Radiohead: <i>Hail to the thief</i>
Radiohead: <i>Hail to the thief</i>
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Eis o novo disco do Radiohead, Hail to the Thief.
Gravado em tempo recorde (algo em torno de um mês) entre sessões em Los Angeles e Oxford, o disco parece realmente se aproveitar destes dois fatos: a extrema eficiência que a banda adquiriu em botar as idéias de Yorke em prática (e aí lembramos que Knives Out, do Amnesiac, ficou mais de um ano chocando em estúdio até sair a maravilha que é) e a leveza que a Califórnia parece ter trazido à normalmente densa banda - as Good Vibrations de Brian Wilson parecem ter afetado não só a melodia, mas também a psique dos músicos.
Tecnicamente é um disco mais frouxo, sem as amarras perfeccionistas características da banda. Há apenas uma preocupação constante com a diversão, deixando a técnica em um segundo plano (mas nem de perto esquecida). O resultado disto tudo é a tão falada volta da banda às guitarras, mas sem deixar de lado os drones sintetizados dos últimos anos.
Hail to the Thief é, literalmente, uma saudação ao ladrão e remete aos protestos que o presidente George W. Bush sofre desde que ganhou a eleição americana - Thom Yorke, o vocalista, é bastante politizado! O título acaba se transformando em boa piada quando se lembra do ódio com que os músicos reagiram ao roubo e compartilhamento das novas músicas na internet 3 meses antes do lançamento.
De audição bastante complicada no começo, o álbum acaba se tornando mais palatável com o passar do tempo e do número de vezes que é repetido. Ecos de Beach Boys, George Clinton, Beatles e até de Rage Against the Machine podem ser ouvidos no meio das faixas - sem nunca se desligar da característica estranheza que tira do Radiohead a possibilidade de se encaixar em qualquer rótulo musical que seja.
Eis o que o disco pode mostrar quando ouvido pela primeira vez:
2+2=5
Início pega-trouxa seguido de uma doçura vocal quase gospel. Tudo bobagem, apenas camas para a verdadeira música - uma explosão de distorção e complexidade melódica que insiste em berrar Ei otário, lembra da gente?Sit Down, Stand Up
Mais climinhas densos. Monotonia proposital, que parece não começar ou terminar nunca - até o clímax, em que esquece de onde veio e entremeia os vocais em um emaranhado de virtuosismo falso-eletrônico.Sail to the Moon
Música de elevador que, pela insistência no marasmo, poderia ir até a lua. Algo egípcio no meio - talvez mostrando ecos de um passado recente. E, antes que eu apanhe da namorada, devo afirmar que há quem goste.Backdrifts
Trilha sonora de videogame de luxo. Nada muito além disso. Já navegamos eletronicamente com mais maciez antes.Go To Sleep
Virtuosismo de cordas um tanto beatlemaníaco que pode fazer qualquer coisa, menos mandar alguém para a cama. Uma transa em formato musical, com um componentezinho de felicidade já há muito esquecido.Where I End and You Begin
Afinal é mais um amontoado de teclados climáticos ou uma pusta balada baseada em uma linha desgraçadamente boa de baixo? Sei lá, e talvez por isso mesmo a música seja o espetáculo agridoce que é.We Suck Young Blood
Direto da Transilvânia, gritos de um pregador emoldurado pelo órgão de sua igreja e as palmas de seus crentes. Nós sugamos sangue jovem - credo, culto satânico!The Gloaming
Sei lá, seriam bonitos efeitos especiais se fossem colocados em uma música de verdade. Ou não. Idioteque de meia tigela.There There
A tribo dança em volta das guitarras finalmente grooveadas dos sujeitos. E só porque você sente, não significa que esta lá - e nós podemos estar ouvindo coisa demais ao imaginar a banda dando risada enquanto grava a canção.I Will
Mais do mesmo? Um amontoado de teclados climáticos fazendo base para uma letra que diz pouco. Hmm... Legal, eu acho.A Punch-up at the Wedding
George Clinton acaba de baixar no CD. Que disco estranho este que faz imaginar Thom Yorke sorrindo de verdade enquanto divide os vocais com Ed OBrien - alguém por ali estava realmente inspirado e com boas lembranças da noite anterior pelo que se ouve no arranjo.Myxomatosis
Como pode ser que façam a mesma coisa das baladinhas de piano só que com guitarras distorcidas? Há quem odeie e há quem, como eu, ache que pelo menos é uma variação do mesmo tema.Scatterbrain
Bela balada de (surpresa!) guitarras, em que Yorke deixa subentendido que realmente gosta de vestir a sua voz mais irritante para as músicas em que o vocal mais aparece.A Wolf at the Door
Uma espécie de rap estranho contruído sobre uma base de piano de estudante de conservatório até que o refrão consegue melhorar o que já é extremamente competente. Com o bônus de que a voz de Yorke não está chata, mas sim a do velho amigo Andróide Paranóide de que todos gostamos.
Em resumo, os caras conseguiram variar da competência extrema - nas extraordinárias 2+2=5, Go To Sleep, We Suck Young Blood, There There, A Punch-up at the Wedding e A Wolf at the Door - à chatice monocórdica (ou experimentalismo competente, pra quem gosta) de Backdrifts, I Will, The Gloaming e Myxomatosis sem perder o jogo de cintura. Dá pra se notar Ed OBrien e Colin Greenwood mais soltos dando risada da constipação crônica de Jonny Grenwood, enquanto Thom Yorke e Phil Selway ficam num canto, resmungando pra si mesmos.
Um disco competente, uma quase volta perfeita aos bons tempos em que a gente poderia até tentar entender o que estava acontecendo na bolachinha. Uma tanto agridoce por insistir na manutenção do passado recente, mas ainda assim um disco a se ouvir (e muito) com (muita) atenção.
Mas ouça antes de comprar, este é um álbum que pode muito bem ser tachado como irregular para quem não entrar no clima.
