Fruto Proibido: o manifesto de Rita Lee a um rock feminino e cor-de-rosa

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Música

Fruto Proibido: o manifesto de Rita Lee a um rock feminino e cor-de-rosa

Como uma das maiores vozes do rock subverteu o estereótipo machista do rock ‘n’ roll

Omelete
5 min de leitura
01.06.2023, às 15H58.

Texto por Gabriela Marqueti

Os anos 70 foram decisivos e revolucionários quando o assunto são direitos das mulheres. Enquanto o Brasil ainda se encontrava em um período delicado de Ditadura Militar, ao redor do globo surgiam mais e mais grupos ativistas que visavam discutir a situação da mulher, tanto no mercado de trabalho quanto na sociedade.

Também foi um período desafiador e libertador por si só. Era a época do rock and roll, da liberdade sexual, do estilo de vida hippie e do uso recreativo de drogas, eternizado no imaginário popular com a realização do festival Woodstock em 1969, nos Estados Unidos. Eram anos de desafiar o sistema, a máquina de guerra imperialista e as condutas rígidas impostas aos jovens pelos adultos.

Foi nesse contexto que Rita Lee lançou aquele que se tornaria seu álbum mais emblemático e significativo: Fruto Proibido (1975). Esse foi o segundo disco da cantora com a banda Tutti Frutti. Depois de ser demitida dos Mutantes em 1972, Rita encontrou sua própria identidade enquanto artista e musicista e fez não só um álbum solo, mas um disco de blues rock propositalmente feminino para confrontar a lógica machista de que o rock precisava ser um lugar agressivo, com pose de machão e cheio de testosterona.

Em Fruto Proibido, ela fez questão de trabalhar usando “seu útero e seus ovários”: exatamente as características que faziam dela um ser estranho no rock, uma presença que não era bem-vinda em meio à patotinha masculina. Na tão simbólica capa cor-de-rosa, Rita Lee aparece de vestido, com os cabelos longos, exibindo seu teclado (que não era considerado um instrumento muito rock ‘n’ roll) e encarando a câmera numa postura ao mesmo tempo sensual e desafiadora, mostrando que a feminilidade também é disruptiva e revolucionária. E também é rock ‘n’ roll.

O próprio nome Fruto Proibido já é instigante e desafiador por si só. Remete ao pecado original descrito na Bíblia, a desobediência de Eva ao comer o fruto proibido colocado no jardim do Paraíso. Sob a ótica de alguns, uma prova de que a mulher é naturalmente um ser vil, não-confiável, traiçoeira desde a criação da Humanidade. Sob a ótica de outros, a constatação de que ela foi criada para ser livre e questionar o lugar que lhe é imposto em meio a lógicas duvidáveis.

O rock em si também tinha gosto de proibição, especialmente em tempos rígidos e restritivos como a Ditadura Militar. E parecia ser um lugar ainda mais proibido para as mulheres: essas criaturas frágeis e sensíveis que nada entendiam de fazer “música de homem”. Mas os Estados Unidos tinham Janis Joplin. Nós tínhamos Rita Lee.

Lançado em 1975, coincidentemente no ano da primeira Conferência Mundial da Mulher, Fruto Proibido provou que o rock podia ser feminino e cor-de-rosa. Não só a execução musical das canções de blues são impecáveis, mas todos os temas são relevantes e pertinentes especificamente às mulheres e ao seu lugar no mundo. Nada nesse disco fala sobre usar drogas e transar com groupies, mas sim sobre a busca da identidade pessoal e de conquistar seu próprio espaço. Subverte toda a ideia de rock ‘n’ roll atrelada a uma postura machista e exibicionista.

“Dançar Pra Não Dançar” abre o disco trazendo uma temática relevante até os dias de hoje e revolucionária para a época: a liberdade do corpo feminino. Não apenas a liberdade sexual, mas a autonomia da autoexpressão, de poder se movimentar por entre a sociedade, transitar entre espaços, se divertir, vivenciar, experimentar sensações. Esse corpo que historicamente tanto foi reprimido e usado apenas como ferramenta reprodutiva agora é convidado a dançar, amar e sentir. “Sinta o corpo / Você está solto e pronto pra vir me amar”, provoca Rita Lee.

Todo o restante do disco toca em temas sobre autoconhecimento e autonomia. Em um de seus maiores sucessos, “Agora Só Falta Você”, Rita fala sobre o prazer de se encontrar, de saber quem é e também seu lugar no mundo. A temática se repete em “Ovelha Negra”, onde ela abraça não só a própria identidade, mas a liberdade de se destacar, de ser um verdadeiro ponto fora da curva. Já “Esse Tal De Roque Enrow” traz um verdadeiro choque de gerações entre uma mãe preocupada com a postura rebelde da filha, que encontrou no rock ‘n’ roll toda uma forma de expressão e estilo de vida (coisas essas que provavelmente foram negadas à mãe durante a juventude).

Toda essa postura desafiadora de Rita Lee e a resignação em aceitar o lugar que os homens do rock queriam relegar a ela é melhor resumida na excelente “Pirataria”. Nessa faixa, ela questiona de maneira bastante direta aqueles que tentam, de alguma forma ou de outra, tomar decisões por ela. “Quem falou que não pode ser? / Não, Não, Não / Eu não sei por quê / Eu posso tudo / Tudo”.

Ao aceitar que podia tudo, Rita Lee fez um dos álbuns que entraram para a história da música brasileira e segue sendo relevante até hoje. Ao se recusar a assumir uma postura masculina para se encaixar no rock, ela abriu portas para que as mulheres entrassem nesse meio sendo exatamente quem são. Porque o rock também é feminino, também é feito de vestidos e teclados e Evas e ovelhas negras. E os temas que queremos explorar dentro desse espaço só cabem a nós.

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Divulgação e Arte/Wikimetal

Gojira e Mastodon se apresentam no Espaço Unimed, na Barra Funda, em São Paulo, no dia 14 de novembro (terça-feira), com produção da MOVE Concerts. Os ingressos estão à venda no site da Livepass, com valores entre R$ 225 (meia-entrada da pista comum) e R$ 850 (inteira no camarote).

Atualmente, ambas as bandas estão viajando pelos Estados Unidos com a turnê, que já passou por mais de 17 estados no país entre abril e maio. O giro conjunto terá uma breve pausa para a época de festivais europeus, mas retorna em agosto pelos EUA, por onde segue até setembro antes de desembarcar em nosso continente.

Além do Brasil, a turnê passa ainda por Argentina, Chile e Colômbia.

PARA OUVIR

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Within Temptation lançou nesta sexta-feira, 19, o novo single “Wireless”, no qual a banda narra as desilusões da guerra. A música inicia a contagem regressiva para o tão aguardado lançamento do oitavo álbum de estúdio da banda, previsto para o final do ano.

Com uma atmosfera sombria e pesada, guiada pelos vocais limpos de Sharon Den Adel, a faixa chega com a missão de representar o início de uma nova era para a banda. Para o novo disco, o Within Temptation pretende manter o DNA vivo, mas também expandir os horizontes com com riffs poderosos e refrões épicos.

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