Katherine Heigl e Sarah Chalke em Amigas Para Sempre (Firefly Lane), série da Netflix

Créditos da imagem: Amigas Para Sempre/Netflix/Divulgação

Netflix

Crítica

Amigas Para Sempre deixa a desejar com novela inconsistente

Katherine Heigl estrela produção que mira em This is Us, mas acerta no mais açucarado folhetim

Omelete
5 min de leitura
07.02.2021, às 18H20.

Quando a escritora Kristin Hannah lançou Firefly Lane, ela fez questão de dizer em todas as suas entrevistas, que o livro era fruto de uma perspectiva totalmente pessoal. Essas declarações serviam para aliviar as constatações de que a história foi criada para perseguir a emoção. Tudo em Firefly Lane tem o objetivo de comover e assim como aconteceu com sua própria autora, as experiências dos leitores é que acabam determinando como ele vai reagir ao livro. Obviamente, a mesma coisa acontece com a adaptação da Netflix.
Envolvimento pessoal pode ser a única razão pela qual gostamos ou não de alguma coisa.

Mas, toda obra de arte não tem o objetivo de comover? Não. Mas, toda obra de arte – da comédia ao terror – pode acabar comovendo. De fato, essa “emoção acidental” costuma ser a mais impactante, justamente porque o espectador não foi massivamente preparado para ela. É claro que existem produções que conseguem fabricar catarse de maneira orgânica. This is Us (2016) é o título mais profissional nesse sentido. A direção da série se constrói inteira com o objetivo de dar ao espectador um choque emocional nos seus minutos finais. Mas consegue fazer isso parecer natural, inevitável, poucas vezes perdendo a briga entre delicadeza e melodrama.

Amigas Para Sempre (como foi traduzida no Brasil) não se acanha na hora de emular a estrutura temporal fragmentada de This is Us. Assim como na produção da NBC, a narrativa se divide em três pontos distintos: o presente, os anos da juventude e a adolescência. Essas narrativas vão se cruzando para compôr o objetivo daquela semana. Contudo, a showrunner responsável é Maggie Friedman, que embora tenha títulos como Dawson's Creek (1998) no currículo, passou os últimos anos escrevendo séries artificiais sobre bruxaria como Eastwick: A Cidade da Magia (2009) e As Bruxas de East End (2016). Isso sinaliza um problema que é perceptível em Amigas Para Sempre: ela muitas vezes quer ser significativa sem sair da superfície.

Na história, Tully (Katherine Heigl) e Kate (Sarah Chalke) são melhores amigas desde os tempos do Ensino Médio. No presente, Tully é uma apresentadora de TV bem-sucedida, mas atormentada por um passado trágico. Kate, ainda que cheia de sonhos e objetivos pessoais, tomou a decisão de casar e construir uma família. A cada episódio voltamos ao passado delas para entender como elas chegaram até aquele lugar. Heigl e Chalke também assumem as personagens no segmento que corresponde aos primeiros passos delas na carreira, nos anos 80. Para a versão adolescente, as atrizes Roan Curtis (Kate) e Ali Skovbye (Tully) assumem os papéis, num trabalho que é, inclusive, surpreendentemente superior ao das adultas.

Amigas Para Sempre?

Apesar das altas doses de açúcar, a adaptação de Maggie Friedman consegue até amenizar aspectos do livro que poderiam colocar Amigas Para Sempre numa posição mais delicada. Enquanto nas páginas a relação de Kate e Tully é assombrada pela presença de Johnny (Ben Lawson), que se posiciona como o eixo de um equivocado triângulo amoroso, a série descarta essa possibilidade, entendendo que esse tipo de narrativa ficou ultrapassado mesmo quando ainda estava em vigência. Ainda assim, os roteiros não resistem a colocar Kate – a tímida, CDF, romântica e certinha – numa posição de vítima das características extravagantes da amiga.

Esse é um caminho que vai deixando um alerta ligado conforme os episódios seguem; e que vai ter seu clímax quando o público for informado do real “mistério” que conduz a série. Aliás, a necessidade de incutir um segredo para ser revelado no final da temporada também empobrece a narrativa. Em This is Us o público percebeu que a morte de Jack era uma lacuna importante a ser preenchida bem depois da série começar. Em Amigas Para Sempre o recurso é usado com luzes e banda de fanfarra. Kate e a filha estão chegando a um funeral e as possibilidades da identidade do morto são jogadas nas sequências finais dos episódios sem nenhum contexto. A fraqueza do recurso prenuncia que não há nenhuma importância na revelação, o que, de fato, não há. Enganando deliberadamente o público, Amigas Para Sempre esquece o mistério que fez e inaugura outro.

A presença de Katherine Heigl é o trunfo comercial da série, mas a atriz segue nos dando o mesmo que dava desde Izzie Stevens: o correto. Tully – sua personagem – é carismática na sua versão adolescente e na sua versão juvenil. Já a Tully adulta é um clichê do showbizz, com sua assepsia afetiva, álcool e inconsequência. Sarah Chalke construiu uma Kate mais constante, o que não lhe ajudou na hora de competir com a presença de Heigl no elenco. É um elenco linear, esforçado, que fica à mercê de uma produção que está no meio do caminho entre gêneros narrativos, parecendo um e parecendo outro a cada nova cena.

Esse enredo tenta se manter na pauta feminina o quanto possível. Assédio, aborto e estupro são algumas das questões que são trabalhadas na série. Em todos os casos tudo é feito como se manda o figurino. Mas, essas não são mais abordagens diferenciais numa produção moderna. Não quer dizer que não são necessárias, mas não ajudam Amigas Para Sempre a sair do lugar comum. Esse “lugar comum” é o que de fato acaba atrapalhando a série, que não comete nenhum erro grave, mas soa menos série e mais novela a cada novo capítulo. Todas as viradas e surpresas estão no lugar do folhetim, com tudo que isso tem de bom e de ruim.

Talvez o grande e único problema real seja o minuto final, quando o roteiro descarta seu “mistério póstumo” através de uma revelação barata e tenta segurar a atenção do espectador com um novo segredo desnecessário. Numa série chamada Amigas Para Sempre, em que a ligação entre duas mulheres é o grande ponto de apoio, soa ruidoso que para garantir a audiência da nova temporada a expectativa criada seja a da ruptura entre elas. Kate e Tully, enfim, resistem a tudo, menos ao chamado do vil metal.

Nota do Crítico
Regular
Amigas Para Sempre
Encerrada (2021-2023)
Amigas Para Sempre
Encerrada (2021-2023)

Criado por: Maggie Friedman

Duração: 2 temporadas

Onde assistir:
Oferecido por

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