Leia a crítica de 2020 Nunca Mais, a retrospectiva da Netflix pelos criadores de Black Mirror

Créditos da imagem: Divulgação/Netflix

Netflix

Crítica

2020 Nunca Mais

Criadores de Black Mirror reúnem elenco estelar em especial caótico sobre este ano bizarro

29.12.2020, às 18H50.

Quando Black Mirror chegou à Netflix após uma exibição na TV britânica, o mundo se viu obcecado com uma produção que aproveitava seu formato antológico para chocar e alertar sobre os rumos que a evolução tecnológica e a sociedade estavam tomando a cada episódio. É curioso - e pavoroso - como a realidade ultrapassou a série rapidamente com a expansão de problemas como fake news, intolerância e negacionismo justamente através das redes sociais. Talvez o ápice de toda essa convulsão social tenha vindo em 2020, que no meio de tanta polarização ainda viu o surgimento da maior pandemia do século XXI. Não é difícil entender o que levou o streaming a encomendar 2020 Nunca Mais, uma retrospectiva desse ano tão bizarro aos criadores de Black Mirror, que por sua vez trocam o horror pela comédia em um especial caótico cheio de estrelas.

Com o título original de Death to 2020 (Morte à 2020, em tradução livre) e encabeçado por Charlie Brooker e Annabel Jones, nada mais justo que esse especial relembraria os eventos deste ano com um humor ácido carregado de ironia. A previsão se concretiza logo aos primeiros minutos, quando somos apresentados aos “entrevistados” da retrospectiva, que vão desde um jornalista interpretado por Samuel L. Jackson até a própria Rainha Elizabeth II, vivida por Tracey Ullman.

A partir daí, a produção inicia uma dinâmica que consiste em não apenas relembrar um momento bizarro, como colocá-lo na boca de personagens fictícios que poderiam facilmente existir no mundo real. Desde o egoísta bilionário Bark Multiverse (Kumail Nanjiani), passando pelo ignorado cientista Pyrex Flask (Samson Kayo), a descrente psicóloga Maggie Gravel (Leslie Jones) até a “pessoa mais comum possível” vivida por Diane Morgan, cada um dá uma visão muito particular para os eventos que tomaram conta dos noticiários durante esse ano.

A decisão de mostrar essas diferentes perspectivas comentando os mesmos acontecimentos eleva a acidez do texto ao evocar uma sátira tão contundente que em seus melhores momentos chega a lembrar comédias como Borat. Isso pode ser visto especialmente em figuras como o historiador com tendências intolerantes Tennyson Foss (Hugh Grant) e a porta-voz não oficial do governo dos Estados Unidos Jeanetta Grace Susan (Lisa Kudrow).

Cada uma dessas personalidades serve tanto para criar uma narrativa absurda - em que alguém confunde a Eleição dos EUA com uma série da Netflix -, quanto para rir de quem reproduz tais comportamentos mundo afora. Com focos muito bem definidos, a produção busca não apenas rir de governantes que ignoraram a pandemia e inflamaram grupos de ódio, mas também de quem acaba fazendo isso diariamente através de seus celulares.

Nesse ponto não poderia haver exemplo melhor do que Duke Goolies (Joe Keery), millenial criador de conteúdo que é tão vazio quanto seus discursos falsamente engajados e especialmente a dona de casa Kathy Flowers (Cristin Milioti) que se radicalizou pelas redes sociais. A crítica impressa em cada um deles não poderia ser mais óbvia, mas a produção toma cuidado para não igualar um jovem fútil a alguém abertamente racista. Esse cuidado em dosar os alvos é não apenas acertado, como necessário para que a piada não se perca.

É curioso que 2020 Nunca Mais brilhe também quando fala sério. Não que a produção não tome cuidados ao abordar temas como a pandemia, mas a forma como o tom se modifica para abordar o assassinato de George Floyd - um homem negro que foi sufocado pela polícia mesmo sem resistir à prisão nos EUA - dá ainda mais força à mensagem. Ainda que haja margem para rir de quem perpetua preconceitos, ou daqueles que fingem se importar com causas para ganhar likes nas redes sociais, o assunto é tratado de forma respeitável e reforça que nem toda a acidez do mundo seria capaz de fazer graça com uma questão grave como racismo.

2020 Nunca Mais não reinventa a roda, e a bem da verdade, nem tenta. Mesmo com as mentes responsáveis por Black Mirror entre seus criadores, o especial está longe de deixar o espectador boquiaberto ao fim de seus 70 minutos. Porém, se “rir é o melhor remédio”, talvez essa seja uma ótima forma de se despedir desse ano caótico que - com sorte - não se repetirá tão cedo.

Nota do Crítico
Ótimo
2020 Nunca Mais
Death to 2020
2020 Nunca Mais
Death to 2020

Ano: 2020

País: Estados Unidos, Reino Unido

Classificação: 16 anos

Duração: 70 min

Direção: Alice Mathias, Al Campbell

Roteiro: Annabel Jones, Charlie Brooker

Elenco: Samuel L. Jackson, Lisa Kudrow, Hugh Grant, Leslie Jones, Joe Keery

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