Estreia da 5ª temporada de This is Us

Créditos da imagem: This is Us/Divulgação

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This is Us | Covid-19, conflitos raciais e uma grande surpresa na 5ª temporada

Seriado persegue a relevância ao tocar em temas delicados, mas começa a apelar para recursos superficiais na hora de surpreender seu público

29.10.2020, às 18H44.

Os dramas familiares tradicionais na televisão americana passam todos por um fenômeno dramatúrgico recorrente: começaram como boas ideias, que os distinguiam, para logo após alguns anos se tornarem todos iguais. À mercê das longas temporadas e da incapacidade de determinar uma linha de chegada, quase todos esses bem sucedidos dramas se entregaram ao uso descarado de recursos rocambolescos para garantir que tivessem o tempo de vida que os estúdios queriam que eles tivessem. Da forma mais elegante a mais superficial, acabaram todas no mesmo “barco”.

Para falar sobre o que aconteceu com This is Us na estreia da quinta temporada, podemos usar como exemplo a já esquecida Brothers & Sisters, que em 2006 estreou e conquistou a crítica com seu texto ágil e inteligente. O elenco, com Sally Field como grande protagonista, era outro atrativo. Sua primeira temporada foi aclamada, mas já a partir do segundo ano, lá estava a série fazendo e refazendo paternidades secretas; e ressuscitando parentescos como principal forma de impressionar a audiência. Quando a série terminou, ela já era uma versão satírica de si mesma.

Os métodos atingiam todos os títulos, sem distinção. Brothers & Sisters não conseguiu se salvar da decadência, mas mesmo com todo respeito que temos por The Sopranos, a cada nova temporada o irmão de alguém, o primo de alguém, o filho de alguém, entrava no elenco só para ser eliminado no final do ano. A série da HBO, contudo, aproveitava o contexto dos costumes peculiares entre as famílias ítalo-americanas para trabalhar esses clichês com elegância. O fato, enfim, é que esse chavão do “membro da família que aparece do nada” não é um vilão, mas precisa ser usado com sabedoria. This is Us, enfim, está se aproximando cada vez mais dessas fronteiras.

Apesar de tocar em assuntos vigentes como a pandemia e os conflitos raciais nos EUA, a volta da série chamou a atenção por conta de seus últimos 20 segundos, quando uma parte importante do que já conhecemos sobre o enredo foi revisitada e recontada, com direito a uma imensa liberdade criativa, daquelas que quanto mais pensamos a respeito, mais parece saída de uma fundamentação esfarelada. Embora a série seja conhecida por conseguir planejar seus roteiros a longo prazo, o que fizeram no final da premiere dupla soou como uma solução emergencial, tirada da cartola para chocar, muito mais que para desenvolver.

This is Randall

A quinta temporada começa exatamente do ponto em que terminou, com Kevin (Justin Hartley) lidando com os gêmeos que acabou de descobrir que estão a caminho. É evidente que a pandemia alterou o planejamento da história. O tratamento de Rebecca (Mandy Moore), que seria um dos principais enredos dessa primeira metade da temporada, precisou ser adiado e, com isso, é provável que muito do que veríamos no retorno tenha sido substituído por novas soluções. A convergência do flashforward do episódio em que Rebecca se perde, na quarta temporada, com os eventos do presente, foi um desses casos. A razão pela qual os personagens estavam na cabana, por exemplo, não era a pandemia; mas, com tudo que precisou ser transformado, passou a ser.

Ao mesmo tempo, a storyline de Randall (Sterling K. Brown) foi ainda mais tensionada depois que os conflitos raciais deste ano entraram na equação dos acontecimentos. Quando o quarto ano terminou, Randall estava num momento delicado, em busca de ainda mais compreensão acerca do próprio passado e a briga com Kevin potencializou seus sentimentos a respeito. A postura de Randall com relação ao tratamento de Rebecca era questionável, mas o que antes era um problema entre irmãos, se tornou um olhar panorâmico. O que aconteceu com George Floyd colocou uma lupa inconveniente na relação entre Randall e aquela família branca que o criou. Foi na cena entre ele e Kate (Chrissy Metz) que tivemos o momento mais forte desse retorno. Era a primeira vez que Randall lidava categoricamente com a condescendência de sua família a respeito do que os tornava tão diferentes.

Manter os principais acontecimentos em torno do personagem também foi uma tomada estratégica. Mesmo que o carisma de Randall tenha ficado pelo caminho depois que os roteiros começaram a sublinhar seu narcisismo, Sterling K. Brown é um ator que continua chamando a atenção da crítica e continua aparecendo em premiações. Natural, então, que o criador Dan Fogelman tenha tentado encontrar uma maneira de manter Randall no centro das atenções. Assim, as sessões de terapia do personagem e os flashbacks do passado envolvendo William (Ron Cephas Jones) foram reintegrando a questão materna, para que a convergência definitiva fosse uma olhada inédita na direção de quem, até então, estava morta: a mãe biológica de Randall.

É claro que tudo foi feito da maneira organizada e lúdica que já faz parte do DNA da série, o que nos leva até a possibilidade de que reverter uma informação tão forte sobre o passado do personagem talvez não provoque maiores danos, sobretudo, depois das declarações do criador da produção de que os segredos em torno disso serão revelados brevemente. Mas, independente das idas e vindas no tempo e do trabalho admirável de continuidade, no final das contas, insinuar a sobrevivência da mãe de Randall soa como uma forma desequilibrada de manter o susto da última cena.

Os potenciais emocionais de This is Us são notórios e até hoje ela tem feito história entre seus espectadores por provocar constantes lágrimas e comoções. De certa forma, esse se tornou um compromisso com a tristeza e vamos acompanhando os eventos presentes já sendo avisados por flashes que doenças e mortes nos aguardam na próxima esquina. Algumas vezes esse estica-e-puxa sensorial passa das medidas, se torna deprimente e já faz bastante tempo que o otimismo dos primeiros episódios se transformou num fetiche pelo caos (o humor da referência a One Day At Time, por exemplo, nos dá tempo para respirar fundo). Em tempos de celebração do escapismo, a série não vai servir para fazer alguém esquecer das mazelas do mundo. Dan Fogelman deveria ter entendido que já temos motivos demais para continuar chorando.

A 5ª temporada de This is Us é transmitida toda quarta, às 21h30, no Fox Premium 1.

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