Quadrinhofilia: Lamúrias de um velho ranzinza
Quadrinhofilia: Lamúrias de um velho ranzinza

LAMÚRIAS DE UM VELHO RANZINZA. Creio ser essa a única maneira de definir o texto que segue aqui.
Nunca
me senti tão senil quanto agora. Afinal, acabei de ler Marvel Século
XXI 1 e não gostei. E, pelo jeito, pareço ser o único.
Pois só tenho ouvido elogios a esse material. Sinceramente, não
vejo por quê.
Mas vamos aos fatos.
Nossos heróis estão morrendo faz um bom tempo. Se já não são zumbis de cuecas coloridas estão, pelo menos, agonizando. Nos anos 80, deram uma recauchutada no Universo DC. Veio a Crise nas infinitas terras, que fez uma faxina na mais antiga casa dos super-heróis. Em seguida, Batman, Super-Homem e Cia. tiveram suas vidas recontadas; atualizadas para um novo mundo menos inocente e sedento por heróis mais em dia com as últimas tendências.
Hoje, acontece o mesmo com as estrelas da sua maior rival, a Marvel Comics. É triste constatar que também as suas personagens parecem não ter escapado ao envelhecimento e ao desgaste. Por mais que a palavra “reformulação”, tão em voga nas HQs dos anos 80, não seja empregada na antiga casa de Stan Lee e Jack Kirby, o que se vê é a mesmíssima coisa. Mas, pelo visto, os resultados não têm sido satisfatórios. Ao menos, não pra mim.
Antes do caldo transbordar, a Marvel bem que tentou um Heróis renascem, mas deu com os burros n’água, apostando nas estrelinhas da geração anos 90. Desenhistas metidos a escritores e que só estavam preocupados mesmo era com o traço. Com a imagem. Ou Image, se preferir.
Pessoalmente, acho que muito do respeito que as HQs conquistaram nos anos 80 foi perdido em meio à infantilização imposta pelos “artistas” desse período medonho. Terreno fértil para os encantos do Photoshop e da imbecilização.
Parece que ainda há um certo ranço dessa turma presente nos quadrinhos que abrem o milênio. Prova disso é Marvel Século XXI.
Analisemos as duas HQs do número 1:
Homem-Aranha
Confesso que aqui, o roteiro não foi o que mais me desagradou. Há
uma estrutura, um enredo. Ponto para o roteirista Brian Michael Bendis.
Sem falar que é interessante desenvolver as personagens antes que as
coisas aconteçam. Mas os desenhos são pra lá de fracos.
Mesmo assim, alguns dos conceitos apresentados me deixaram de cabelo em pé.
Afinal, segundo a própria introdução da revista: “...
alguns fatos estão diferentes, mas aqueles heróis que tanto gostamos
estão aí, como foram originalmente concebidos.”
Será&qt;& Vejamos como ficaram as versões modernas das personagens:
É interessante que o tio Ben tenha, enfim, uma participação ativa dentro da origem do aracnídeo. Afinal, ele se tornou uma das criações mais famosas das HQs, mesmo sem ter feito praticamente nada além de morrer na primeira aventura do Aranha. Sua caracterização como um hippie boa pinta, no entanto, é mais do que cafona. Sua atitude cuca-fresca, seu rabo de cavalo e corpinho sarado me parecem um tanto quanto estereotipados e equivocados.
Quanto
à tia May, que bom que anda de antena ligada com as novidades
do mundo, via internet. Todavia, não acham que sua nova postura a deixou
menos superprotetora do que antigamente&qt;& E o que dizer dos olhares fatais trocados
entre ela e seu maridão&qt;& Parece até que está dizendo pra
ele: “Manda o guri pro quarto que eu quero te...”. Isso, porém,
é mais uma falha do desenho do que qualquer outra coisa.
Antes, tanto ela quanto o tio Ben eram muito mais normais. Ele era barrigudo (agora, até intimida valentões com seu olhar 43) e ela vivia para a casa. Seus universos eram bem limitados e até mais autênticos. O que explicaria, e muito, os problemas de socialização do pequeno Parker. Agora ambos são politicamente corretos demais.
E o Clã dos Osborn&qt;&
Se bem me lembro, Harry era amigo do Peter, porque era tão coitado quanto ele. E ainda por cima, feioso. Só que Harry era rico...Talvez, por isso, tenha decidido dar uma renovada no guarda-roupa. Agora, além de atlético e boa-pinta, usa roupinhas de couro preto e brinquinho. Que por sinal, aparece e desaparece o tempo todo. Preste atenção nos desenhos. Não que eu sinta falta daquele seu penteado “fabuloso”. Mas, pelo menos, não parecia ter saído do elenco de Barrados no baile. Já seu pai, é só rasparmos a cabeça e teremos o irmão caçula do Lex Luthor. Note que ambos são ruivos. Pelo menos o Lex era, antes de ficar careca. Alguém aí ainda agüenta multibilionários malvados&qt;& Eu não.
