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Peeping Tom, Dream Theater, Epica, Primal Fear, Heaven & Hell e Alice in Chains
Peeping Tom - Peeping Tom
Que Mike Patton é hiperativo todo mundo já sabe. Corajoso também. Às vezes até demais, como no ultraexperimental Fantômas. São tantos projetos, parcerias e bandas que fica até complicado acompanhar. Mas o esforço vale a pena, especialmente quando botamos as mãos, ou melhor, os ouvidos, em um álbum como Peeping Tom, homônimo a um dos projetos do compositor, que acaba de desembarcar no Brasil.
Em uma tentativa de explicar a sonoridade certeira, redondinha, do trabalho, é preciso voltar um pouco no tempo e juntar outros dois projetos de Patton: o Faith No More, banda mais conhecida do cantor, dos idos de 1990, e o Lovage, em parceria com o produtor Dan The Automator, do começo desta década.
Em Peeping Tom há a união da mistura de rock e hip-hop tão marcante do Faith No More e uma das temáticas preferidas do cantor, o sexo, amplamente explorado no excelente Music to Make Love to Your Old Lady By, do Lovage. Abre parênteses para enaltecer a arte do álbum, que vem em uma embalagem toda divertida e caprichada, estampada aqui e ali por silhuetas femininas pra lá de sexy. Fecha parênteses. Junte a confortável área de atuação de Patton e o envolvimento do vocalista com vertentes musicais tão díspares a uma gama de colaboradores de primeira e você tem Peeping Tom. É difícil imaginar outro músico que consiga reunir, com tanta harmonia, Norah Jones, Doseone, Kid Koala e Bebel Gilberto no mesmo álbum.
Produtores renomados como Odd Nosdam, em "Five Seconds", que, acredite, apesar do peso, é uma música de amor, o brasileiro Amon Tobin, em "Don´t Even Trip" - uma das melhores do álbum - e o próprio Dan The Automator, em "Mojo" fazem toda a diferença, moldando à voz de Patton melodias desconstruídas e cheia de pausas climáticas.
O cantor ainda se cerca dos melhores de diferentes gêneros e, desta forma, mostra que atirar para todos os lados, quando bem acompanhado, pode se transformar de algo arriscado em experimentações muito bem-sucedidas. Exemplos? O microfone dividido com o rapper Kool Keith em "Getaway", o trip-hop embalado pelo Massive Attack e o mentor da banda britânica, Robert "3D" Del Naja, em "Kill the DJ", e o contraste bossa nova-rock´n´roll de "Caipirinha", com a inusitada adaptação de Bebel Gilberto ao jogo do cantor, resultando em outro ponto alto do trabalho.
Para fechar, literalmente, Patton escolheu "We´re Not Alone", abrilhantada pela presença do Dub Trio, responsável por sintetizar em uma só faixa todo o álbum: em Peeping Tom cabe de tudo - eletrônico, hip-hop, vocais guturais, rock, bossa nova - desde que no comando esteja o destemido Mike Patton.
Dream Theater - Black Clouds & Silver Linings
Black Clouds & Silver Linings é o décimo álbum em estúdio do Dream Theater, banda que vem fazendo história no mundo do metal progressivo praticamente desde seu surgimento, há 25 anos. Uma daquelas bandas que causam a sensação de "ame-os ou odeie-os", o Dream Theater tem alcançado seu ápice de popularidade nos últimos anos. Prova disso é o fato de Black Clouds & Silver Linings ter vendido expressivos 40 mil exemplares em seu lançamento nos Estados Unidos, chegando à 6ª posição da Billboard naquela semana. O baterista Mike Portnoy chegou até a brincar com isso: "(...) um álbum de metal progressivo, com quatro músicas maiores que doze minutos, no Top 10 dos Estados Unidos??? (espremido entre os JONAS BROTHERS, EMINEM e HANNAH MONTANA!). O inferno deve ter congelado!!! (isso deve ser a primeira vez a acontecer...)", disse ele ao site Blabbermouth na época.
Fato é que Black Clouds & Silver Linings é um excelente esforço do Dream Theater, bastante superior ao antecessor, Systematic Chaos. O álbum abre com a longa "A nightmare to remember", cuja letra discorre sobre um acidente de carro. Começa pesada, lembrando Metallica, com um belo trabalho de John Petrucci (guitarra) e Jordan Rudess (teclados) e bumbos duplos de Portnoy. James LaBrie (vocais), sempre criticado, já mostra de cara que está em sua melhor forma, sabendo dosar e usar sua voz de interpretando, sem exageros, o que a música pede.
