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Grey's Anatomy | 14ª temporada mostra série mais cansada do que nunca

Nem carisma da criação de Shonda Rhimes salva

Omelete
5 min de leitura
02.10.2017, às 14H10.
Atualizada em 03.10.2017, ÀS 03H05

Ainda que erre por negligência, peque por excesso ou algo assim, o carisma de uma pessoa pode salvá-la de maiores consequências e julgamentos. A pessoa carismática é aquela que mesmo com defeitos ou limitações, consegue ser vista além de todas essas coisas, tornando-se indispensável para a convivência. O carisma, contudo, não é um maquiador de falhas, mas sim um evidenciador de todas as coisas que precisam ser vistas. O carisma pode ser uma vantagem e uma desvantagem, dependendo do humor do dia. 

Grey's Anatomy é assim desde que estreou na TV. Uma capacidade invejável de se estabelecer nos corações alheios como se nada nela estivesse cansada de existir. Esse carisma é responsável pela longevidade e também por condenar a série a nunca fugir de certas obviedades. Um programa jamais ficaria 14 anos no ar se não houvesse uma base de fãs muito apaixonada. E chegamos a um ponto em que Grey's Anatomy está tão cansada, tão esgotada de si, que esse carisma começa a ser ameaçado por uma estafa inevitável. Ainda há um certo pavor em vê-la sair do ar, mas ignorar seus problemas pode ser um sofrimento ainda maior.

Os anos entram, saem e mesmo que atores novos estejam sempre passando pelo caminho, o carisma é tão presumidamente eficiente, que resiste e permanece nas mãos desses roteiristas como se fosse seu maior trunfo. E é. Quando pensamos numa série que perdeu tanto do elenco original e cansou seu público com catástrofes que matam personagens importantes para que soframos com isso, precisamos reconhecer, então, que os métodos só são questionáveis numa única instância: as possibilidades de repetição. Inacreditavelmente, o público também não parece nem um pouco preocupado com isso.

“Subaproveitamento”

Como já aconteceu milhões de vezes, o hospital passa a estreia lidando com os escombros do que aconteceu na finale (ideia já abandonada no episódio seguinte). Nesse caso, escombros mesmo. Parte do hospital está sendo reconstruído, mas além disso, Webber precisa retomar suas funções e apresentar aos atendentes os seus novos subordinados. A ideia de mostrar simples estudantes de medicina passeando sob a tutela de Richard é interessante e emula um pouco do que foi a série um dia. Os atores são bons, as sequências com os celulares também funcionam como alívio cômico. Mas, lá estava um deles, no final do primeiro episódio, na cama de uma personagem, mostrando que no fim das contas, nada muda mesmo.

A grande estrela dessa volta também foi um personagem novo, o que vai acabar acontecendo constantemente já que o elenco original diminui a olhos vistos. A irmã de Owen surgiu bem-humorada e sagaz, uma energia que só torna o papel de Amelia naquelas vidas ainda mais insuportável. Parece que todo mundo na série tende a negar os próprios sentimentos, lidando com eles com surtos de indiferença ou trabalho pesado. Não importa o personagem, todos já fizeram isso. Amelia e Owen são o casal mais problemático justamente porque tendem a complicar todas as próprias reações projetando deslocadamente esses sentimentos em outras coisas. Amelia inclusive, esgota toda e qualquer chance de empatia. Ao final do segundo episódio, contudo, a série pode ter achado uma chance de esgotá-la ao máximo, o que, infelizmente, também significa mais tempo aturando seu drama passivo-agressivo. Amelia vive dramas que são humanos e validados, mas os roteiros não conseguem fazer com que nos importemos com ela.

A volta de Teddy também é uma tentativa de aumentar o número de rostos familiares. O roteiro é esperto ao fazê-la ser a voz da razão em meio ao que está acontecendo, mas estamos falando de uma série que só agora, depois de tantos anos, resolveu lembrar que Christina precisa ser mencionada eventualmente. Então, não é como se Teddy fosse um grande evento. Apesar do episódio acertar ao não criar inimizades entre Meredith e a irmã de Owen, no final das contas estamos vendo – pela enésima vez – o casal que supostamente deveria ficar junto sendo separado por circunstâncias incontroláveis. Olhando em perspectiva, a série tem sofrido um bocado para fazer seus casais serem relevantes para o público e conforme isso não vai dando certo, eles vão trocando as posições aleatoriamente. Agora temos Pierce e Jackson, Jo e DeLuca e depois Jo e Karev novamente... E Teddy provavelmente terá seu novo interesse romântico também.

Por fim, o que fica de mais forte nesse retorno de Grey's Anatomy é a sensação de que apesar de cansada de seus ciclos, ela resguarda nos pacientes, nos procedimentos, nas reviravoltas dos casos, uma segurança narrativa que torna tudo menos questionável. Quando o episódio um termina com um caso se complicando simplesmente porque não há pele suficiente para fechar a incisão, somos convencidos que a menina dos olhos de Shonda Rhymes ainda tem coisas para mostrar em meio ao universo de recorrências apáticas. A sensação se perde um pouco no final do episódio dois, quando casais são refeitos sob a mágica da "conversa não tida", quando doadores caem do céu, quando tumores são o trunfo para a sobrevida útil de um personagem e quando tudo de mais original que existe para oferecer é uma pesquisa sobre orgasmo que acontece do modo mais deslocado possível.

É bem provável que nada disso alcance negativamente a base de fãs. De uma série que surpreendia e provocava, Grey's Anatomy passou a ser o filminho reconfortante da Sessão da Tarde: você pode até não ver todo dia, mas é bom saber que continua por ali para quando você precisar.

Já em exibição nos EUA, a 14ª temporada de Grey's Anatomy estreia no Brasil em 13 de novembro, às 21h, no Canal Sony.

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