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Netflix enfim cedeu aos cinemas: entenda por que o streaming mudou sua política

Em 2026, a Netflix fará seu primeiro grande lançamento em cinemas. Não haverá como voltar atrás.

Omelete
4 min de leitura
17.01.2025, às 16H42.
Atualizada em 17.01.2025, ÀS 17H16

Quando a Netflix lançou Glass Onion: Um Mistério Knives Out nos cinemas em 2022, a continuação de Entre Facas e Segredos arrecadou estimados US$ 13 milhões mesmo saindo em pouco mais de 600 salas nos EUA, um número significativamente pequeno. A demanda foi alta, e as sessões poucas. Tudo se esgotou. Um sucesso. Historicamente, o streaming só coloca seus filmes no circuito de exibição quando há a intenção de buscar indicações no Oscar (a Academia requer pelo menos duas semanas em cartaz), mas ali havia uma prova de que talvez isso devesse ser mais explorado.

Não importou. O co-CEO da empresa, Ted Sarandos, insistiu que o lançamento nos cinemas é ineficiente pouco tempo depois. E apesar do apetite visível do público por Glass Onion, o tempo do filme nas telonas não foi estendido. Tamanha era a certeza da Netflix. Mesmo quando cineastas como Martin Scorsese David Fincher dirigiam filmes caríssimos, mesmo quando os diretores de Vingadores: Ultimato e Guerra Infinita preparavam um blockbuster com estrelas enormes, esses filmes, no máximo, ficavam 15 dias em cartaz, com poucas salas disponíveis, e depois eram destinados (condenados?) a uma eternidade sujeitos aos algorítmos do catálogo.

Agora, pouco mais de dois anos depois do lançamento de Glass Onion, a Netflix enfim cedeu. Graças ao sucesso de Barbie, em 2026, ela fará seu primeiro grande lançamento nos cinemas. Não haverá como voltar atrás.

Ted Sarandos, CEO da Netflix

Ted Sarandos, CEO da Netflix

Netflix/Divulgação

A responsável por quebrar as muralhas da Netflix foi Greta Gerwig. A diretora e roteirista de Barbie, que arrecadou mais de US$ 1.5 bilhão e virou um fenômeno genuíno, assinou com a produtora para adaptar os livros de As Crônicas de Nárnia para pelo menos dois filmes, e o primeiro chega no fim novembro de 2026 em pelo menos mil salas IMAX no mundo todo. O filme terá pelo menos duas semanas garantidas de exibições em IMAX, com uma terceira semana disponível caso haja demanda (spoiler: haverá), e uma quarta semana, com sessões em salas normais, não foi descartada. Haverá, também, uma grande campanha de marketing.

O lançamento do novo Nárnia na Netflix só virá um mês depois, no Natal de 2026.

É um acordo sem precedentes, e um que Gerwig ajudou a negociar diretamente. A diretora, seus parceiros de produção e agentes foram a ponte entre Netflix e IMAX, e também precisaram convencer as redes de cinemas que carregam salas IMAX a aceitar a ideia, já que estas tipicamente são anti-Netflix devido exatamente à resistência da empresa de lançar seus projetos na telona.

É claro que a situação de Gerwig é única. Após Barbie, ela tem um dos maiores cheques-em-branco da história do cinema norte-americano. Sua influência nunca foi maior. Também não é nenhum acidente que isso aconteça pouco depois da Netflix quebrar a cara nas negociações para adquirir a nova adaptação Morro dos Ventos Uivantes, filme da diretora de Saltburn com ninguém menos que a própria Barbie: Margot Robbie. A razão? Robbie e sua turma preferiram os cinemas aos US$ 150 milhões garantidos pela gigante de tecnologia.

Greta Gerwig e Margot Robbie nos bastidores de Barbie

Greta Gerwig e Margot Robbie nos bastidores de Barbie

Warner Bros.

É tentador justificar a decisão de Robbie unicamente do ponto de vista artístico, o que não é totalmente incorreto. O cinema impede que filmes sejam vistos como "conteúdo", garantem a melhor qualidade de imagem e som, e adicionam um ar de grandeza à experiência. O principal benefício disso é que a história sendo contada ali não vira apenas mais uma distração no mesmo aparelho onde você usa o TikTok. Diferente do que acontece com séries, algo já tipicamente associado à casa e ao sofá, a Netflix não conseguiu emplacar um fenômeno cultural com filmes como aconteceu nos casos de, digamos, BarbieTop Gun: MaverickAvatar: O Caminho da Água e tantos outros lançamentos recentes. O cinema faz falta.

Mas a razão não é unicamente artística. Há números por trás disso, e eles explicam porque agora a Netflix vai colocar Nárnia no cinema. Em suma: quando um filme passa pelos cinemas antes de ir para streaming, ele faz mais sucesso do que algo colocado diretamente nas plataformas digitais. É fácil romantizar o cinema pela arte, mas o fato é que essa romantização também tem um efeito mercadológico e a Netflix já tem se beneficiado disso quando um filme da Warner, Universal ou outro estúdio chega no app.

O que vai acontecer se, em 2026, Nárnia for um sucesso de bilheteria e depois virar um hit no streaming, maior do que boa parte dos filmes que pulam diretamente para o catálogo? De cara, duas coisas. Primeiro, outros cineastas e atores vão passar a exigir um tratamento semelhante para suas grandes produções, tanto por conta do dinheiro quanto porque a maioria ainda valoriza a experiência cinematográfica como algo essencial para seu trabalho. Segundo, a Netflix terá que trabalhar duro para encontrar outra justificativa para continuar evitando as salas.

É claro que filmes mais baratos, menos comerciais ou menos ambiciosos ainda ficarão longe do cinema. A próxima comédia romântica da Netflix não será exibida em IMAX. Mas Nárnia 2? Outros projetos que custam US$ 200 milhões como foi o caso de Agente Oculto e afins? O cinema passará a ser uma garantia a mais para o sucesso. Sim, isso vai contra tudo que a Netflix disse até hoje. Mas em Hollywood, nada fala mais alto do que o sucesso. 

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