Expedition 33 evidencia falta de critério na definição de jogo indie
Game aparece em ambas categorias independentes da premiação, mas foi contestado
Era inegável que Clair Obscur: Expedition 33 apareceria em várias categorias do The Game Awards 2025. O game é excelente, e não é um dos favoritos para o título de Jogo do Ano à toa — mas será que ele merece todos os louros? A indicação aos troféus de Melhor Jogo Independente e Melhor Jogo Independente de Estreia levantaram uma discussão que já era inevitável: o que é um jogo indie?
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A resposta simples para essa pergunta é que ninguém sabe definir um jogo independente com precisão. Há uma série de ângulos que podem ser adotados, favorecendo um ou outro aspecto do processo de desenvolvimento de um game. A visão do The Game Awards, que talvez seja a mais relevante para esta discussão em específico, não diz respeito a financiamento, orçamento ou tamanho da equipe, e sim a visão criativa:
“Para conquista técnica e criativa em um jogo feito fora do sistema tradicional de publicação”, é o que lê a descrição da categoria no site oficial da premiação. A publicação tradicional, claro, significa ter uma empresa como responsável por distribuir o jogo ao público e, eventualmente, financiar o projeto — e entre os seis indicados deste ano, somente dois não possuem essa figura.
A presença de uma publisher, mesmo que fosse impensável nos primórdios dos indies com Braid e Limbo, já deixou de ser uma barreira para que um game seja considerado independente. Marcas como a Devolver e Annapurna ajudam a trazer projetos pequenos para os holofotes, ora por networking e parcerias com grandes eventos, ora por meio de financiamento.
Com injeção de fundos, desenvolvedores conseguem se estruturar melhor e dar vida ao game da forma que o imaginaram, mas podem perder a “independência” de acordo com o viés do público. Para complicar a questão, há ainda estúdios indie que já são consolidados e passam longe de ter qualquer limitação de orçamento. Neste ano, Hollow Knight: Silksong e Hades 2 são exemplos de títulos que, mesmo sob a bandeira independente, contaram com o sucesso de seus antecessores para se financiarem.
Expedition 33 se encontra em um lugar peculiar desse amálgama de regras e exceções: a Sandfall não era uma desenvolvedora consolidada, mas teve incentivo financeiro da Kepler Interactive, empresa que surgiu da união de sete estúdios independentes mas é parcialmente propriedade da NetEase.
O orçamento fornecido, ainda assim, não era tão grande, considerando que a equipe fixa do estúdio mal supera os 30 membros. Por outro lado, o dinheiro foi suficiente para trazer nomes como Charlie Cox e Andy Serkis para o elenco, mas o próprio Cox já brincou que não gastou mais do que quatro horas no estúdio de gravação, indicando que nem teve um cachê tão alto assim.
Não é como se grandes nomes de Hollywood fossem exclusivos de Clair Obscur, também. No próprio The Game Awards 2025, Dispatch concorre como Melhor Jogo Independente de Estreia e tem Aaron Paul e Jeffrey Wright no elenco. Expandindo um pouco, 12 Minutes, de 2021, está dentro do escopo independente mas tem James McAvoy, Daisy Ridley e Willem Dafoe creditados.
Para além da presença de publishers, orçamento e elenco, é inegável que a percepção do que é independente passa pela estética. O fato de Expedition 33 ser fotorrealista e feito na Unreal Engine 5 faz com que a primeira impressão sobre ele já passe longe do que o público aprendeu a enxergar como indie. Não é loucura imaginar que alguns jogadores vejam Ori and the Blind Forest, feito dentro do Xbox Game Studios, como “mais indie” do que Clair Obscur. Da mesma forma, o simpático Dave the Diver foi indicado como Melhor Jogo Independente de 2023 mesmo tendo a gigante NEXON como financiadora. Enquanto isso, o autopublicado Baldur’s Gate 3 passou longe dessas categorias.
Já faz algum tempo que a definição de jogo indie passa mais pela “vibe” do que por qualquer outro critério exato. Talvez a execução de uma visão criativa sem a necessidade de agradar executivos seja a definição mais justa possível na atualidade — e foi esse o argumento usado pela Kepler em mensagem enviada para o júri do The Game Awards.
“Clair Obscur: Expedition 33 representa o auge do que pode ser atingido quando um time talentoso pode estabelecer e perseguir sua visão criativa. Desenvolvido por uma equipe de pouco mais de 30 pessoas num estúdio em Montpellier — incluindo vários membros que nunca tinham feito um video game —, Clair Obscur: Expedition 33 é o resultado da Sandfall Interactive poder perseguir sua visão sem restrições”, diz a declaração.
Na mesma indústria, Josef Fares afirma com toda a ênfase possível que teve liberdade absoluta para Split Fiction e It Takes Two, que não passaram por qualquer aprovação da Electronic Arts e jamais seriam sequer cogitados como jogos indies.
A cada ano, o título de independente vai se aproximar mais de algo que visa dar atenção a desenvolvedores pequenos do que uma definição que considere publishers, orçamento e afins. Em uma visão pessimista, isso abre mais espaço para que grandes empresas se apropriem de trejeitos indies em busca de um olhar mais paciente — mas, por enquanto, é melhor celebrar a existência de Blue Prince, Silksong, Hades e tantos outros excelentes nomes.
Sobre Clair Obscur, o status fica a critério do observador. Na minha visão, algumas nuances o colocam como independente: a origem como pequeno estúdio, que não se agigantou com o investimento externo, e a inexperiência da equipe de desenvolvimento, juntam-se com o respeito à visão criativa como critérios que são mais relevantes do que o financiamento ou a presença de estrelas de Hollywood.
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