Kevin Can F**k Himself zoa sitcoms machistas e cria subtexto queer irresistível

Créditos da imagem: Annie Murphy e Mary Hollis Inboden em Kevin Can F**k Himself (Reprodução)

Séries e TV

Crítica

Kevin Can F**k Himself zoa sitcoms machistas e cria subtexto queer irresistível

Série de Annie Murphy, de Schitt’s Creek, chegou ao Brasil pelo Amazon Prime Video

Omelete
3 min de leitura
30.09.2021, às 10H25.
Atualizada em 28.02.2024, ÀS 00H47

O primeiro episódio de Kevin Can F**k Himself é uma montanha-russa, um choque de tons radical. Isso porque ele tem a responsabilidade de introduzir o principal truque da série: a mistura de formatos entre uma sitcom multicâmera, com aquela risada de fundo, na tradição de Friends, Seinfeld ou Kevin Can Wait (da qual ela, obviamente, tirou o seu título); e um drama de câmera única, fotografado em tons bem mais sóbrios e mudos, sem vestígio de reações sonoras da plateia. 

A mudança de um para outro acontece bruscamente, sempre que o tal Kevin do título (Eric Petersen) entra ou sai de cena. A ideia é mostrar que a vida de uma típica “esposa sofredora” de sitcom, aqui representada pela protagonista Allison (Annie Murphy, vencedora do Emmy por Schitt’s Creek), é na verdade um constante tormento, e portanto expor os moldes antiquados de relação vendidos por essas séries pelo que verdadeiramente são: a perpetuação de padrões machistas de abuso que existem e ferem pessoas também na vida real.

A ideia e a intenção da criadora Valerie Armstrong, portanto, são boas - mas a execução não é fácil. O diretor Oz Rodriguez (Vampiros vs. the Bronx), responsável pelos dois primeiros capítulos, é quem encara o desafio de estabelecer, antes de qualquer coisa, uma linguagem visual que funcione para essa premissa, e ele acerta em vários sentidos: no contraste entre as cores da fotografia, por exemplo, e na forma como os personagens precisam se mover de maneira diferente quando estão nas cenas à la sitcom tradicional (ficando sempre de frente para a plateia e para as câmeras), missão na qual Allison é apropriadamente menos habilidosa do que os colegas de “elenco”.

O que demora um pouco mais para a série encontrar é seu ritmo. Como a produção nos traz a perspectiva da esposa, as cenas de sitcom não são realmente feitas para serem engraçadas - as piadas não funcionam, e isso é intencional. No entanto, depois dos primeiros diálogos e subtramas de Kevin, a mensagem é recebida pelo espectador, e fica difícil entender a utilidade dessas cenas conforme os episódios se seguem. Kevin Can F**k Himself só realmente decola quando percebe que o seu truque satírico, embora afiado e necessário, importa menos do que a história que ela realmente está contando.

É aí que entra em cena a inicialmente improvável aliança entre Allison e Patty (Mary Hollis Inboden, sempre a melhor parte da série), sua vizinha e irmã do melhor amigo de Kevin, Neil (Alex Bonifer). Começando a história como uma típica “garota cool” (lembra do monólogo de Amy em Garota Exemplar?) que passa o seu tempo com os rapazes, mas nunca é realmente considerada “parte da turma” e precisa aguentar comentários condescendentes o tempo todo, Patty se torna cúmplice de Allison em seu plano para fugir do casamento abusivo, e as duas florescem diante dessa conexão feminina no inóspito mundo de testosterona onde vivem.

A showrunner Armstrong se agarra a essa conexão cada vez mais conforme a temporada, de oito capítulos ao todo, vai se desenvolvendo. Melhor ainda, ela não se rende à noção de que essa conexão precisa necessariamente ser platônica para valer como manifesto feminista - conforme Patty explora e descobre sua própria identidade queer durante a temporada, Kevin Can F**k Himself não tem medo de mergulhar na possibilidade de essas duas serem mais do que amigas uma para a outra. 

E isso não é um demérito à força da amizade feminina, mas um testamento à força das conexões e do senso de comunidade que podem ser construídos entre indivíduos oprimidos de todos os tipos, através de intersecções e identidades. Ao incluir mais essa camada à sua sátira esperta, Kevin Can F**k Himself mostra que veio para fazer mais do que "só" destruir os clichês machistas da sitcom - ela também tem uma noção muito boa do que construir no lugar deixado por eles.

Nota do Crítico
Excelente!
Kevin Can F**k Himself
Em andamento (2021- )
Kevin Can F**k Himself
Em andamento (2021- )

Criado por: Valerie Armstrong

Duração: 1 temporada

Onde assistir:
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