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Mestres do Ar tem em elenco afiado e produção suntuosa os seus maiores méritos

Abandonada pela HBO por alto custo, minissérie do Apple TV+ é superprodução nostálgica

Omelete
5 min de leitura
26.01.2024, às 16H09.
Atualizada em 27.01.2024, ÀS 17H21

Em desenvolvimento desde 2013 e orçada em cerca de US$ 250 milhões, Mestres do Ar levou a dupla de produtores executivos Tom Hanks e Steven Spielberg a quebrar uma parceria de décadas com a HBO, encontrando no Apple TV+ uma nova casa. Sequência espiritual de Band of Brothers (2001) e The Pacific (2010), a minissérie de nove episódios retoma a II Guerra Mundial com a mesma promessa de reverência e precisão histórica que suas antecessoras, mas agora deixando de lado a perspectiva da Infantaria e dos Fuzileiros Navais para focar na Aeronáutica. Reunindo um elenco vasto e repleto de jovens estrelas em ascensão, a superprodução, que estreia nesta sexta-feira (26), não demora para mostrar o porquê de um investimento tão alto: entre figurinos caprichados, sets ostensivos e sequências intensas desenvolvidas com tecnologia de ponta, Mestres do Ar tem no espetáculo visual um de seus principais chamarizes.

Dirigidos por Cary Joji Fukunaga (True Detective, Maniac, 007 - Sem Tempo Para Morrer), os dois capítulos iniciais da série, “Parte Um” e “Parte Dois”, se encarregam de apresentar o topo da hierarquia da 100ª Companhia de Bombardeiros, a importância dos mecânicos para a Aeronáutica, e as diferentes táticas de combate dos integrantes das Forças Aliadas (em especial, um comparativo entre os ataques diurnos dos aviões norte-americanos e noturnos dos britânicos). Adaptando à telinha o livro Masters of the Air: America's Bomber Boys Who Fought the Air War Against Nazi Germany, do historiador Donald L. Miller, a narrativa do início da minissérie estabelece os alicerces para destrinchar como essa esquadrilha em particular passou a ser chamada de “Centésima Sangrenta”.

Para isso, os criadores e showrunners John Shiban e John Orloff (que também assina os roteiros, 23 anos depois de escrever dois dos 10 episódios de Band of Brothers) se apoiam em um elenco que mescla jovens talentos norte-americanos e britânicos em um grupo repleto de química e entrega. Austin Butler (Elvis) e Callum Turner (A Última Carta de Amor) abrem a série com muito carisma e naturalidade, nos papéis dos majores Gale Cleven e John Egan, respectivamente. Com seus apelidos quase iguais de “Buck” e “Bucky”, as duas figuras históricas foram os líderes da 100ª em grande parte de seus combates aéreos, acrescendo o trauma da guerra às memórias de toda uma vida como amigos.

Em sequência, o público é conduzido pela narração do Major Harry Crosby (Anthony Boyle), ainda distante da posição de comando que o colocaria na história das Forças Armadas americanas. É ele quem apresenta outros importantes nomes da esquadrilha, como os tenentes Curtis Biddick (Barry Keoghan) e Roy Frank Claytor (Sawyer Spielberg, filho de Steven), além do chefe dos mecânicos, de apenas 19 anos, Sargento Ken Lemmons (Rafferty Law, filho de Jude). Não tarda para que boa parte desses personagens esteja no ar sob fogo nazista, lutando pela sua vida e pela conclusão de missões complexas de bombardeio. Gravada usando o Volume — tecnologia de telões curvos que constroem para elenco e câmeras um cenário digital palpável, desenvolvida em O Mandaloriano— a minissérie permite uma boa imersão nos combates sanguinários da II Guerra Mundial, ainda que os efeitos especiais não sejam irretocáveis.

Experiente, Fukunaga acelera e desacelera com segurança os momentos de tensão e vazão do sentimento desesperador da guerra. Um dos melhores planos do episódio piloto existe graças à decisão do diretor de alongar uma imagem de um corpo desmaiado em uma fuselagem avariada de caça B-17, convidando o espectador a ponderar sobre a solidão dos céus. Outro ponto alto, proporcionado em sinergia com o bom texto de Orloff, acontece quando um padre se oferece para orar pelos pilotos, minutos antes que estes partam para a batalha. Fechando uma cena de ar corporativo, é um momento que relembra o espectador (e os próprios personagens da série) que, para muitos ali, o trabalho do dia será a morte.

Se há grande cuidado na reconstrução histórica, refletido não só no carinho dado à montagem do elenco, às caracterizações dos personagens, à reconstrução de uniformes, cenários, aeronaves e armamentos, o mesmo infelizmente não acontece em relação ao trato dado à questão da guerra, em si. Há pouca atualização no tom de patriotismo quase romântico com que um dos episódios históricos mais sombrios da humanidade (e da história dos EUA) é retratado, em relação a 20 anos atrás — e isso, além de insensível, por vezes soa piegas. Para piorar, a trilha sonora original de Blake Neely (A Mulher do Viajante no Tempo) é insistente em sua tentativa de ser épica, sem nunca soar franca quanto a isso, o que só agrava a questão.

Ainda assim, mesmo que não consiga atrair espectadores para além daqueles que costumeiramente se interessam por dramas de guerra e tramas históricas (e a minissérie sequer parece fazer questão disso), Mestres do Ar alça voo de maneira segura graças à base sólida construída por um elenco que ainda conta com nomes como Lauren McQueen (The Wasting), Isabel May (1883), Josiah Cross (King Richard), Branden Cook (Chicago P.D.) e Ncuti Gatwa (Doctor Who). Além disso, é interessante ver como a produção conduz a transição de diretores entre certos episódios, a fim de tirar melhor proveito do alto investimento da Apple — em movimento que vê o bastão ser passado de Fukunaga para Anna Boden e Ryan Fleck (Capitã Marvel), Dee Rees (Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississippi) e Tim Van Patten (Família Soprano).

Mestres do Ar ganha novos episódios semanalmente, sempre às sextas-feiras.

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