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Um Amor Jovem

Em seu segundo filme como diretor, Ethan Hawke fala de corações partidos, tendo como base seu livro

13.12.2007, às 00H00.
Atualizada em 09.11.2016, ÀS 08H08

"Você não acha estranho que quando somos crianças todo mundo nos diz para seguirmos nossos sonhos e quando crescemos as pessoas ficam ofendidas se ameaçamos tentar?"

A frase acima, dita por Sara, a personagem de Catalina Sandino Moreno, funciona como um resumo perfeito da segunda experiência na direção do ator Ethan Hawke. Embora a história de Um Amor Jovem (The Hottest State, 2006) fale de primeiros amores, o enredo é conduzido justamente por pequenas tentativas de transformar sonhos em realidade — mesmo que, para alguns personagens, esse sonho ainda não seja muito claro. Adaptado do livro homônimo publicado por Hawke em 1997, o filme é repleto de elementos autobiográficos e foi classificado pelo diretor como "um ato único de egoísmo".

Às portas de completar 21 anos, William Harding é um ator estreante que vive em Nova York. Vamos encontrá-lo pela primeira vez em um bar, logo depois de ele nos contar como seus pais — divorciados há muito tempo — se conheceram e se apaixonaram. A memória é desencadeada pela visão de Sara, que aparece pela primeira vez no estabelecimento que William frequenta todas as noites, junto com outros jovens atores, artistas e estudantes. Ele usa a mesma piada que o pai usou para conquistar a mãe para se aproximar da garota, uma aspirante a cantora que havia se mudado para a cidade naquela noite.

Dali para frente, acompanhamos o desenrolar do relacionamento a partir dos olhos de William, vivido pelo excelente Mark Webber — que atuou em Storytelling, de Todd Solondz, mas cujo personagem mais marcante é o maníaco que sequestra David na quarta temporada de A Sete Palmos. Eles se apaixonam perdidamente, não se desgrudam, encaram uma visita à mãe de Sara e viajam juntos para o México, onde será rodado o próximo filme de William. E é no calor do México que a película de Hawke justifica o seu título original, "o estado mais quente". Quem já viveu um primeiro amor sabe bem do que se trata. É praticamente impossível não rir de si mesmo ao relembrar aquele ponto de um relacionamento em que nada é mais importante do que se fechar num quarto (talvez com algumas cervejas, como Webber e Catalina) e explorar cada milímetro do corpo do outro.

Também é praticamente impossível esquecer que esse estado não dura muito e que o que vem na sequência talvez explique por que passamos a nos apaixonar de maneira mais sábia quando ficamos mais velhos. E é nesse segundo momento que o diretor dá mostras de seu talento. O uso da luz e da música torna o filme ainda mais envolvente. Há cenas belíssimas em ruas do Brooklyn azuladas pelo cair da tarde, em bares cheios de sombra e fumaça e no restaurante em que William encontra a mãe para uma dura celebração de aniversário. A trilha sonora foi toda composta para o filme por Jesse Harris, que convenceu gente boa e famosa (como Feist, Bright Eyes, Willie Nelson e Norah Jones) a emprestar a voz para cada faixa.

O único grande senão do filme é a construção do personagem de Catalina. Ethan Hawke não consegue fugir da maldição hollywoodiana de transformar uma atriz estrangeira que ainda não conseguiu se livrar do sotaque numa espécie de souvenir, cobrindo-a de acessórios étnicos dos pés à cabeça. Como se a bolsa com lhamas, os vestidos mexicanos e o apartamento de paredes azuis à Frida Kahlo não fossem suficientes, o diretor escala ninguém menos do que a canastríssima Sônia Braga para interpretar a mãe da jovem aspirante a cantora. Por sorte, a participação de nossa conterrânea é breve e os pais de William, vividos pela excelente Laura Linney e pelo próprio Hawke, nos ajudam a esquecer o constrangimento.

Muita gente já tachou o filme de ingênuo, bobo ou "para mulherzinha". Não é bem assim. A sensibilidade do diretor se revela em pequenos detalhes e só não se deixa conquistar pela história (e pelas próprias lembranças que ela inevitavelmente irá despertar) gente como a mãe de William que, diante do filho de coração partido solta a pérola "algumas pessoas não vão corresponder ao seu amor e você vai morrer de qualquer jeito, então, sai dessa!".

Um Amor Jovem

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