"A rite of passage" é a segunda faixa e uma das mais facilmente digeríveis, tanto que foi escolhida - depois de devidamente editada - para ser lançada como single. Por ser menor do que a anterior ("só" 8:35 minutos), tem menos variações de tempo, mas mostra Petrucci novamente abusando de seu instrumento; segue-se a ela "Wither", que é a balada do álbum. A menor das faixas de Black Clouds & Silver Linings, com pouco mais de cinco minutos, tem um refrão emocionante e um brilhante solo de guitarra de Petrucci. Sem ser comercial demais, ela pisa no freio e dá um tempo para o ouvinte respirar. É uma música que poderia ser tocada nas rádios sem problema algum.
Em 2002, o baterista Mike Portnoy começou uma série de músicas nas quais discorre sobre seu problema com o alcoolismo e como conseguiu superá-lo. A primeira música da série que fala sobre os doze passos da reabilitação foi "The Glass Prison", do álbum Six Degrees of Inner Turbulence. A ela se seguiram "This Dying Soul" (do Train of Thought), "The root of all evil" (Octavarium) e "Repentance" (Systematic Chaos). "The shattered fortress" fecha essa pentalogia e é, talvez por sua temática, a música mais pesada do disco. Já começa com um forte riff de guitarra, seguido pelo teclado de Rudess. Ao longo de seus quase 13 minutos, a música tem diversas variações e muitos trechos que remetem às partes anteriores do que os fãs se acostumaram a chamar de "a saga do bebum" (ou a saga da cachaça). Portnoy já declarou que há planos de executar a "saga" em sua totalidade ao vivo futuramente.
"The best of times" novamente tem uma temática pessoal, já que foi escrita e composta por Mike Portnoy em homenagem a seu pai, falecido no começo desse ano. Linda do começo ao fim, é coroada com uma das melodias mais bonitas já criadas para a guitarra e John Petrucci faz jus a ela. Difícil não se emocionar com essa música e não repeti-la exaustivamente no CD player, independente de seus mais de 13 minutos de duração.
Finalmente, temos "The count of Tuscany", outra candidata a clássico instantâneo da banda. A faixa mais longa de um álbum que praticamente só tem faixas longas começa com uma grande introdução instrumental, com a guitarra de Petrucci inicialmente lembrando o Queen e as demais passagens instrumentais com toques de Rush e Yes adicionados ao peso típico do Dream Theater. Quando os vocais finalmente aparecem, a música pega um gás, mostrando um refrão agressivo e diversas mudanças de tempo e ritmo que resultam em um final bastante inspirado, talvez tão bonito quanto algumas passagens de "The best of times".
Por tudo isso, Black Clouds & Silver Linings já é forte candidato a melhor lançamento do ano. Um álbum quase perfeito do Dream Theater, perdendo poucos pontos pelo fato do baixo de John Myung praticamente não se fazer notar. Independente disso, obrigatório para fãs de música progressiva em geral.
Epica - Classical Conspiracy: Live in Miskolc, Hungary
O uso de bases de música clássica em álbuns de heavy metal não é novidade. Na verdade, é difícil precisar quando essa associação começou, mas é fato que ela se popularizou no começo da década de 1990, especialmente através do trabalho de guitarristas como Yngwie J. Malmsteen, Vinnie Moore e Timmo Tolkki (ex-guitarrista do Stratovarius), só para citar alguns dos pioneiros. A partir do momento em que bandas como Theatre of Tragedy e o Nightwish passaram a empregar vocalistas com formação claramente clássica em suas bandas, essa associação se tornou ainda mais intrinseca.
Da mesma forma, o uso de orquestras em apresentações ao vivo dando suporte a bandas de heavy metal é um fenômeno dos anos 1990, propulsionado especialmente pelo álbum S&M, do Metallica. No entanto, há uma grande diferença quando se usa a orquestra apenas para buscar um diferencial - como no supracitado Metallica e no Alive IV, do Kiss - e quando ela é adicionada de maneira quase orgânica às músicas. E é neste segundo caso que se encaixa Classical Conspiracy: Live in Miskolc, Hungary, dos holandeses do Epica.
