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Séries e TV
Crítica

A Vida Mentirosa dos Adultos contextualiza, expande e sufoca Elena Ferrante

Adaptação troca complexidade queer do livro por discursos políticos óbvios e repetitivos

Omelete
4 min de leitura
CC
06.01.2023, às 08H48.
A Vida Mentirosa dos Adultos (Reprodução)

Créditos da imagem: A Vida Mentirosa dos Adultos (Reprodução)

Em A Vida Mentirosa dos Adultos, adaptação da Netflix para o livro de mesmo nome da autora best-seller italiana Elena Ferrante, uma das formas que a adolescente Giovanna (Giordana Marengo) encontra para se rebelar contra a criação classe média-alta intelectual dada pelos pais é… praticar break dance em cima do viaduto que fica diante da sacada do apartamento burguês onde passou toda a sua vida. Esta é uma das muitas adições ao livro que a minissérie faz, quase todas funcionando para adicionar contexto, temporalidade, localidade, à história original.

A Vida Mentirosa dos Adultos, a do streaming, só poderia se passar na Itália dos anos 1990. A música é específica da ambientação (“All That She Wants”, do Ace of Base, faz uma aparição ao lado de gemas do pop rock italiano), as roupas impecavelmente selecionadas em relação ao status social e político dos personagens na época, e tudo na direção de Edoardo De Angelis parece fazer referência ao cinema “urbano” nervoso da última década do século XX - pense na estética desenvolvida por Steven Soderbergh em seus primeiros longas, ou nos filmes noventistas de Paul Schrader.

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As ruas sujas e estreitas da série, paradoxalmente preenchidas por prédios de design arrojado, são filmadas em voos impressionistas. Recortes de diálogos são tocados repetidas vezes em cenas posteriores, se tornando parte da trilha sonora, sobrepostos com estática de rádio como se a memória os trouxesse de volta imperfeitos e desse a eles novos significados. Para compor o seu cenário, De Angelis escala figurantes que, aos seus olhos e os do público elitizado, representam a “gente comum” - até por isso, mostrando muito mais diversidade do que os protagonistas privilegiados que definem a bibliografia de Ferrante.

Essa abordagem ainda produz performances caricaturizadas, definidas por grandes emoções (quase) sempre engolidas pela conformação social. No panteão das atuações adolescentes da TV e do cinema, a de Giordana Marengo se revela contida, pensativa mesmo dentro de seus arroubos de rebeldia; já Valeria Golino equilibra sua Vittoria entre gestos expansivos e a dor verdadeira que se esconde habilmente por trás dos cristalinos olhos azuis e os cabelos extravagantes. Por fim, Alessandro Preziosi pinta um quadro perfeitamente ameaçador (mas também quietamente patético) do pai de Giovanna, figura central na decepção que define o amadurecimento da filha.

Nada disso, claro, é ruim. A Vida Mentirosa dos Adultos é obviamente uma minissérie feita com propósito e talento, do ponto de vista técnico… o seu problema, curiosamente, é muito mais narrativo. Isso porque, enquanto A Amiga Genial e A Filha Perdida encontraram formas audaciosas de traduzir em imagens evocativas e até ampliar o impacto dos monólogos internos que tanto impressionam na escrita de Ferrante, A Vida Mentirosa dos Adultos não capta a relevância de suas viradas mais simbólicas, da forma como a escritora consegue carregar objetos e acontecimentos banais com um significado profundo, tão emocional quanto político.

Já que esse procedimento mais sutil a escapa, a produção da Netflix recorre à literalidade para expressar a hipocrisia inerente da classe alta que Ferrante quer demonstrar em todas as suas obras. Como resultado, curiosamente, a tese política de A Vida Mentirosa dos Adultos fica mais confusa, ao invés de mais clara: de um lado, há o evento de inspiração comunista (e ateísta, e anti-fascista) onde a série mete todos os seus personagens no penúltimo episódio; de outro, a rápida cena em que a narração nos aponta a forma como os pais de Giovanna e seus amigos falam de revolução enquanto bebem champanhe e degustam caviar (o que podíamos observar perfeitamente bem sozinhos).

Politicamente, as obras de Ferrante são eficientes por reconhecer a complexidade das questões que emergem da vivência social, fundando suas histórias em experiências particulares afetadas pelas circunstâncias injustas do sistema. Este livro, aliás, encontra especial relevância ao focar na formação de uma identidade queer (e feminina, especificamente) dentro desse sistema, desvelando os caminhos tortuosos que os sujeitos femininos que se desviam da “norma” são obrigados a percorrer caso queiram afirmar sua autonomia e valor no complexo cultural capitalista.

Trata-se de um tema vital e urgentemente adulto, que a série empurra para debaixo do tapete sem muita cerimônia. A Vida Mentirosa dos Adultos, enfim, troca quase todo traço de maturidade por uma rebeldia juvenil, uma confiança no estilo sobre a substância - o que é justificável em sua protagonista, do alto dos 16 anos, mas difícil de entender em uma produção guiada por homens e mulheres feitos.

Nota do Crítico

A Vida Mentirosa dos Adultos

Encerrada (2023-2023)

Criado por: Edoardo de Angelis
Duração: 1 temporada
Onde assistir:
Oferecido por

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