Combinar a carnificina característica de Doom com uma ambientação medieval é uma mistura que dificilmente daria errado. Em Doom: The Dark Ages, a id Software prova que existe espaço para se reinventar, mesmo que nas nuances, dentro de uma franquia que renasceu há quase dez anos. Não se engane com a promessa de que o novo jogo é mais lento: a sinfonia da destruição toca no mesmo ritmo que embalava os outros dois títulos, mas com notas mais graves.
A nova jornada do protagonista Doom Slayer antecede os eventos de Doom (2016), colocando o lacônico personagem no momento inicial da invasão infernal à Terra. Como sempre, ele é o último recurso para uma guerra que não está nada favorável aos humanos, e é visto mais como uma arma quase incontrolável do que um aliado na batalha.
Mas, sejamos sinceros, não é exatamente pela história ou pelos plot twists que você mais anseia quando falamos de Doom. Para alegria daqueles que gostariam de ver um pouco mais de profundidade no enredo, ou para desespero de quem só se interessa pela porradaria sanguinolenta, The Dark Ages tem um foco até que surpreendente no seu roteiro.
Não espere diálogos profundos e reflexões filosóficas, mas há um carinho maior com o pano de fundo. A novidade é bem-vinda, e serve, nos momentos chave, como combustível para atirar com ainda mais ódio contra certos inimigos.
Afinal, Doom é sobre isso: batalhas frenéticas contra demônios, e o Slayer nunca esteve tão estiloso quanto na era medieval. Equipado com novos brinquedos, como o Serraescudo — que, veja só, é um escudo com uma serra —, um mangual e a já famosa metralhadora que usa crânios como munição, o personagem segue transmitindo todo o poder que passamos a esperar dele.
Ao menos na trilogia contemporânea, o final boss não é o demônio mais forte ou a criatura cósmica da última fase. Você, o Doom Slayer, é o chefão a ser temido.
Diferente de um boss tradicional, entretanto, o jogador de The Dark Ages não é limitado por combos pré-definidos ou ataques previsíveis. Sua única barreira é a própria criatividade: só entre armas de fogo, são doze possibilidades, entre metralhadoras, escopetas e uma releitura curiosa da BFG. Há também três opções de corpo-a-corpo e quatro runas para o Serraescudo, com combinações praticamente infinitas de como usá-las.
Tendo tudo isso a seu dispor, o Slayer precisa se atentar especialmente ao timing em que os inimigos estão atacando. O Serraescudo é introduzido junto de um sistema de parry, que permite defletir alguns golpes adversários, sempre identificados pela cor verde. Com essa mecânica, projéteis são enviados de volta para os demônios e ativam sua runa, uma habilidade passiva de seu escudo, que tem efeitos como invocar adagas ou eletrocutar o terreno ao redor; em ataques corpo-a-corpo, os parries causam pequenos atordoamentos, dando uma pequena janela para revidar.
A mecânica é bem satisfatória, mas pode levantar preocupações para quem ainda não colocou as mãos no jogo. Parry, afinal, é coisa de quem joga soulslike e quer sofrer com chefões impossíveis. Essa preocupação, felizmente, cai por terra em poucos minutos de gameplay; as janelas de aparo são bem generosas, e boa parte da proposta de The Dark Ages é trazer de volta os “tiros lentos” dos Doom das antigas — não à toa, é bem normal correr atrás de um projétil verde para poder defletí-lo, mesmo que ele não estivesse indo em sua direção.
Essa tal lentidão, reforçando, foi usada para exemplificar a cadência menos frenética do game, mas não é bem assim. O termo “sandbox de destruição” certamente já foi usado para descrever os outros games de Doom, e ainda se aplica aqui: há bastante liberdade para encarar o campo de batalha como quiser, inclusive de forma que beira o estonteante.