Antes, no entanto, é necessário contextualizar as condições em que o álbum foi gravado. Classical Conspiracy não foi registrado em um show especial exclusivo do Epica. Na verdade, a banda foi convidada a participar de um festival de música clássica, o Miskolc International Opera Festival, que ocorre anualmente na Hungria. Aproveitando o ensejo de ter como suporte uma orquestra com 40 instrumentistas e 30 cantores da Remenyi Ede Chamber Orchestra, a banda elaborou um setlist bastante diferente do comum. Assim, o primeiro terço da apresentação de mais de duas horas - divididas em dois discos - foi dedicado a recriar obras de música clássica e sinfônica, tanto antiga quanto moderna. O Epica adaptou à sua sonoridade tanto clássicos imortais como "Dies Irea" (Verdi), "Ombra Mai Fu" (Händel) e "Adagio" (Dvorak) quanto peças mais modernas como "The Imperial March" (de John Williams) - aqui transformada em um power metal de respeito - e músicas de Danny Elfman ("Spider-Man medley) e K. Badelt ("Pirates of the Caribbean Medley") dentre outros.
Os dois terços restantes do concerto são dedicados a músicas da própria banda e é aí que se nota a diferença citada dois parágrafos acima: a orquestra aqui não altera mas, sim, complementa o som do grupo de maneira tão natural que soa quase como uma evolução de seus trabalhos em estúdio. Nem mesmo os vocais guturais de Mark Jansen (vocais/guitarra) soam deslocados aqui. Ao contrário, esse elemento soa tão natural quanto os vocais de soprano de Simone Simmons e os demais instrumentos, seja da orquestra, seja da banda - cuja formação se completa com Yves Huts (baixo), Ariën Van Weesenbeek (bateria), Ad Sluijter (guitarra) e Coen Janssen (teclado).
Os destaques individuais dessa segunda parte do show vão para as versões ao vivo de "Sensorium", "Chasing the Dragon", "Never Eough", "Quietus", "The Phantom Agony" e a - com o perdão do trocadilho - épica "Consign to Oblivion". Há ainda de se destacar o fato da produção do álbum ser bastante limpa e ter se dedicado tanto em captar com perfeição o som de banda e orquestra quanto as reações do público, que assiste respeitosamente o primeiro terço do concerto e depois se torna tipicamente "roqueira" no restante do show.
No frigir dos ovos, Classical Conspiracy se mostra um álbum bastante bem feito e produzido, realizado num dos melhores momentos de uma banda em ascenção que soube, como poucas, aproveitar o suporte de uma orquestra e coral para enriquecer suas composições. A versão que nos chegou às mãos, no entanto, tem um pequeno problema: Tanto a contra-capa quanto o encarte do álbum anunciam 18 músicas no primeiro disco e 10 no segundo. No entanto, há apenas 17 músicas no primeiro disco. A creditada "The last crusade" não aparece no primeiro disco. Um vacilo que, no entanto, não chega a comprometer a qualidade geral do produto.
Primal Fear - 16.6 (Before the Devil Knows youre Dead)
Na estrada desde 1997, o Primal Fear, inicialmente considerado por muitos apenas mais um dos incontáveis clones do Helloween e Gamma Ray que infestam a cena do heavy metal atual, vem mostrando, constantemente, que foi pré-julgado errôneamente. Desde seu auto-intitulado début até seu atual álbum, 16.6 (Before the Devil Knows Youre Dead), a banda capitaneada por Matt Sinner (baixo) e Ralf Scheppers (vocal) vem lançando trabalhos sempre sólidos e cada vez mais maduros. Longe de quererem re-inventar a roda, tudo o que o Primal Fear promete em seus álbuns é um power metal raçudo e empolgante, totalmente calcado na escola alemã. E é isso que o fã pode esperar em 16.6...
Como já é praxe no gênero, o disco começa com uma introdução curta, "Before the Devil Knows youre Dead", que não acrescenta nada, mas também não atrapalha. O álbum começa mesmo com "Riding the Eagle", uma faixa típica do Primal Fear, com os duelos de guitarra de Magnus Karlsson e Henny Wolter e a bateria sempre precisa de Randy Black. Um belo cartão de visitas para um álbum que, no geral, é bastante homogêneo e cuja qualidade se mantém lá em cima.
Alguns destaques individuais, no entanto, se fazem notar, como "Six Times Dead (16.6)" e seu refrão grudento, a épica "5.0/Torn" e as pesadas e rápidas "Killbound", "Smith and Wesson" e "The Exorcist". Há ainda espaço para uma grande balada, no caso, a faixa que fecha o álbum "Hands of Time" e que tem todo um clima de AOR/Hard rock, algo não muito comum na carreira da banda. Por outro lado, o destaque negativo vai para "Soar", cujos elementos modernos lembram muito uma música de nu-metal. Não é de todo ruim, mas está abaixo do resto do álbum.
É seguro dizer que, com 16.6 (Before the Devil Knows Youre Dead), o Primal Fear dá mais um passo positivo para se estabelecer como uma das melhores bandas de power metal da atualidade.
