Jeff Goldblum em cena de Kaos

Créditos da imagem: Netflix/Divulgação

Séries e TV

Crítica

Em Kaos, Jeff Goldblum lidera releitura cafona e deliciosa da mitologia grega

Série da Netflix atualiza mitos para desconstruí-los sob a ótica do século 21

Omelete
3 min de leitura
29.08.2024, às 14H58.

Fonte de inspiração aparentemente inesgotável para a cultura pop, a mitologia grega já rendeu revoluções de técnicas de animação com Fúria de Titãs, virou jornada teen com Percy Jackson e foi do popular ao soturno ao longo dos anos. A familiaridade talvez permita que Kaos, nova série da Netflix, faça da mitologia uma releitura cafona e cartunesca de forma tão fascinante.

No mundo idealizado pelo criador Charlie Covell, a humanidade ainda crê em deuses gregos e os louva da mesma forma que a fé cristã, islâmica ou hinduísta. Templos e estátuas foram construídos nas grandes metrópoles em nome de Zeus, Hera e Poseidon, e a crença em profecias e castigos divinos dita a doutrinação. E, como contavam os antigos gregos nos seus mitos, esses deuses andam pela Terra como humanos para usufruir de sua superioridade da forma mais mundana possível.

Embora mantenham a aura de entidades mitológicas, os deuses de Kaos são versões escrachadas de si mesmos. Zeus (Jeff Goldblum) ostenta um agasalho esportivo bordado com raios; Poseidon (Cliff Curtis) desfila de sunga colorida em seu iate no meio do Mediterrâneo, quase sempre acompanhado pela esposa de Zeus, Hera (Janet McTeer), em versão divina de uma das protagonistas de Desperate Housewives. O que permanece são seus egos inflados e disputas internas pelo poder, o que, como diz o próprio título da série, pode levar o caos total ao mundo.

Essa associação entre deidades e status social e econômico não é novidade na nossa cultura da celebridade, e obras variadas abordaram o tema, como a série da Image Comics The Wicked + The Divine. No Olimpo de Kaos, o que importa é preservar ou conquistar esse status, cujos símbolos são adaptados para amplificar o abismo social que nos diferencia. Assim, o palácio resplandecente de Zeus no Monte Olimpo é uma mansão que parece saída de Hollywood, e o Submundo se representa como um pesadelo kafkiano de funcionários públicos sem expressão. Hades (David Thewlis) tira as vestes de imperador do inferno e surge quase como um gerente de produção de uma fábrica prestes a implodir.

No centro do caos está Zeus. Egocêntrico e inseguro, o grande chefe do Olimpo teme que uma profecia de milhares de anos seja a causa da ruína de sua família. Covell, sem qualquer pudor, busca desarmar a grandeza de Zeus com humor absurdo - o que para Jeff Goldblum parece apenas mais uma terça-feira normal. Mestre do excêntrico, o ator soa perfeitamente adequado para interpretar um deus à beira de um colapso.

Os mitos gregos definiram por muito tempo o escopo da experiência humana, e Covell faz uso desse cânone abrangente para desconstruí-los. Figuras como Prometeu, Caronte, Orfeu, Eurídice, Teseu, Ariadne, Ceneu e Dionísio aqui existem, mas suas lendas são adaptadas para distanciá-los de suas versões clássicas, o que deixa suas novas representações mais atuais e interessantes.

Se a irreverência de suas entidades é o grande charme de Kaos, a série perde força quando se distancia de sua narrativa principal. Certas escolhas atrapalham o desenvolvimento de alguns personagens, que acabam sendo escanteados e ficam sem função narrativa por quase metade da temporada. Um erro semelhante ao visto no Monsterverse de Godzilla e Kong, que também trabalha mal seu núcleo humano, mas que parece renascer das cinzas quando o foco volta para criaturas mitológicas e suas nuances.

Sem medo de ser cafona, Kaos traz um olhar curioso e atualizado de uma mitologia rica em oportunidades. Caso seja renovada, a série pode explorar inúmeros caminhos interessantes para retratar a queda de deuses tão egocêntricos quanto fascinantes.

Nota do Crítico
Ótimo
Kaos (Série)
Em andamento (2024- )
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