Uma das primeiras perguntas que surgem quando uma adaptação de uma obra famosa é anunciada é: o autor vai estar envolvido? Isso, claro, quando o mesmo está vivo. Não à toa, entre filmes e séries baseados em obras de sucesso como Harry Potter, Percy Jackson e One Piece, encontramos um padrão quando o assunto é hype: quando o autor está envolvido, mais fãs comentam e acreditam naquela adaptação. Mas será que o mesmo vale quanto o assunto é a qualidade da produção?
O exemplo mais recente é o da série live-action de Avatar: O Último Mestre do Ar, que viu os criadores da animação original deixarem o projeto ainda no início, devido a diferenças criativas com a Netflix. Tanto o anúncio da chegada quanto o da partida da dupla Michael Dante DiMartino e Bryan Konietzko causaram uma grande comoção em parte dos fãs da obra, mas houve outra parcela desse público que não achou a mudança tão ruim. Isso por que a dupla estava envolvida no infame filme de 2010, dirigido por M. Night Shyamalan.
- Leia a crítica da série Avatar: O Último Mestre do Ar
- Leia a crítica de Percy Jackson e os Olimpianos
Com isso, surgiu a seguinte situação: a série da Netflix, da qual a dupla pulou fora, teve um resultado positivo, que agradou aos fãs, enquanto o longa-metragem, que os teve até o final, traumatizou boa parte do público que amava a animação. Seguindo pela mesma linha, Percy Jackson também viu sua franquia ser transformada em filmes antes de chegar às telinhas como uma adaptação seriada, porém, é um consenso que a franquia fracassou em ambas, mesmo com o autor Rick Riordan presente em uma delas.
Ainda assim, há exemplos de como a presença do criador pode ser extremamente benéfica ao projeto, como a aclamada primeira temporada do live-action de One Piece, que além de ter conquistado os fãs da obra, ainda disseminou a franquia para outros públicos. A presença do mangaká Eiichiro Oda nos bastidores da série da Netflix garantiu não apenas um elenco perfeito, mas também fidelidade ao que a obra representa, de forma que as mudanças feitas não desrespeitam o material original nem os fãs.
Algo semelhante aconteceu em Game of Thrones. Enquanto teve a ajuda de George R. R. Martin e seus livros das Crônicas de Gelo e Fogo como base, a superprodução da HBO conseguiu manter um nível de qualidade sem precedentes, se tornando um verdadeiro fenômeno nos domingos em que ia ao ar. Assunto do ônibus aos prédios espelhados da Faria Lima, a série estourou a bolha e conquistou um espaço que somente as melhores novelas da Globo conseguem, se tornando um dos materiais mais importantes da cultura pop no Brasil e no mundo — até que o livrinho acabou.
Sem material base nem como acelerar Martin, os produtores David Benioff e D.B. Weiss tiveram que agir e fazer o final da saga caber em uma temporada de seis episódios, mas não deu certo. Com um final traumático, Game of Thrones foi do pico à piada na oitava temporada e até hoje é sinônimo para boas séries com finais ruins. A série mostrou que sem o criador supervisionando, uma franquia totalmente rentável e histórica pode minguar de um domingo para outro.
O que todos esses exemplos mostram é que vale mais um showrunner sintonizado com o material original do que um criador saudosista, que não sabe abrir mão de seus próprios escritos, ou de um que queira ressignificar toda sua obra com uma adaptação. Isso não quer dizer que os criadores sejam descartáveis, pelo contrário. O segredo é saber em qual cadeira colocá-los.
Ao fim, saber olhar para a obra e apontar o que é bom, ou não, é imprescindível para colocar qualquer projeto de pé, mas isso só se aprende enxergando o material original como mais que apenas outro um trabalho. Afinal, um simples diálogo entre dois personagens pode ser tão importante quanto o clímax de uma franquia. Conhecer uma obra ao ponto de fazer qualquer coisa com segurança é a chave de qualquer recomeço, seja ele um derivado, um prelúdio ou uma nova versão. Não existe versão perfeita nem fórmula mágica, mas é possível afirmar que respeitar o público já é um ótimo começo.