Nada mais oportuno do que presenciar o lançamento do novo trabalho do Slash bem na semana em que se comemoram os 27 (vinte e sete!!!) anos dos dois (já) clássicos Use Your Illusion, do Guns N’ Roses. Interessante é perceber como o Slash ainda parece aquele mesmo cara, com aquele mesmo chapéu e óculos escuros, movimentando sua guitarra daquele mesmo jeito que o consagrou como uma das maiores lendas do instrumento, como se quase 3 décadas não tivessem passado.
A energia é a mesma. A criatividade nos solos e nos riffs também. Agora, ao lado de Myles Kennedy e de volta com os The Conspirators apresenta Living The Dream, um disco que demorou praticamente 3 anos para ser feito - muito por conta das turnês intermináveis do Guns - mas que era a menina dos olhos de Slash.
"The Call Of The Wild" e "Serve You Right" abrem o trabalho com um rock n' roll de responsa, já mostrando a ansiedade que devia estar tomando conta desses músicos para soltar um trabalho novinho em folha. Não são músicas inovadoras, por assim dizer, mas deixam você com vontade de mergulhar a fundo no álbum.
Já "My Antidote" resgata os velhos tempos de Velvet Revolver numa pegada bem mais crua, mais rebelde, com oscilações de tempo e um riff matador. O próprio Slash admitiu que essa faixa surgiu da vontade de fazer algo realmente bem pesado e sujo, para dar ainda mais ênfase à mensagem de que a mesma coisa que motiva você pode ser aquela que também vai te destruir. No caso de Myles, o antídoto seria a própria música, "my antidote in stereo".
O disco é um prato cheio para quem quer matar aquela vontade de aumentar o volume com nada mais nada menos que o bom e velho rock, sem frescuras, sem invenções desnecessárias e com muita, muita guitarra. "Mind Your Manners" é despretensiosa e parece ter sido só uma desculpa para distorcer tudo - e é só o que você precisa para colocar o volume lá no alto também: é crua, simples, energética e básica. E vai fazer seu fone tremer. Assim como a música homônima do Pearl Jam, traz o mesmo espírito e agrada logo na primeira audição. Eficiente e satisfatória como todo bom rock deve ser.
"Read Between The Lines" e "Lost Inside The Girl" são mais carregadas. Bem carregadas, para falar bem a verdade. "Lost Inside The Girl" nasceu no violão e se transformou quando Slash ouviu os vocais de Myles para ela pela primeira vez e se deu conta que havia escrito uma música "romântica" (note as aspas) mas ao mesmo tempo super densa e quase sombria: é a história de um stalker do Instagram que passa a aterrorizar a vida de alguém a ponto da situação ficar realmente séria. É uma das melhores do disco até por conta disso: a melodia e o instrumental são poderosos; a letra é quase assustadora e os vocais completam a mensagem de uma maneira que quebra - positivamente - a atmosfera quase ingênua do resto do disco.
"Sugar Cane" e "The Great Pretender" são duas das melhores coisas que o Slash já fez em toda a sua vida. Com o perdão do exagero, elas se destacam aqui e poderiam muito bem ter sido parte da obra do Guns N' Roses em seus dias gloriosos. "Sugar Cane" é original e criativa, um daqueles riffs que dão até raiva por não ter sido você quem inventou. E tudo misturado com uma seção rítmica baseada em R&B que deixou o produto final incrível e instigante. A letra não traz grandes inovações e fala sobre a hora “certa” de sair de um relacionamento problemático, mas mesmo esse tema um pouco batido não conseguiu destruir a originalidade da música.
Living The Dream traduz com perfeição o momento de Slash, Myles Kennedy e os Conspirators. Eles estão preocupados só em tocar, encher estádios, fazer barulho - no bom sentido - e literalmente em continuar vivendo o sonho. Para um cara que está fazendo isso há mais de 30 anos, ainda conseguir transbordar essa energia quase adolescente e essa empolgação é um fato admirável. Dizem que quando você realmente ama o que faz, não trabalha um dia sequer na vida. Parece que é exatamente isso que acontece com Slash e sua banda. E a grande maioria das músicas de Living The Dream - divertidas, cruas, ambiciosas em alguns pontos e aventureiras em quase todos - reflete isso. Quem espera um disco despretensioso para deixar rolando e curtir uma banda confiante e competente não tem como errar.