E dá-lhe estereótipo...
Por sinal até as indústrias Osborn são um culto à falta de imaginação. São praticamente iguais à fortaleza que eram no desenho animado chocho do Aranha nos anos 90.
Quer dizer que a Mary Jane agora não é mais alienada e cabeça oca como no início das HQs&qt;& E que até curte ciências&qt;& Vamos ver no que vai dar...
E o que dizer de nosso astro&qt;& Peter Parker não ficou muito mais gatinho com suas novas franjinhas&qt;& Sem falar nas roupas de cores berrantes (laranja, rosa, roxo..). Bem a cara de um menino tímido e retraído, certo&qt;& Que dizer, então, de seus olhares meigos e delicados&qt;& Não é à toa que, durante a história, ficam chamando o donzelo de menina...
Sei que foi um comentário maldoso, mas não deu pra resistir. Eh, eh...
E o que é o laboratório químico que ele herdou de seu papai cientista&qt;& Pelo visto, os Parker não eram tão maus de vida assim... Ao menos, o fato de “Pai Parker” estar desenvolvendo o tal adesivo molecular é mais coerente do que um pirralho de 15 anos criar uma superteia que nem os maiores cientistas do mundo são capazes de bolar.
Viu como não sou tão injusto&qt;&
Mas voltando a descer a lenha no desenho: Que me diz da cena em que a aranha pica o herói&qt;& Aquilo era sangue ou baba&qt;& Experimente virar a revista de ponta-cabeça quando a aranha aparecer. Ela não parece uma “lula lelé” com aqueles olhinhos simpáticos no abdome&qt;&
Os fãs que me perdoem. Mas ou Mark Bagley desenha mal pra caramba ou estava com muita pressa pra fechar a revista... Há momentos muito ruins na ilustração. Sem falar que o rosto do Peter muda de idade a todo momento. Pela capa, dá pra ter uma idéia do que vem por aí: Homem-Aranha magrelo (Oba! Isso é legal!) mas todo definidinho e musculoso (oh, droga!)...
Em resumo, essa HQ certamente não tem outra função senão a de simplificar as coisas no universo aracnídeo, abrindo caminho para os conceitos do novo filme.
X-Men
Por
incrível que pareça essa história é exatamente o
oposto da anterior.
Aqui a trama não passa de uma desculpa para um arranca-tapa com os Sentinelas. E olha que Adam Kubert sabe desenhar. Há momentos realmente bons em sua arte; como a cena dos andróides gigantes voando e o noticiário de TV, por exemplo. Entretanto, é lastimável como as coisas se desenrolam.
A explicação para os uniformes é ridícula, sem falar nos modelitos, que parecem mais forçados do que os uniformes tradicionais. Tudo para deixar as personagens um pouco mais próximas de suas versões cinematográficas. Pra mim, o resultado não passa de um pós-grunge de butique.
Fizeram
o possível para deixar a Tempestade parecida com a Halle Barry
(sua intérprete no cinema), com roupinhas de patricinha e expressão
de pastel de vento. Que dizer do resto da trupe além de: “Onde
fica a Rave mais próxima&qt;&” Ele mal apareceu , mas as imagens
do Wolverine de cavanhaque só reforçam tudo que acabei
de dizer...
As personagens mal se conhecem e já saem em missão juntas, conversando com se fossem grandes amigos. Algo que até se perdoaria numa HQ de uns 20 ou 30 anos atrás. Não num gibi que se diz sério. Bem, mas aí você me diria que os novos gibis da Marvel são para fisgar leitores mais jovens, que querem ação e pouco blá-blá-blá...
Sendo assim, ponto pra HQ do Aranha, que, por mais que não seja grande coisa, pelo menos, não chega a ofender a inteligência de ninguém. No entanto, só o futuro poderá nos dizer o que nos espera...
A propósito, você não precisa concordar com tudo, ou mesmo com nada do que escrevi acima. Nem se envergonhar de ler essas revistas. Afinal, são apenas diversão. Não um produto artístico dos mais refinados. Elas tampouco tem tal pretensão. Sua função primordial é conquistar novo público para os quadrinhos, e, pelo visto, tem conseguido esse intuito. Além do mais, meus comentários se remetem apenas à primeira revista da linha publicada no Brasil. Veremos o que o futuro aguarda... Afinal, como disse no início do artigo, minhas elucubrações são apenas lamúrias de um velho ranzinza.
José Aguiar
O velho em
questão ainda só tem 26 anos nas costas. Já imaginaram
quando tiver idade pra ser um dinossauro dos quadrinhos&qt;& Vai ser insuportável.