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A Guerra Está Declarada | Crítica

Eleito pela França para concorrer a um lugar no Oscar é um interessante drama de "realidade aumentada"

05.01.2012, às 20H41.
Atualizada em 08.11.2016, ÀS 22H03

Romeo (Jérémie Elkaïm) e Juliette (Valérie Donzelli) estão há meses fechados no hospital, onde seu filho Adam, de dois anos, passa por um penoso tratamento contra o câncer. Eles saem, vão a uma festa, e de repente todas as pessoas ali começam a se beijar. É como se numa única noite fosse possível viver várias vezes, e só a Romeo e Juliette, que mal saem do hospital, todas essas possibilidades fossem negadas.

a guerra está declarada

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Dizem que A Guerra Está Declarada (La Guerre Est Déclarée) é uma rara história sobre câncer sem sentimentalismo, mas um olhar mais atento logo vê que isso é impreciso. O sentimentalismo de Valérie Donzelli (além de protagonizar com seu marido Elkaïm a atriz dirige o filme) é de outro tipo, não o sensacionalista, choroso, mas um sentimentalismo de realidade aumentada, por assim dizer, onde tudo o que é projeção - anseios, frustrações - se materializa em imagens.

Primeiro, os anseios. Romeo e Juliette se conhecem e vivem uma paixão tipicamente à francesa: andam de bicicleta no verão, leem livros no parque, frequentam o museu (em exibição, o quadro "A Origem do Mundo", de Gustave Courbet, exprime o potencial da vida a dois). Donzelli captura esses momentos entre breves fade-outs, como se fossem mais conjeturas de uma experiência do que, propriamente, experiências em si. Como se fosse um amor projetado.

Como toda doença que transforma a rotina das pessoas, o câncer do filho do casal surge e muda tudo. Donzelli não se limita ao velho discurso do choque-de-realidade, dos sonhos desfeitos por conta de um terrível imprevisto. O que A Guerra Está Declarada consegue é capturar no espaço e no tempo a intransigência do câncer - como ele altera não só a rotina, a superfície, mas também a velocidade e a disposição com que se encara a vida depois da doença.

Donzelli parte de exageros (aludir a Shakespeare, comparar o tratamento com a Guerra do Iraque) e de alguns cacoetes do cinema contemporâneo francês, como os números musicais à Christophe Honoré, mas aos poucos A Guerra Está Declarada encontra um equilíbrio, na medida em que entra na "velocidade da doença" - não por acaso, depois de Juliette dar seu pique final nos corredores do hospital. A montagem clipada do começo dá lugar a planos mais longos (no vaivém do casal durante o tratamento), os close-ups ficam mais raros.

O ponto alto desse novo compasso é a ótima cena em que Romeo e Juliette sentam diante do médico, à espera de um resultado, e são obrigados a esperar alguns eternos instantes pela resposta. A câmera fica fixa nos dois, a uma distância (um do outro e a câmera dos dois) e durante um período que nos transmite com alguma precisão as mudanças que eles passaram ao longo do filme.

Aí então todas aquelas projeções de "realidade aumentada" (que podem passar a impressão de que o filme é teatral, fatalista) fazem bastante sentido. As frustrações inerentes ao acompanhamento da doença não obedecem um ritmo, especialmente no início do tratamento; são projetadas de uma só vez, de tamanhos e intensidades várias, e entrar em um acordo com essas frustrações é a receita para conviver com o câncer.

A Guerra Está Declarada | Cinemas e horários
A Guerra Está Declarada | Trailer

Nota do Crítico
Ótimo