Metroid Prime 4: Beyond aposta alto e cai nas armadilhas dos jogos modernos
O retorno de Samus Aran é marcado por muitas tentativas e poucos acertos
Após quase duas décadas de espera, um longo e conturbado período de desenvolvimento, que inclusive levou a própria Nintendo a reiniciar o processo, a série Metroid Prime finalmente recebe uma nova sequência. Metroid Prime 4: Beyond é o novo capítulo da saga que nasceu no GameCube em 2002 e teve seu último título, Corruption, lançado em 2007 para o Nintendo Wii. A franquia se notabilizou pela transição para a perspectiva de aventura em primeira pessoa, uma mudança muito bem recebida pelo público, o que contribuiu para o sucesso e a aceitação da série no Ocidente.
Antes de adotar essa nova fórmula, a série Metroid consistia em jogos side scrollers 2D. Neles, os jogadores controlavam Samus Aran, uma caçadora de recompensas de poucas palavras que geralmente trabalha para a Federação Galáctica. Sua missão era frequentemente impedir os planos dos Piratas Espaciais nos confins do cosmos. Esses títulos se tornaram extremamente influentes e marcaram época, incentivando a exploração por meio de vastos mapas interconectados. O impacto de Super Metroid foi tão grande e revolucionário que, ao lado de Castlevania: Symphony of the Night, deu origem a um subgênero de jogos conhecido mundialmente como metroidvania.
A longa espera por Metroid Prime 4: Beyond gerou muita especulação desde seu anúncio na E3 de 2017. No ano seguinte, a Bandai Namco foi confirmada como a desenvolvedora do jogo. Contudo, em janeiro de 2019, quase um ano após esse anúncio, a Nintendo comunicou publicamente que estava recomeçando o projeto do zero e transferiu o desenvolvimento para a Retro Studios, o estúdio responsável pelos três títulos anteriores da série Prime.
O jogo foi revelado novamente, cinco anos depois, para surpresa de muitos que já haviam perdido a esperança e até cogitavam um possível cancelamento. Desta vez, ele veio com o subtítulo "Beyond" e acompanhado de um trailer de anúncio que exibia gameplay e marcava o retorno de personagens cruciais para a história.
A trama de Metroid Prime 4: Beyond começa imediatamente após os eventos de Corruption. A Federação Galática envia um pedido de ajuda a Samus Aran após um ataque dos Piratas Espaciais a um de seus centros de pesquisa, situado no planeta Tanamaar. Ao chegar, Samus depara-se com Sylux, um caçador de recompensas enigmático, movido por um profundo ressentimento contra Samus e a Federação. Sylux e os Piratas Espaciais buscam um artefato misterioso mantido no centro de pesquisa que nem a Federação ainda serve para que serve. Ao tentar impedir o roubo, Samus confronta Sylux, durante o conflito o artefato é acidentalmente atingido, que ao ser danificado, cria uma fenda espacial e teleporta Samus para um local desconhecido.
Ao explorar este novo local, Samus logo descobre que se trata da Cronotorre, uma estrutura construída no distante planeta Viewros. Este planeta é o lar dos Lamorn, uma raça alienígena antiga e poderosa, conhecida por seus poderes psíquicos. Samus encontra o último ser vivo dessa raça e é revelado que ela é o ser destinado pelos Lamorn, o que a leva a adquirir poderes psíquicos. Para retornar ao seu planeta, Samus precisa reunir cinco chaves e, em seguida, ativar o teletransportador que está localizado dentro da Cronotorre.
Somos levados então à primeira área do jogo e seguimos o loop tradicional de qualquer Metroid. Como manda a tradição da série, devemos ir atrás de todos os equipamentos e melhorias, já que por conta de ser transportada para esse planeta Samus perde todos seus equipamentos e precisa ir atrás de tudo outra vez. A primeira região é bem básica e não tem muita exploração, serve mais como um tutorial para os novos poderes psíquicos que Samus tem.
Esses poderes são o ponto central de toda a narrativa desse jogo, é com eles que Samus consegue desvendar e interagir com tudo no planeta. Desde abrir portas a mexer na tecnologia desconhecida dos Lamorn, tudo gira em torno dos novos poderes psíquicos da protagonista. Ao explorar a primeira região conhecemos Myles MacKenzie, um engenheiro da base de Tanamaar que também foi transportado para este planeta. Myles reconhece Samus e logo se unem para encontrar as chaves da Cronotorre.
Este é o primeiro ponto que divide opiniões deste jogo. A franquia já teve personagens que interagiam com Samus: em Metroid Fusion tivemos Adam, e em Metroid Prime 3 a Aurora Unit. Ambos auxiliavam os jogadores fornecendo informações e servindo como fio condutor narrativo, visto que Samus é uma personagem majoritariamente silenciosa. A única exceção notável a isso foi Metroid: Other M, onde houve uma tentativa falha de mudar completamente o perfil da personagem.
Este jogo representa a primeira tentativa de construir uma narrativa mais alinhada com os padrões atuais. Ao longo da jornada, a protagonista reúne uma equipe de personagens que, infelizmente, se apoiam em clichês típicos e esperados. O elenco inclui o nerd sem aptidão social viciado em tecnologia, o veterano de guerra que esconde sua sensibilidade, a novata que é uma grande fã de Samus e até um sniper mais reservado.
