As histórias em quadrinhos e seus gêneros - Parte 5
As histórias em quadrinhos e seus gêneros - Parte 5
![]() Valentina |
TEMPO DE CONQUISTAS
As girl strips surgiram durante a segunda década do século 20, quando as mulheres obtiveram colocações no mercado de trabalho e conquistaram o direito ao voto. Tratava-se, então, de agregar ao universo das histórias em quadrinhos todo um novo segmento da sociedade contemporânea – o das mulheres emancipadas –, possibilitando, assim, a ampliação do universo de leitores.
O
pontapé inicial no gênero parece ter sido dado por Cliff Sterrett.
Polly and her Pals deste autor, inicialmente denominada Positive
Polly, começou a ser publicada em 4 dezembro de 1912 em tiras diárias
e, em páginas dominicais, em 28 de dezembro de 1913. Embora constituindo-se
em um espaço de transição entre dois gêneros, uma
vez que ainda agregava elementos de um núcleo familiar tradicional, como
os pais de Polly (os Pals, ou seja, companheiros, do título...),
a narrativa concentrou-se principalmente na garota, cujas atitudes liberais
contrastavam com o conservadorismo de seus progenitores.
À liberal e progressista Polly Perkins, juntaram-se diversas outras jovens dos quadrinhos, principalmente a partir da década de 20. A maioria aparecia ligada a temáticas que, então, preocupavam as mulheres, como moda, automóveis, romantismo, etc. Assim, os jornais rapidamente se encheram de personagens femininas que não se limitavam mais a ficar em casa cuidando dos afazeres domésticos e preparando o jantar para quando o marido retornasse do trabalho, mas que partiam para a luta diária em empregos apropriados para elas.
PARTINDO PARA A LUTA
![]() Brenda Starr |
Winnie Winkle, criação de Martin Michael Branner em 1920, era secretária, profissão que, no princípio, também abraçou a personagem criada por Russ Westover em 1921, Tillie the Toiler, que, além disso, também atuou como cronista da alta sociedade e agente de relações públicas; já Dixie Dugan, criada em 1929 por John H. Striebel e J. P. McEvoy, trabalhava no mundo dos espetáculos. A profissão de repórter foi a escolhida pela popular heroína Brenda Starr, de Dale Messick e Mollie Slott. Esta última constituiu uma exceção no ambiente das girl strips, por dois motivos: em primeiro lugar, o nome masculino que oficialmente assinava a tira era apenas o pseudônimo utilizado por uma desenhista de histórias em quadrinhos, Delia Messick, como um recurso para escapar ao preconceito existente na indústria de gibis na época; em segundo lugar, talvez exatamente por provir de duas mentes femininas, Brenda Starr, por sua postura radical e atirada, antecipou, desde seu aparecimento, em junho de 1940, várias das propostas do movimento feminista que eclodiria duas décadas depois.
EROTISMO E FEMINISMO
De
uma certa forma, embora não realizada por mãos femininas, também
antecipava o movimento feminista outra famosa girl strip da primeira metade
do século 20, a melindrosa Betty Boop, uma cantora sensual e de
olhos grandes, que usava mini-saia e cantava músicas populares. Betty
foi transposta para as histórias em quadrinhos em 1931, a partir das
animações produzidas pelos estúdios Fleischer Infelizmente,
a série durou pouco nos quadrinhos, devido à indignação
dos grupos moralistas do país.
Mais diretamente ligadas ao movimento feminista, talvez por suas raízes européias, estiveram as girl strips surgidas nas décadas de 60 e 70, que contribuíram em muito para a renovação do gênero. Hiperetorizadas, assumindo uma postura ativa em relação ao mundo e à sua sexualidade, essas personagens ampliaram o espaço de atuação das mulheres nas histórias em quadrinhos. Ainda que transpostas aos quadrinhos como objetos sexuais, personificavam as exigências do mundo feminino, que, em nível mundial, cobrava o direito de se manifestar e decidir sobre sua própria vida, incluindo o uso de seus próprios corpos – no que se incluía o direito ao aborto e a livre manifestação de sua sexualidade.
Ícones
dessa visão de mundo são personagens como Barbarella (1962),
de Jean Claude Forest; Valentina (1965), de Guido Crepax;
e Jodelle (1966) e Pravda (1967), ambas de Guy Pellaert.
INQUIETAÇOES SOCIAIS E PSICOLÓGICAS
Os anos seguintes testemunharam o aparecimento de várias histórias em quadrinhos com protagonistas femininas, algumas delas no ambiente underground e outras em jornais de grande circulação. O ponto comum entre elas foi sua elaboração por artistas do sexo feminino, que utilizaram os quadrinhos não apenas como forma de manifestação artística, mas também como veículo para afirmação das inquietações sociais e psicológicas de seu sexo.
No espaço underground brilharam artistas como Roberta Gregory e Trina Robbins. A primeira foi responsável por Sheila and the Unicorn; a segunda, prolífica criadora e também incansável pesquisadora na área de quadrinhos, foi responsável, entre outras, por The Garden Party, uma interessante sátira às histórias femininas criadas por homens nas décadas anteriores.
No
âmbito das girl strips produzidas para jornais, destaca-se, a partir
de meados da década de 70, Cathy, original contribuição
aos quadrinhos de Cathy Guisewite, abordando questões como hábitos
sexuais, namoro e rituais românticos, relações entre pais
e filhos e aparência pessoal, buscando sempre salientar os conflitos interiores
da personagem, normalmente apresentando referências autobiográficas.

