Tulsa King

Créditos da imagem: Paramount+/Divulgação

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Tulsa King traz Stallone como peixe fora d'água em drama sobre anacronismo

Com trama sobre exílio de gângster no interior, Taylor Sheridan segue abordando diferenças que compõem os EUA

Omelete
4 min de leitura
16.11.2022, às 15H02.
O corpo musculoso, o rosto esticado por intervenções estéticas diversas, a postura impecável e o incansável ímpeto de seguir se colocando sob o calvário do cinema de ação fazem com que Sylvester Stallone não pareça ter os seus 76 anos de idade. Distante da aparência de homem comum, o astro conseguiu tornar anacrônica a sua figura, absorvendo em seu arsenal artístico um interessante recurso: sem aparente esforço, é capaz de transmitir todo o peso dramático que carrega com sua longa experiência de vida, ao mesmo tempo em que mantém a disposição enérgica de alguém muito mais jovem.
 
Em Tulsa King, um dos grandes cronistas atuais das nuances e dos conflitos socioeconômicos de um Estados Unidos em crise identitária, o cineasta e roteirista Taylor Sheridan, usa esse aspecto de Stallone como lastro para um violento drama sobre anacronismo. Na série do Paramount+, o eterno Rocky Balboa das telonas ainda distribui socos, mas passa muito mais tempo internalizando sentimentos dolorosos e tentando processar a realidade de um mundo que cada vez menos é capaz de abrigá-lo. Ele vive um velho e tradicionalista gângster nova-iorquino, liberado da prisão após 25 anos, que se vê exilado por seus chefes com a missão de estabelecer de um novo império criminal no interior do país — mais precisamente, em Tulsa, cidade hiper-religiosa do estado de Oklahoma.
 
Há múltiplos conflitos embutidos nessa premissa, mas em seu episódio de abertura Tulsa King consegue priorizar dois como seu guia-base. Primeiro, o de um velho que precisa se localizar em um mundo que, do fim dos anos 1990 até aqui, atravessou um sem número de pequenas, médias e grandes revoluções tecnológicas, sociais e econômicas. Segundo, aquele travado entre os costumes modernos da cidade grande e antiquados do campo e do interior norte-americanos; agora sob a ótica do crime organizado. O protagonismo nas mãos de um astro decadente das telonas, bem como a inclusão de comentários sobre racismo e sexismo, ainda engrossam o caldo da narrativa com boas (ainda que inicialmente superficiais) nuances complementares.
 
Apesar de um começo titubeante, com uma narração redundante que impede que Tulsa King dê seus primeiros passos com a finesse de Yellowstone, o novo trabalho de Sheridan eventualmente embala em um crescendo promissor. Tematicamente, há ali um complemento mais que digno não só ao sucesso protagonizado por Kevin Costner, como também ao que seu texto abordava em filmes como Sicario: Terra de Ninguém (2015) e A Qualquer Custo (2016). Com o enfoque agora totalmente direcionado ao embate entre velho e o novo, e apoiado no carismático arquétipo do criminoso honrado, a série desenha um retrato envolvente e surpreendentemente divertido de um país fundado no conservadorismo, mas que deve aceitar as concessões necessárias nessa identidade para sobreviver à implacável marcha do progresso.
 
Trata-se de uma produção assumidamente conservadora? Como costuma ser o caso com o texto de Sheridan, sim. Mas muito disso se traduz em uma reverência à "América Rural", assim como acontece em Yellowstone, e não em um texto insensível. Há, em Tulsa King, alguma consciência da importância das questões sociais amplas que assolam os Estados Unidos, ao mesmo tempo em que se defende o espaço que o tradicionalismo pode ter nesse contexto de mudanças. É um interessante mergulho em uma visão conservadora muito menos radical e segregacionista do que o atual cenário político internacional tem exibido há alguns anos. Inclusive, não tão diferente do que foi feito em Justified, entre 2010 e 2015.
 
O que também ajuda Tulsa King nessa intenção de manter-se agregadora em seu subtexto político é a presença agradável de uma boa dose de humor, sempre ancorado em um Stallone excelente. Seja rindo de pessoas usando óculos de realidade virtual, agredindo funcionários de uma loja de maconha medicinal, tendo dificuldades para chamar um Uber ou só parecendo um ser impermeável ao poder do tempo, o ator brilha como catalisador de todos os conflitos da trama. Mesmo que sofra executando a tal narração ingrata, pior ainda para sua voz arrastada, este é logo de cara um de seus melhores e mais interessantes trabalhos.
 
Novos episódios de Tulsa King são lançados semanalmente no Paramount+.

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