Embora a inclusão de mais personagens possa agradar alguns jogadores, no geral, eles são muito rasos e superficiais. As tentativas de aprofundamento e criar um vínculo, como cutscenes que revelam o que um personagem conta histórias da infância, acabam sendo falhas. Nada disso agrega na narrativa atual do jogo, é só uma tentativa falha de modernizar a série do jeito errado.
No total existem cinco grandes áreas no qual devemos explorar para poder recuperar as chaves, que vão desde laboratórios abandonados na neve até um vulcão que na verdade sempre esconde uma arma gigantesca. É esperado que em certo momento do jogo você acabe revisitando algumas dessas áreas para poder progredir na história, afinal, backtracking é e sempre foi uma das maiores características da franquia.
Desde os trailers de divulgação, essa região tem sido motivo de grande preocupação entre os fãs. Ela é o segundo ponto que divide opiniões do jogo, sendo notável por finalmente dar ao jogador a sensação de um planeta de escala real – um avanço incrível, considerando que antes a exploração se limitava a seções específicas.
Contudo, o problema reside no fato de que esse deserto se revela um grande vazio. Embora apresente alguns pontos de interesse espalhados pelo mapa, estes não oferecem um desafio significativo ao jogador. É justo ponderar que esta é a primeira tentativa da franquia em um "mundo aberto" e na expansão de seus horizontes, mas para uma série que se estabeleceu como referência em exploração de mapas, é decepcionante deparar-se com uma área tão vasta e desprovida de conteúdo que realmente engaje ou exija do jogador.
Como o jogo não oferece um sistema de teletransporte entre as áreas, a solução para o deslocamento no vasto deserto é a Vi-O-La. Essa moto, criada com a tecnologia ancestral dos Lamorn, é adquirida logo no início, antes mesmo de se chegar ao Vale do Sol. Para obtê-la, é necessário passar por um teste de habilitação que ensina não apenas a pilotagem, mas também a utilização do veículo em combate.
Por falar em combate, nada se difere muito do que já foi apresentado nos jogos anteriores. Além dos usuais tiros carregados e mísseis, também temos à disposição munições elementais. O clássico raio de gelo está de volta, pode ser usado para congelar inimigos rápidos para facilitar a luta. Também temos o tiro de fogo, que pode ser usado fora do combate para queimar certas estruturas, além do disparo elétrico, que consegue energizar máquinas e fechaduras.
Com todo esse novo arsenal à disposição, os confrontos contra inimigos comuns perdem a graça, tornando-se triviais. As melhorias para as armas elementais, que aumentam a potência e a capacidade de munição, são obtidas com facilidade. Assim, a responsabilidade de apresentar um desafio maior recai sobre os chefes, mas estes também decepcionam, especialmente no que diz respeito à criatividade. A maioria dessas batalhas se resume a esperar a animação de ataque do chefe terminar para que seu ponto fraco seja exposto. Salvo raras exceções que demandam ações específicas, o jogador se limita a disparar incessantemente.
A performance do jogo se mantém estável e positiva, mesmo durante o combate, com o modo portátil entregando 60 quadros por segundo sem problemas. Os únicos momentos de carregamento ocorrem ao mudar de região, o que nos leva ao terceiro maior problema do jogo. Como já mencionado, é preciso retornar constantemente a áreas visitadas, especialmente à base de operações inicial.
O problema fica mais evidente com a necessidade incessante de interação com outros personagens: sempre que Samus adquire um novo tipo de munição, ela precisa voltar a Myles para que ele decifre a tecnologia alienígena, explique seu funcionamento e a instale no canhão. Em títulos anteriores, nunca houve a necessidade de uma explicação dentro do universo do jogo como os power-ups eram adquiridos.
Esses três problemas, frequentemente interligados, indicam uma tentativa mal-sucedida de modernizar uma franquia que se tornou o DNA de um subgênero de grande sucesso. Se hoje temos títulos como Hollow Knight: Silksong, é porque Metroid pavimentou esse caminho. É compreensível e esperado que franquias busquem se atualizar para oferecer novidades e, assim, atrair um novo público.
O jogo resulta em uma obra que adota as armadilhas de grandes títulos contemporâneos. A tentativa de torná-lo mais narrativo o afasta de sua natureza introspectiva e da sensação de isolamento característica da série. Além disso, a exploração é fraca, com sérios problemas de ritmo, impondo ao jogador a coleta obrigatória de materiais para a progressão da história. Apesar da qualidade visual dos cenários, predomina uma grande sensação de vazio, com layout na maioria das vezes bem linear, que mesmo assim insiste em ter os personagens sempre dizendo onde e como devemos ir. Mesmo com a tentativa de entregar drama com a narrativa dos membros da Federação, a história resulta em um final indiferente, sem qualquer peso significativo para o universo da franquia.
Após oito anos de longa espera, o jogo finalmente chegou. Embora nunca saibamos se os problemas atuais são reflexo de um desenvolvimento conturbado ou se houve conteúdo cortado, é um alívio constatar que a franquia permanece viva.
Metroid Prime 4: Beyond
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