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Rock in Rio | Bon Jovi frustra o karaokê e Baiana System se consagra no quinto dia

Headliners decepcionam em ambos os palcos principais

Omelete
4 min de leitura
23.09.2017, às 11H38.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H45

Foi de frustrações e lições o quinto dia de Rock in Rio, com um público bem disposto a exorcizar na Cidade do Rock as energias de um momento ruim para a cidade, que a alguns quilômetros de Jacarepaguá sofria na Rocinha os enfrentamentos da intervenção do Exército. No palco principal, quem esperava pelo Bon Jovi para cantar junto os sucessos da banda teve que se contentar com os hits do Tears for Fears, e no Sunset outro headliner, Ney Matogrosso, empalideceu diante do carisma de O Grande Encontro e da energia de uma "banda" que estreou no RiR e se consagrou, o Baiana System.

Se o Aerosmith na noite anterior havia trocado o lado mais pop pelo hard rock, o Bon Jovi, por sua vez, não conseguiu arejar sua apresentações com canções menos conhecidas e ainda assim sustentar musicalmente o interesse do público. Depois de testar terreno com três faixas (duas delas tiradas do álbum de 2016 This House Is Not for Sale), Jon Bon Jovi deu boa noite e emendou "You Give Love a Bad Name" com "Born to Be My Baby". O público reagiu na medida e cantou junto, o vocalista guardava a voz e sorria, e tudo indicava que teríamos uma noite agradável de sing-along, mas o que se viu foi uma sucessão de anticlímaxes, com a banda entrecortando sucessos com pares ou trincas de músicas mais obscuras.

Obviamente, nenhuma banda é obrigada a fazer covers de si mesma para sempre, mas as canções mais recentes do Bon Jovi não têm pegada para segurar um show da dimensão que o Rock in Rio pede. O público vibra e se sobrepõe ao som quando toca "It's My Life", mas o clima de agora vai nunca se realiza por completo; mesmo quando precisaria mostrar mais energia, como no refrão de "Living on a Prayer", Jon Bon Jovi segura a voz. A banda se despede sem mesmo introduzir os seus integrantes, enquanto o coro da galera pedia "Always". Melhor fez o Tears for Fears, que não deu descanso naquilo que foi essencialmente um Alpha FM Festival, hit atrás de hit, com direito até a um cover bizarro de "Creep" do Radiohead, entregando o pacote completo de quem veio atrás de um bom karaokê.

No Sunset ocorreu fatos semelhantes. Apesar dos seus tambores, a Nação Zumbi não conseguiu fechar o palco com a catarse que prometia sua parede sonora. A apresentação em parceria com Ney Matogrosso soou mal ensaiada, tanto na escolha do repertório do ex-Secos & Molhados, com versões que vocação intimista para "Sangue Latino" e "Fala", quanto nos sucessos de Chico Science (Jorge du Peixe e Ney batiam cabeça nas vozes de "Maracatu Atômico"). É sempre um prazer ver a guitarra de Lúcio Maia em funcionamento, e a banda sempre soube dar personalidade a covers (como a de "Refazenda" tocada ontem), mas quem mostrou entrosamento mesmo foram Alceu Valença, Geraldo Azevedo e Elba Ramalho duas horas antes.

A apresentação d'O Grande Encontro se escorou em sucessos de apelo popular que permitiam tanto o baile quanto o coro. Era o dia do textão no Rock in Rio - Valença puxou músicas "contra os traidores do povo" e Elba pedia "canções que façam dormir as crianças e despertar os homens" - e o público se mostrou sintonizado com o discurso mais politizado, que se manifestou não só nas palavras de ordem mas principalmente na defesa do regionalismo e dos gêneros populares (Elba puxava com o público o coro: "Freeeevo"). Quando a Banda de Pífanos Zé do Estado fez sua jam, a apresentação, que no mais foi organizada sem sobressaltos em torno de hits de barzinho, teve seu momento de mais energia.

Foi uma energia, de qualquer forma, que O Grande Encontro herdou do show anterior, do Baiana System, um dos mais contundentes do Rock in Rio até agora, capaz de despertar baile e coro do público que ainda chegava à Cidade do Rock de tarde, depois dos engarrafamentos. Forte no dub, nas batidas, e também na aproximação com o funk, o grupo de Salvador subverteu o que se espera de um espetáculo de estádio: as guitarras na frente do palco davam a ilusão de um show essencialmente instrumental mas foram os DJs na bancada que ditaram o compasso e testaram o limite da calibragem do som do palco Sunset.

A banda veio preparada para tocar alto e fez o público pegar no arranque. O vocalista Russo Passapusso levantou bandeiras, falou de índios, dedicou músicas às comunidades cariocas, desafiou o público à desobediência civil. Para um grupo que não tem espaço no rádio ou na TV (o próprio formato do soundsystem jamaicano só começa agora a se expandir para além do nicho do Carnaval aqui no Brasil), foi uma grata surpresa ver muita gente cantando junto "Cavalo do Cão", ápice de uma apresentação que consagrou no Rio um fenômeno em explosão. Nesta quinta-feira o Baiana System reivindicou o espírito do rock com muito mais propriedade do que os medalhões do palco Mundo.

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