Outer Banks encerra ciclos e assume seu lado Indiana Jones
Sucesso adolescente da Netflix abre caminho para se tornar uma aventura fantástica
Créditos da imagem: Outer Banks
Em 1531, o explorador espanhol Diego de Ordaz morria na volta de sua expedição pelo Rio Orinoco, entre a Colômbia e a Venezuela. Sua morte foi imediatamente atrelada ao mito de Eldorado, que ele, na ocasião, estava supostamente procurando. Atualmente, especialistas já sabem que o mito da cidade feita de ouro era, na verdade, um erro de interpretação, e que Eldorado seria uma pessoa e não um lugar. Contudo, há muitos anos que essa cidade é tema de várias aventuras ficcionais.
Indiana Jones – famoso personagem da carreira do diretor Steven Spielberg – foi inspirado no coronel Percy Harrison Fawcett, que desapareceu numa expedição em território brasileiro. Esse tipo de lenda construída a partir de bases reais acaba sempre gerando um estilo específico de dramaturgia.
Tudo isso para chegarmos até a terceira temporada de Outer Banks, que sempre foi uma série sobre uma caça ao tesouro, mas que não tinha exatamente “saído do armário” na sua porção Indiana Jones, transformando seus personagens em versões adolescentes tardias dos Gonnies. De certa forma, essa era uma evolução natural da produção, que talvez tenha entrado em sua temporada mais madura e equilibrada. Se antes falávamos de um drama adolescente com um tesouro como pano de fundo, agora estamos falando de uma aventura que prioriza o que é mais importante mesmo: a nossa diversão.
Poguelândia Jones
Quando a terceira temporada da série começa, os “adolescentes” estão todos isolados numa ilha, após fugirem dos acontecimentos da temporada anterior. Essa já é uma ideia meio maluca, que os roteiristas até tentam administrar ao envolverem os pais deles no mínimo dos episódios. Mas, o fato é que como em toda série teen de elementos fantásticos, a sensação é de que os jovens fazem o que querem, quando querem, sem estudar, sem trabalhar, sem ir ao banheiro... A “poguelândia” dura os primeiros minutos e logo todos eles precisam se reinserir na história.
Em se tratando de narrativas onde alguém está desaparecido ou “morto”, o retorno é uma questão de tempo. Também é comum no gênero da aventura que o descendente de um desbravador siga os passos da família. John B (Chase Stokes) estava claramente nessa trilha, mas a volta do pai estabelece a ruptura definitiva. Big John (Charles Halford) traz consigo o vilão Singh (Andy McQueen), mas nenhum dos dois está interessado no ouro que era perseguido na temporada número 1. Dessa vez os planos são mais ambiciosos e o objetivo é descobrir onde está Eldorado.
Estruturalmente falando, a temporada enfrenta problemas. Os roteiristas fizeram o movimento certo e separaram os pogues. O reencontro entre pai e filho precisava de muitos episódios de desenvolvimento e isso foi cumprido. Era inevitável, então, que isso afastasse o protagonista dos amigos e de Sarah (Madelyn Clyne). Sarah é uma personagem que consegue funcionar sozinha porque tem muitos conflitos; mas os outros parasitam a vida de John e uma vez longe dele, enfrentam dificuldades para fluir na trama.
Por outro lado, foi admirável a forma como esses mesmos roteiristas resistiram à ideia de colocar os coadjuvantes em situações esdrúxulas só para garantir a eles tempo de tela. Foi muito mais sensato, por exemplo, adiar a presença de Ward (Charles Esten) por mais da metade da temporada e aproveitá-la quando ela foi realmente necessária. Os buracos de desenvolvimento ainda estão ali, mas é melhor lidar com eles que com decisões narrativas sem sentido que visam somente o contingente.
Mesmo ainda muito alaranjada e com as pitadas de coincidências providenciais, essa foi uma temporada bem organizada, que nos levou até a ação final com o mínimo daquela coerência típica do gênero. Foi corajoso encerrar todos os ciclos pendentes, entregar boas reviravoltas por conta disso e admitir que era necessário recomeçar. O terceiro ano de Outer Banks fechou portas que a gente já conhecia e abriu a possibilidade derradeira, aquela que define o futuro da série e a maneira como a veremos daqui para frente.
Vem aí John B e os Pogues desbravando territórios, resolvendo mistérios e revisitando a história. Essa é uma proposta honesta, legítima. No quarto ano saberemos se o público perdoa o desapego de elementos originais, mas com essa mudança a série é que ganha; ganha mais equilíbrio e principalmente mais maturidade. As séries teens precisam entender de uma vez por todas que não há nada demais em crescer.