Skate Story grita que games são arte, caso você tenha esquecido
Sam Eng desenha jornada vulnerável e reflexiva, mas sem deixar a vibe cair
Há muitas formas de começar este texto com elogios a Skate Story, mas talvez seja suficiente dizer que ele é um dos melhores jogos do ano. Existe um charme único em games que foram idealizados e executados por uma única pessoa: é como se você estivesse olhando para um retrato interativo de alguém, e a cada botão apertado, descobre-se algo novo.
É com essa vulnerabilidade que Sam Eng, ironicamente, nos apresenta a um skatista de vidro. A figura mais frágil possível se arrisca em um hobby que definitivamente não combina com sua natureza. E daí? Com poucas remadas, já é fácil de entender que Skatista e Skate são apenas um.
Ao longo de dez capítulos, o jogador é apresentado a um enredo que fica cada vez mais maluco. Você é um demônio skatista de vidro que quer… comer a Lua. Porque sim. E não há grandes explicações expositivas dos poucos NPCs com quem você interage, mas é nesse quase dadaísmo que o viés artístico ganha mais espaço.
Um jogo nem sempre é sobre vencer chefões, passar de fases e viver uma história. E andar de skate também não precisa ser sobre acertar todas as manobras. Às vezes, a vibe é mais importante do que qualquer outro elemento, e é nisso que Skate Story acerta em cheio.
A ambientação é perfeita: um estilo visual único, que abusa do psicodélico e traz referências de Evangelion a arquitetura greco-romana; uma trilha sonora que faria frente a qualquer outro título de 2025 — sim, até Clair Obscur: Expedition 33. E é claro que nenhum rolê está completo sem um sistema de manobras simples e profundo, que te engaja mesmo quando não é necessário aumentar pontuações ou coisa do tipo.
É muito fácil saber quando uma mecânica é realmente boa: basta se pegar abusando dela sem o menor motivo. Em God of War, o arremesso do machado de Kratos era estranhamente satisfatório, assim como a inspeção de uma Desert Eagle no Counter-Strike: Global Offensive. Em Skate Story, esse posto é ocupado por manobrar seu skate.
Ollies e kickflips raramente são obrigatórios a cada fase. O jogo alterna entre sequências bem lineares, como corredores em que se precisa chegar ao próximo portão, e outras mais abertas, como grandes playgrounds para você arriscar suas tricks elaboradas. Alguns portões vão se abrir somente ao flipar seu skate, e outras missões só serão superadas com sequências específicas, mas a verdade é que você vai querer fazer isso o tempo todo.
Sabendo dessa virtude, Eng inseriu lutas de chefão em que as manobras são os golpes. Crave uma sequência longa e arranque um teco de vida do seu adversário, mas não sem escutar um indie eletrônico explodindo nos seus fones de ouvido — finalmente entendi por que Rayssa Leal e todos os outros skatistas usam fones enquanto competem, e agora quero aprender a fazer um heelflip.
É imergindo nessa vibe imaculada que o jogador finalmente consegue, talvez, entender alguma coisa que está sendo dita ali. É nítido que o game brinca com o estigma e marginalização do skate como hobby. Ele literalmente desenha a frase que tantas crianças já devem ter ouvido: “Skate é coisa do demônio”.
Ao invés de tentar renegar essa máxima, Eng prefere abraçá-la e questioná-la. E se estiver tudo bem em ser um demônio? E se o skate for o seu propósito? Você realmente precisa se justificar para outras pessoas? O que está te impedindo de ser genuinamente você?
Com a premissa maluca de comer Luas, Skate Story nos propõe de formas sutis uma reflexão extremamente profunda, mas sem nunca abandonar a catarse sensorial. É inacreditável que um título sem tanto alarde seja, em 2025, o que mais deixa explícito que videogames são arte.
Skate Story
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