 

OMELETE: Em Better Man, o macaco de CGI está lá para representar o Robbie Williams - e ele mesmo faz a voz do personagem, enquanto a captura de performance ficou com o Jonno Davies. O quanto esses dois intérpretes foram parte do processo de construir os efeitos especiais, e de que forma vocês trabalharam para aproximar o personagem digital do Robbie, que no fim das contas é uma figura bem conhecida do público?

André: Então, o Robbie é 100% da referência visual do personagem. Primeiro, a característica física dele - o rosto do macaco foi modelado em vários detalhes para ter semelhança com o Robbie, seja nos olhos, na boca, enfim. Depois, a forma como ele age em certos momentos, como olha, como sorri, entendeu? Incorporamos alguns cacoetes assim. Sem contar as tatuagens dele, é claro, que estão lá no corpo do personagem. Fizemos 100% o Robbie ali no macaco, e acho que ficou bem bacana. Mas a parte da atuação é outra história.

Better Man mostra esse macaco cantando, chorando, sorrindo, passando por uma série de problemas. Tudo isso foi trazido pelo Jonno, que fez a captura de movimento, que estava no set todos os dias. Ele foi o ator principal do filme, quando se trata da emoção do personagem, mesmo que a gente trouxesse referências do Robbie quando fôssemos finalizar a cena - filmagens dele, shows que ele fez, entrevistas que deu no passado, tudo era disponibilizado para os animadores enquanto estavam trabalhando. Às vezes eles olhavam para essas gravações quando precisavam ver como o Robbie sorri, qualquer coisa do tipo, mas ao mesmo tempo eles já tinham o que o Jonno fez nas gravações para trabalhar em cima. O Robbie foi a referência, e o Jonno foi a base.

OMELETE: Como você mencionou, outro de seus trabalhos foi na trilogia Planeta dos Macacos, onde teve que criar vários símios bem expressivos - mas aqueles eram filmes de ação, de aventura, e Better Man é um musical. Quão diferente é fazer um macaco lutando, e um macaco dançando? Que tipos de adaptações vocês tiveram que fazer nos processos de produção?

André: Ah, é bem diferente. Até porque, em Planeta, os macacos são macacos mesmo - o jeito que eles andam, se movem… a referência eram gorilas, orangotangos, enfim. Vimos muitos vídeos de zoológico, por exemplo. Por mais que eles fossem interpretados por atores humanos, quando eles tinham que correr em cena, corriam em quatro patas, entendeu? Também tínhamos que pensar em vários personagens diferentes, com designs diferentes, e atores com estilos de performance diferentes interpretando cada um deles. Então foi realmente muito complicado, criar essa individualidade e manter a característica do macaco.

Em Better Man, o Robbie Williams não age como um macaco. Ele é um humano que está ali, sendo representado no corpo de um macaco. As proporções são humanas - braços um pouco maiores, por exemplo -, ele não anda em quatro patas… ele contracena ali com humanos e age da mesma forma que eles. Talvez algumas pessoas até pensem que só o rosto dele foi feito digitalmente, e que o corpo foi do ator, ou que substituímos só um braço aqui e uma perna ali quando necessário, mas não, é 100% digital. Só é um macaco com mais características humanas do que normalmente fazemos.

Por fim, esse macaco canta. Em Planeta dos Macacos, nenhum deles cantava - só falavam, lá perto do último filme, conforme a evolução deles foi seguindo. O Robbie conversa, chora, faz tudo que um humano faz, e essa proximidade com o humano elevou a complexidade do nosso trabalho. Pode parecer um pouco mais fácil, para quem olha de fora, mas garanto que não. Ficou mais complexo porque tínhamos que pensar em como ele ia ficar contracenando com o mundo real, como fazer ele agir de forma humana naquele corpo.

OMELETE: A gente viveu um momento bem especial com o Brasil no Oscar 2025. Tivemos as indicações/vitórias de Ainda Estou Aqui, o seu trabalho em Better Man, o diretor de fotografia brasileiro Andrea Gavazzi no curta A Lien. Como você enxerga esse momento, e o que significou esse Oscar para você?

André: Para a gente em Better Man, só ter sido nomeado para Melhores Efeitos Especiais foi um grande prêmio - porque é um filme um pouco menor em relação aos indicados usuais nessa categoria, os filmes grandes da Marvel ou da Disney, principalmente porque eles têm mais visibilidade do público. E quem vota no Oscar é o público todo, não só o pessoal que entende os bastidores da área de efeitos visuais, entende? E além de ser uma produção menor, menos vista, esse público pode olhar para o nosso filme, ver que é um personagem digital só, e achar que foi um trabalho mais fácil. Eles não vão ter a dimensão da complexidade que é fazer aquilo.

Eu também trabalhei nesse Planeta dos Macacos [O Reinado] que foi indicado, então são dois filmes do qual fiz parte. Claro que é uma equipe muito grande que trabalhou em cada um deles, centenas de profissionais, e não sou o único que fez os dois filmes. É um reconhecimento maravilhoso, independente de ganhar ou não. E também estou lá representando a WETA, a empresa, o que é fantástico, porque eu sei da dedicação e da paixão de cada profissional que trabalha comigo. É um nível de exigência muito alto que estava chegando para a gente, em termos de realismo, de credibilidade dos personagens. Então é gratificante.

Com as outras produções brasileiras, eu vou confessar que não tenho acompanhado tanto filme a filme, porque o meu foco é mais nos efeitos visuais mesmo. Mas acho espetacular ter esse reconhecimento em relação a uma produção brasileira, estar ali no Oscar. Fico muito feliz, com certeza, de ver isso acontecendo.

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