<i>Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula</i>
<i>Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula</i>
As
histórias em quadrinhos vêm ao encontro das necessidades do ser humano, à medida
que utilizam fartamente um elemento que sempre esteve presente na nossa historicidade:
a imagem gráfica. Esta afirmação é do professor da Escola de Comunicações
da USP, Waldomiro Vergueiro, e se encontra no primeiro capítulo desta
mais recente obra acerca da linguagem dos quadrinhos, escrita para educadores
e seu uso em escolas, do ensino Fundamental ao Médio. Junto a este teórico,
que também organizou o livro, encontram-se outros pesquisadores, como Angela
Rama (igualmente organizadora e autora), mestranda em Geografia Humana pela
USP, Paulo Ramos, jornalista e doutorando em Filologia e Língua Portuguesa
pela USP, Túlio Vilela, formado em História, professor no ensino público
em São Paulo e autor de roteiros publicados na Editora Abril, e Alexandre
Barbosa, mestrando em Ciências da Comunicação pela USP, professor universitário
de artes e comunicações e também cartunista.
O livro se divide em seis capítulos, sendo que os dois primeiros, escritos por Waldomiro, discorrem acerca da evolução histórica e conceitual das histórias em quadrinhos, explicando sua ligação com o próprio desenrolar tecnológico da civilização, a sua valorização nos períodos de guerra (com os super-heróis dando força moral aos soldados norte-americanos), e sua posterior difamação no período pós-guerra, quando o psiquiatra Fredric Wertham promoveu uma verdadeira caça às bruxas aos quadrinhos, repercutindo negativamente pelo mundo, e ajudando a criar um código de ética para validar as revistas permitidas e separá-las das proibidas, a fim de que os leitores não se influenciassem negativamente, culminando num cerceamento criativo dos quadrinhos daquele período e num preconceito que vigora até os tempos atuais. Porém, segundo Waldomiro, graças ao desenvolvimento dos estudos culturais em fins do século XX, os quadrinhos foram redescobertos como mídias artísticas e educativas, contendo, de forma única, altos níveis de informação que podem ser utilizados de maneira exemplar no ensino.
O livro, por meio da exposição dos elementos constituintes da linguagem da HQ e suas incríveis possibilidades educacionais, evidencia como os professores podem utilizar tais recursos de forma proveitosa em suas aulas. À disciplina de Língua Portuguesa, por exemplo, o autor Paulo Ramos lista dez propostas que incluem a questão da fala e escrita e aspectos da oralidade, demonstrando aos professores que, usando os quadrinhos, as aulas de português não precisam manter a pecha de chatas, como quando tentam evidenciar aos alunos as funções de análise sintática, oração subordinada e outras utilizando fórmulas esquemáticas de difícil assimilação e entendimento.
Por seu lado, Angela Rama pontua com uma obviedade contundente (mas geralmente não percebida) o grande potencial de contribuição dos quadrinhos para o ensino de Geografia, já que nesta há uma preocupação com a leitura de imagens, as quais pululam naturalmente nos gibis. Com seis propostas adequadas desde o ensino fundamental ao ensino médio, Rama aponta recursos na geografia que podem ser instigados e precedidos pelos quadrinhos, como os símbolos e convenção cartográfica, as escalas, a paisagem e espaço geográfico (facilmente encontráveis nas HQ). Há também a possibilidade de interdisciplinaridade, como quando, em sua quarta proposta, a educadora coloca em pauta os ideais capitalistas da família Disney e mesmo a visão etnocêntrica errônea, que os autores estrangeiros fazem em suas leituras quadrinizadas, quando o ambiente reportado é o brasileiro.
Em seu capítulo, Túlio Vilela agrupa vários exemplos de histórias em quadrinhos nacionais e estrangeiras (americanas, japonesas e européias), advertindo aos professores de história que elas não são apenas suporte de conteúdo, mas possuem potencial pedagógico exclusivo e que podem alavancar novas modalidades educativas. Entre as várias possibilidades a serem consideradas, Vilela destaca principalmente três: as HQ podem fornecer idéias de aspectos da vida social e comunidades do passado, podem ser lidas como registros da época em que foram produzidas (independente do período que querem retratar) e podem ser utilizadas como ponto de partida de discussões conceituais importantes para a História - como acontece com o tratamento dado à Guerra do Paraguai pelo quadrinhista e antropólogo brasileiro André Toral, por exemplo - e para despertar novas modalidades reflexivas por parte dos alunos.
Finalizando o livro, Alexandre Barbosa rememora uma fundamental aproximação das histórias em quadrinhos com a própria Arte e seu ensino possível nas escolas, conceituando a técnica quadrinhística e aproximando alguns de seus aspectos a estilos artísticos como o Renascimento.
O livro Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula foi cuidadosamente elaborado com a proposta de oferecer às distintas disciplinas pedagógicas (desde o ensino fundamental até o último ano do ensino médio) um novo encaminhamento teórico-prático de uma linguagem riquíssima de conteúdo e que, não obstante o aval e utilização indicada pelos PCN, tem sido timidamente explorada quer pelos livros didáticos, quer pelos professores alheios a um reconhecimento melhor abalizado acerca do universo dos quadrinhos e de seu potencial informacional, que pode ser utilizado para promover um ensino, ao mesmo tempo, mais reflexivo e prazeroso em nossas salas de aula.
Título: Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula. Autores: Angela Rama (org.), Waldomiro Vergueiro (org.), Paulo Ramos, Túlio Vilela e Alexandre Barbosa,. São Paulo: Contexto, 2004. Preço: R$25,00. 160 páginas.
Gazy Andraus é pesquisador do Núcleo de Pesquisa de História em Quadrinhos da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP), Mestre em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da UNESP, doutorando em Ciências da Comunicação da ECA-USP, bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e autor de histórias em quadrinhos autorais adultas, de temática fantástico-filosófica.