Heaven & Hell - The Devil You Know
The Devil You Know é o primeiro álbum em estúdio do Heaven & Hell, banda formada por Ronnie James Dio (vocal), Tony Iommi (guitarra), Geezer Butler (baixo) e Vinnie Appice (bateria). O quarteto foi responsável por uma das formações do Black Sabbath nos anos de 1980 e se reuniu quando a gravadora do Sabbath pediu que eles - na época, com Bill Ward na bateria - gravassem três faixas inéditas para a coletânea Black Sabbath - The Dio Years. Ao final daquela experiência, Iommi e Dio pensaram que seria legal fazer uma turnê para divulgar a coletânea. Gostaram do resultado e resolveram continuar juntos. Para não criar confusão entre os fãs, adotaram a alcunha de Heaven & Hell por ter sido esse o primeiro álbum do Black Sabbath com Dio nos vocais. A banda, inclusive se nega a tocar qualquer música do Sabbath que não seja dessa fase, com Dio capitaneando os vocais e com a substituição de Ward por Appice nas baquetas.
De qualquer forma, The Devil You Know é o primeiro esforço em conjunto do quarteto e é inevitável não compará-lo com o trabalho que eles fizeram ainda sob a marca do Black Sabbath nos anos de 1980. Contudo, o grande mérito do Heaven & Hell é justamente não se apoiar no seu passado e não tentar recriá-lo. Mesmo que negá-lo seja impossível. Assim, The Devil You Know acaba sendo um álbum completamente novo, mas com aquele gosto que remete ao passado.
"Atom & Evil" começa trazenzo aquelas características indeléveis a seus compositores. Daí até "Breaking into Heaven" o que se tem é um belo álbum daquele rock pesado que beira o heavy metal ao qual os fãs do Black Sabbath estão tão acostumados. Mesmo na casa dos 60 anos, Ronnie James Dio ainda tem um dos gogós mais potentes do rock mundial e prova isso logo de cara; Tony Iommi não é chamado de "o rei dos riffs" à toa e prova novamente que ainda tem diversas cartas para usar em suas mangas; já a cozinha de Butler e Appice mostra-se bastante competente, segurando as pontas e garantindo a base necessária para que Iommi e Dio brilhem.
Não há muito mais o que se falar de The Devil You Know. Afinal, trata-se do primeiro álbum de uma banda cujos membros tem praticamente quatro décadas de estrada e experiência para de sobra para saber exatamente onde serem técnicos e onde deixar as coisas mais básicas em prol das músicas como um todo. Indispensável para qualquer fã do Black Sabbath.
Alice in Chains - Black Gives Way To Blue
Não leva muito tempo para a audição de Black Gives Way To Blue, álbum de retorno do Alice in Chains, me transmitir uma grande sensação de déjà vú.
Para quem não usava camisas de flanela há uma década e meia, um breve histórico do grupo de Seattle. Após a morte de Layne Staley (vocal), em 2002, era dada como certa a dissolução oficial da banda (na prática, ela havia acontecido em 1996, quando o Alice in Chains lançou seu terceiro álbum com gravações inéditas e "deu um tempo"). Na época, os demais membros (o guitarrista Jerry Cantrell, o baixista Mike Inez e o baterista Sean Kinney) estavam envolvidos em projetos paralelos e a morte do vocalista foi a pá de cal jogada sobre a sepultura da banda. Em 2005, no entanto, o grupo voltou timidamente, fazendo shows aqui e ali, procurando um novo vocalista. William DuVall, da banda Comes with the Fall assumiu o posto e agora o Alice in Chains finalmente lança seu 4º álbum, Black Gives Way To Blue. E, por incrível que pareça, não parece que se passaram 14 anos desde o último álbum.
Black Gives Way To Blue traz o mesmo Alice in Chains dos anos 1990. Sério. Não há praticamente qualquer diferença entre o trabalho atual da banda e aquele realizado no meio da década passada. Até mesmo os vocais dobrados de Staley e Cantrell são reproduzidos entre o guitarrista e DuVall. E falando em DuVall, é impressionante como sua voz e seu timbre vocal são praticamente idênticos aos de Staley. Feche os olhos e dá até para pensar que se trata de um disco feito com sobras de gravação da época em que o AiC estava no auge.
Black Gives Way To Blue é bastante homogêneo, o que torna difícil indicar destaques individuais no álbum. Mas a faixa título, que tem a participação de Elton John e é uma homenagem ao falecido Staley talvez seja um deles. No mais, é um álbum sólido, ainda que sem quaisquer novidades, o que deve agradar aos fãs da banda na mesma medida em que desagradará aqueles que esperavam que o AiC se reinventasse depois de 14 anos sem músicas inéditas.