O Slayer não voa como em Eternal, e corre mais devagar do que no jogo de 2016, mas ainda tem dashes e bastante velocidade em seu arsenal. Talvez a principal mudança seja no cenário em si, que costuma ser bem mais expansivo do que nos outros dois jogos, fazendo com que a distância percorrida entre uma horda e outra acabe sendo um pouco maior — assim como deixar a busca por colecionáveis um pouco mais devagar.
Dadas essas condições, há jogadores que vão preferir um combate mais metódico, mas também existem aqueles que enxergam Doom como uma oportunidade de entrar num fluxo destrutivo quase inconsciente, onde você sempre sabe qual será sua próxima ação, mesmo que a tela esteja repleta de borrões, sangue e membros decepados.
Garantindo que todos os jogadores poderão ter essa experiência, a id Software dá bastante liberdade na customização de dificuldade. Além das opções pré-definidas, é possível ajustar aspectos específicos da jogabilidade para construir o cenário perfeito para sua destruição, como a duração das janelas de parry, a agressividade dos inimigos e até a velocidade do jogo como um todo.
The Dark Ages é o catalisador perfeito para essa sensação de onipotência, mas peca justamente quando precisa demonstrar mais poder: entre as 22 missões do jogo, há alguns momentos em que o Slayer monta em um dragão para combates aéreos, assim como sequências em que ele pilota um Mecha gigantesco, chamado Atlan.
Ambas são empolgantes à primeira vista, mas rapidamente se tornam, por motivos diferentes, pontos fracos do game. O Atlan é pesado e poderoso como se esperaria, e é divertidíssimo atropelar construções enormes como se fossem feitas de areia, mas as batalhas dentro do robozão são quase coreografadas.
Dadas as proporções, as lutas lembram as de Hellblade 2 pela sua “protocolaridade”. Os golpes dos inimigos gigantes são extremamente lentos, e desviar deles é bem fácil. Responder os ataques e derrotar os inimigos fica quase automático, sem entregar quase nenhum desafio.
Há mecânicas interessantes, como carregar ataques especiais para aumentar seu poder destrutivo, mas longe de ser algo que faça os olhos brilharem.
O dragão, por outro lado, entrega muita agilidade, mas quase nenhuma potência. Ainda que acelerar pelos ares, perseguir naves e desviar de obstáculos seja legal, as armas de fogo na sua montaria passam a sensação de não serem tão eficientes assim, especialmente quando se depende de esquivas — que, mais uma vez, são triviais — para desbloquear a munição mais poderosa, que dura três ou quatro disparos.
Em um jogo que se compromete, a todo momento, em dar todo o poder do Slayer para o jogador, as sequências aéreas parecem “nerfadas”. Não é como se esses pontos, tanto o dragão quanto o Atlan, fossem péssimos, eles só são nitidamente inferiores ao restante da ação. Entre os pontos negativos, o que realmente se sobressai é, veja só, o enredo.
Novamente, não espera-se uma construção genial para a história de um Doom, mas saber aproveitar seu clímax é um traço característico da série. No apagar das luzes, quando o jogador está possuído por um ódio quase tão profundo quanto o do Slayer, o game joga uma missão longa e desnecessária na sua cara, diluindo a emoção que o fim do enredo poderia carregar.
Ainda assim, quando o último demônio cai, a sensação é satisfatória. Doom: The Dark Ages consegue encontrar uma releitura sutil, mas definitivamente distinta, para o estilo que a franquia vem adotando nessa nova trilogia. No fim das contas, o que importa em um jogo como esses é a diversão em brutalizar seus inimigos, e a id Software precisa fazer bastante força para perder a mão nesse aspecto.
Doom: The Dark Ages
Doom: The Dark Ages
Lançamento: 15.05.2025
Desenvolvedora: id Software
Publicadora: Bethesda
Gênero: Shooter, FPS
Classificação: 18 anos
Plataformas: Xbox Series X , PlayStation 5 , PC
Testado em: PC
Comentários ()
Os comentários são moderados e caso viole nossos Termos e Condições de uso, o comentário será excluído. A persistência na violação acarretará em um banimento da sua conta.
Faça login no Omelete e participe dos comentários