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Crítica

Star Trek: Discovery - 1ª Temporada | Crítica

Apesar de tom sombrio, série aposta com sucesso em referências e reviravoltas para segurar o fôlego do público

15.02.2018, às 20H30.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H45

Quando Star Trek: Discovery, nova parcela da franquia icônica, foi anunciada, muita gente torceu o nariz para a bandeira de diversidade que a série se comprometeu a levantar antes mesmo da estreia. A atração, protagonizada por uma mulher negra, a Michael Burnham de Sonequa Martin-Green, trouxe um elenco carregado de diversidade étnica e com personagens de várias orientações sexuais. A rejeição inicial de uma parcela do público, além de injustificada levando em conta o histórico da franquia - que trouxe, por exemplo, o primeiro beijo interracial da TV, dado pelos personagens Uhura e o Kirk, vividos pelos atores Nicheli Nichols e William Shatner -, se mostrou uma péssima escolha: a série é uma das mais bem produzidas do universo de Star Trek.

Os aspectos técnicos da série são indiscutivelmente impecáveis levando em conta o padrão televisivo - a série se espelha, nesse aspecto, muito mais nos recentes filmes de J.J. Abrams do que na série clássica dos anos 1960. Começando na caracterização de criaturas como o kelpiano Saru (Doug Jones) e os temidos klingons, os elogios na área de produção se estendem ainda à cenografia, na construção de paisagens como o desértico planeta dos crepusculanos e a idílica Pahvo, com suas fascinantes e perigosas árvores azuladas.

Sobre a trama, foi uma escolha interessante apostar em uma protagonista que não carregava a experiência e maturidade de um capitão. Ao fazer de Michael alguém ainda no caminho de se tornar uma líder, a série teve a oportunidade de mostrar sua jornada de amadurecimento. De forma bastante didática até, os 15 episódios mostram a personagem se tornando alguém mais responsável, capaz de repensar suas próprias ações com base na bagagem de vida que vai acumulando ao longo da trama. Isso acaba colocando a personagem em destaque em relação aos seus companheiros de tripulação, mais engessados em suas personalidades, e a justifica como protagonista.

Além disso, há outro ponto interessante na construção de Michael. A saga da primeira temporada de Star Trek: Discovery gira em torno da dificuldade em encontrar o contraponto confortável em situações cruciais, algo que por vezes soa impossível. Na primeira metade dos episódios, há a questão de Michael ser uma humana educada em uma sociedade vulcana - a jovem sofre uma briga interna entre razão e emoção constantemente. Depois, a série introduz outro dilema na vida da personagem, usando como base seu relacionamento com Ash (Shazad Latif). Após ter se apaixonado pelo rapaz, ela entra em conflito após saber que ele tem relações irremediáveis com os klingons, os responsáveis pela morte de seus pais biológicos. Martin-Green consegue passar com maestria essas relações antagônicas através de uma atuação pontual e certeira.

Aliás, o elenco de Star Trek: Discovery é um destaque da série - vários dos atores são perfeitos para o programa. Um exemplo disso é Doug Jones no papel de Saru, o Primeiro Oficial da USS Discovery. O ator, conhecido por dar vida a personagens não-humanos, com maquiagem altamente trabalhada como o recente Homem-Peixe de A Forma da Água ou o Abe Sapien de Hellboy, brilha mais uma vez como o kelpiano sempre alerta a situações de perigo. Outro bom exemplo é Michelle Yeoh, que dá vida às duas versões de Philippa Georgiou. A atriz, conhecida pela habilidade em cenas de luta em filmes de artes marciais, não tem o potencial desperdiçado e brilha em momentos de ação da segunda remessa de episódios.

Para os fãs da série original, há inúmeras referências às produções anteriores - no episódio final, inclusive, há uma em especial de tirar o fôlego e de deixar o público ansioso para a próxima temporada, já garantida. Há um ponto, contudo, que pode causar estranhamento e que rendeu comparações como as que diziam que The Orville se parecia muito mais com o espírito da franquia: a seriedade e o tom sombrio de vários momentos. Star Trek: Discovery tem momentos divertidos - quase todos garantidos pela cadete Sylvia de Mary Wiseman -, mas na maior parte do tempo mantém uma atmosfera tensa e preocupada, seja nas motivações dos embates, seja nos traumas que ajudam a construir a personalidade dos personagens. A série toca com responsabilidade em temas como tortura e abuso sexual e isso acaba sendo impactante para uma parcela do público.

Todos esses pontos, é claro, não seriam suficientes se a narrativa da temporada de estreia fosse arrastada ou se a trama em si fosse desinteressante, mas isso não ocorre. Pelo contrário, a série traz reviravoltas surpreendentes e mantém o fôlego da série ao longo dos 15 episódios - há personagens que revelam interesses obscuros, retornos inesperados, problemas que surgem e parecem não ter solução. Na reta final, Star Trek: Discovery já conquistou o público com seus ótimos personagens e não precisa mais fazer esforço para prender a atenção à trama ágil e intrincada. Se continuar nesse ritmo, a Michael Burnham de Sonequa Martin-Green pode entrar no panteão dos grandes personagens da franquia e a série pode ter sua vida útil tão longa quanto próspera.

Nota do Crítico
Ótimo

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