Primeiro grande sucesso do Disney+, The Mandalorian ganhou os fãs de Star Wars ao explorar cantos mais obscuros da galáxia criada por George Lucas. Embora o cineasta já se inspirasse em faroestes quando introduziu a história dos Skywalker, a série de Jon Favreau usou o gênero como alicerce de seu desenvolvimento, com Pedro Pascal fazendo as vezes de herói relutante em um dos períodos mais críticos na linha do tempo da franquia. O Livro de Boba Fett, derivado de Mandalorian dedicado ao cultuado caçador de recompensas introduzido no infame especial de Natal de 1978, mantém o estilo do programa original, dando espaço também para que seu co-criador Robert Rodriguez faça sua presença ser notada já no episódio de estreia, disponibilizado nesta quarta-feira (29).
O diretor, que já mostrou dominar o bang bang em filmes como O Mariachi e Era Uma Vez no México, não demora a deixar sua assinatura em O Livro de Boba Fett, cujos primeiros minutos alternam entre a ameaça claustrofóbica do interior do Sarlacc e a imensidão fervente dos desertos de Tatooine. Submetendo o caçador de recompensas de Temuera Morrison a uma caminhada agonizante, Rodriguez deixa para trás a quase-morte bizarra que o personagem sofreu em O Retorno de Jedi para transformá-lo no sobrevivente casca-grossa visto no antigo Universo Expandido.
Ao mesmo tempo em que reforçam a aura imponente que devolveram a Boba no segundo ano de The Mandalorian, Rodriguez e Favreau, que assina o roteiro, apresentam a nova cruzada do personagem em busca do controle do submundo do crime de Tatooine. Já intimidador como capataz de Darth Vader ou Jabba, o agora anti-herói assume a postura imponente de seus antigos chefes, acentuada pela constante companhia de Fennec Shand, mercenária vivida por Ming-Na Wen desde a primeira temporada da série original. Sem dispensar seus típicos diálogos cheios de alfinetadas e tiradas rápidas, Favreau constrói a parceria da dupla com base no respeito mútuo e na ambição, explicitando a sede de poder de ambos ao mesmo tempo em que introduz uma faísca de conflito em sua relação.
Paradoxalmente, O Livro de Boba Fett introduz uma burocracia problemática à desmistificação de seu protagonista e parece fazer um esforço constante para justificar a própria existência. Constantemente, o episódio de estreia pausa a luta por sobrevivência e ascensão criminosa de Fett para mostrar o protagonista como uma figura heróica que não condiz com sua caracterização obstinada e com o desejo de poder que o impulsiona. Tentando explicar por que o espectador deveria torcer pelo caçador de recompensas, a série sacrifica o desenvolvimento do personagem, precário desde que surgiu em 1978.
É claro que essa exploração superficial pode ser corrigida no restante da temporada, mas isso não torna a necessidade que o primeiro capítulo de O Livro de Boba Fett tem de corrigir o que foi visto em O Retorno de Jedi e O Ataque dos Clones menos incômoda. O capítulo inclusive se torna redundante dentro do núcleo de The Mandalorian, que já fez Boba provar seu valor ao ajudar Din Djarin (Pascal) em sua jornada para entregar o pequeno Grogu a um mestre Jedi.
Embora longe de ser ruim ou mesmo tediosa, a estreia de O Livro de Boba Fett também pouco fez para estabelecer uma personalidade sólida para seu protagonista. Ainda assim, o episódio introduz uma história divertida, que deve ser melhor trabalhada nas próximas semanas.