Cena de Twinless (Reprodução)

Créditos da imagem: Cena de Twinless (Reprodução)

Filmes

Crítica

Twinless sabe que toda boa história precisa abrir espaço para a humanidade

Filme faz representatividade sem hipocrisia - e é tão bom na comédia quanto no drama

Omelete
4 min de leitura
31.01.2025, às 14H50.

Dentro do Festival de Sundance 2025 existem dois lobos - e os dois são (mais do que) um pouco gays. No meu primeiro dia em Park City, Jimpa tentou se provar o filme certo para uma nova geração de representatividade queer, mas esbarrou na própria vontade de ser convencional (e declaratório). No meu segundo dia, assisti Twinless. Dirigido, escrito e estrelado por James Sweeney, que já havia chamado a atenção do público indie em 2019 com a sua história de amor assexual Almas Gêmeas, o longa deixa de lado os discursos, e a política da respeitabilidade, para contar uma história (não só) LGBTQIAPN+ que cativa, emociona e representa, mas justamente por não ser fiel a nenhuma história - com ou sem H maiúsculo - que não seja a sua própria.

Por falar em história: Twinless é sobre Dennis (Sweeney) e Roman (Dylan O’Brien) - o primeiro gay, e o segundo hétero -, que se conhecem em um grupo de apoio destinado a pessoas que perderam seus irmãos gêmeos, e desenvolvem um vínculo de amizade baseado em ser, um para o outro, aquilo que seus idênticos não podem mais ser. A partir daí, é claro, o texto poderia se caminhar com muita facilidade para uma dramédia urbanoide sobre luto e reabilitação, ou para um romance de descoberta queer, ou para uma história sobre o pixie magic dream gay que muda a vida do rapaz hétero de quem se torna amigo… mas Sweeney não está interessado em caminhos fáceis, e uma reviravolta logo no primeiro ato do filme mostra que as coisas, aqui, nunca vão ser exatamente como imaginamos.

Falando assim, até parece que o longa se envereda pela fantasia ou pelo horror, mas Twinless não precisa disso para surpreender. A matéria da qual Sweeney tira a sua história curiosa é a humanidade, em suas decisões de base mais irracional, seus instintos mais descontrolados, seus erros mais fatais. Em Dennis e Roman - e nas pessoas que os cercam -, o roteirista parte de alguns arquétipos, por vezes até maldosos e datados, para desenhar seres humanos que são críveis justamente nas falhas que Twinless exagera para efeito cômico (e, inclusive, com muita eficiência). No fundo, é claro, essa é uma dramédia de luto e reabilitação, mas não é uma que se debulha em soluções fáceis, que foge da raiva e das consequências dela, ou que deixa de mostrar o lado patético desse pesar.

Os atores, é óbvio, se agarram na oportunidade de interpretar essa riqueza emocional com unhas e dentes. Se o trunfo de O’Brien sempre foi guardar profundidade insuspeita por baixo de carisma de superastro, Twinless é o filme que melhor instrumentalizou esse talento até hoje - como Roman, ele constrói um personagem emocionalmente imaturo (e também um pouquinho burro, como o filme gosta de brincar) pelo qual é difícil não sentir, e mostra a inadequação de suas expressões sentimentais mais extremas pelo que elas são: falhas a serem superadas. Por outro lado, Sweeney se dá não só as melhores piadas do filme, como também a missão dramática quase impossível de nos fazer entender, por mais que não deixemos de condenar, um personagem que mente, manipula, subestima e fantasia. Acontece que ele consegue.

Ainda por cima, Twinless é realizado com sensibilidade e insight. Com seu colaborador habitual, o diretor de fotografia Greg Cotten, Sweeney cria enquadramentos que posicionam seus personagens em um mundo fragmentado por espelhos, molduras e divisões de tela - quem entra e sai da vista da câmera sempre importa, até para frisar quem está por dentro ou por fora das dinâmicas e relações que vão se formando naqueles cenários. É uma história contada em cores e movimentos tanto quanto é contada em tiradinhas irônicas ou grandes monólogos dramáticos (o filme tem os dois, e faz os dois muito bem). É cinema como meio visual dentro de um gênero que é frequentemente subestimado como tal.

No fim das contas, a verdade é que Twinless tem todas as armas para se posicionar como uma história de pessoas se comportando muito mal, até injustificadamente mal… mas que nunca nos aliena porque lhe sobra charme, é claro, mas principalmente lhe sobra verdade. Verdade, diga-se de passagem, que é impossível de encontrar quando se aparam todas as arestas de quem somos a título da aceitação.

Nota do Crítico
Excelente!
Twinless
Twinless

Ano: 2025

País: EUA

Duração: 100 min

Direção: James Sweeney

Roteiro: James Sweeney

Elenco: Lauren Graham, Dylan O'Brien, Aisling Franciosi, James Sweeney

Onde assistir:
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