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TELA QUENTE - Agora em cores!: Sexo LGBTQIAPN+ no cinema - Parte 3

No momento em que toda uma geração discute o lugar da sexualidade na mídia, Omelete fala com cineastas e especialistas para destrinchar a história d’Aquilo na tela grande

Omelete
7 min de leitura
04.09.2025, às 06H00.
Atualizada em 17.09.2025, ÀS 16H35

O ESPECIAL TELA QUENTE é uma reportagem do Omelete sobre a história da representação do sexo no cinema, os debates atuais em torno dela, e o impacto na indústria do audiovisual. Composto de seis matérias jornalísticas apoiadas em pesquisa e entrevistas com diversos especialistas - psicólogos, críticos, cineastas, coordenadores de intimidade e mais -, o especial será postado em capítulos entre os dias 2 e 6 de setembro (ou 6/9, quando é comemorado o Dia do Sexo).

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Em um capítulo do seu livro Hi, Honey, I’m Homo: Sitcoms, Specials, and the Queering of American Culture (em tradução livre, “Querida, Saí do Armário: Sitcoms, Especiais e a ‘Queerficação’ da Cultura Americana”), Matt Baume conta a história de Ellen (1994-1998), a inovadora sitcom protagonizada por Ellen DeGeneres que tirou sua estrela do armário - junto com a personagem que ela interpretava na trama - e mudou a TV estadunidense para sempre… só para ser cancelada por falta de anunciantes uma temporada depois, é claro.

O episódio mais lembrado de Ellen é, de longe, “The Puppy Episode” (4x22), exibido em abril de 1997, no qual a protagonista recebe a ajuda de sua terapeuta (Laura Dern) para finalmente se assumir lésbica. Mas foi só seis meses depois, em “Roommates” (5x03), que ela beijou uma mulher pela primeira vez: sua amiga Paige (Joely Fisher), que - por razões atrapalhadas de sitcom - estava fingindo ser namorada de Ellen na trama da vez. Como Baume conta ao Omelete, a bitoca foi o bastante para “a emissora enlouquecer.

Eles mudaram o horário da transmissão para mais tarde, colocaram um aviso para os pais antes do começo do episódio, e Bob Iger [atual CEO da Disney], que comandava a ABC na época, se referiu à cena como ‘atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo’. Era só um beijo!”, relata ele. Enquanto isso, algumas horas antes, no mesmo canal, Dharma & Greg estavam pulando na cama juntos, Drew Carey estava fazendo piadas sexuais a torto e direito, e por aí vai. Nessa era, os casais heterossexuais foram ganhando mais e mais liberdade, testando os limites do que era possível na televisão americana, enquanto os casais homossexuais recebiam no máximo uma menção irônica aqui e ali. Por boa parte do século XX, acho que cenas de sexo gay eram algo que aterrorizava o público”.

Vale lembrar que a cena acima aconteceu mais de um século depois de Thomas Edison e o seu The Kiss escandalizarem o público estadunidense com o espetáculo “absolutamente nojentode dois atores de teatro esfregando bochechas. É uma boa medida do abismo histórico que existe entre os marcos de representação sexual hétero e os marcos de representação sexual queer no cinema comercial. Na verdade, com exceção do curioso beijo gay no meio de Asas (1927), épico de guerra que ganhou o primeiro Oscar de melhor filme, Hollywood só mostraria afeto entre pessoas do mesmo sexo na tela grande a partir dos anos 1970 (Os Rapazes da Banda, de William Friedkin, deu a largada nessa década), e ainda com extraordinária infrequência.

Por muito tempo, portanto, restava aos artistas LGBTQIAPN+ que queriam falar de sexualidade recorrer o underground - exatamente de onde surgiram cineastas como Wakefield Poole (seu pornográfico The Boys in the Sand, de 1971, se tornou um sucesso inesperado de bilheteria entre o público indie nova-iorquino), John Waters (Pink Flamingos, Hairspray), Gregg Araki (Viver Até o Fim, Geração Maldita), Todd Haynes (Veneno, Velvet Goldmine), Gus Van Sant (Drugstore Cowboy, Garotos de Programa) e Bruce LaBruce. Este último, especialmente, construiu uma carreira a partir de filmes que exploram fetiches homoeróticos, mas também atravessam manifestos políticos radicais.

Acho que foi Godard quem disse pela primeira vez: ‘A bunda é política’. Sempre assinei embaixo dessa declaração, brinca Bruce em entrevista ao Omelete. Seus filmes já incluíram cenas de sexo com zumbis (Otto e L.A. Zombie formam essa fase “terror” do currículo do cineasta), fetichismo com a estética skinhead (No Skin Off My Ass, o filme que lançou sua carreira, mostra um cabeleireiro solitário apaixonado por um neonazista), organizações de amor livre anarquistas inspiradas em grupos terroristas de esquerda reais (The Raspberry Reich) e - no único filme mais “casto” de sua carreira - um jovem cuidador com uma atração incontrolável por seus pacientes idosos (Gerontofilia).

Quando comecei a fazer filmes, estávamos no auge da liberação gay, e o sexo era uma parte integral disso - era como o motor que propelia o movimento adiante. Ser gay e não se desculpar por isso, ser gay e estar confortável com isso… existe forma melhor de mostrar essas coisas do que colocando sexo gay na tela?”, questiona LaBruce. “E, se você vai fazer um filme sobre a revolução sexual, é bom que ele seja explícito mesmo! Você precisa mirar não só nos conservadores, que são um alvo fácil, mas também naqueles liberais que dizem: ‘Se você é gay, tudo bem, só não esfregue na minha cara’. Sexo gay no cinema, para mim, é sobre esfregar na cara deles”.

Matt Baume entende essa entrega às estratégias de choque como um casamento entre oportunismo financeiro e empenho social: Se você é LaBruce ou Waters nos anos 70, 80 e 90, há uma grande vantagem em fazer algo totalmente ousado e escandalizante: as pessoas vão prestar mais atenção em você. É uma maneira de conseguir um público para as coisas que você quer dizer - talvez as pessoas estejam horrorizadas e dizendo para você parar, mas ao menos estão vendo o seu trabalho! E mesmo assim, se você era alguém que queria assistir aos filmes deles naquela época, acho bom morar em uma cidade grande, ou conhecer alguém que conheça alguém para te emprestar o VHS.

Muita coisa mudou desde então, é claro. Como as próprias trajetórias dos cineastas que citamos acima podem indicar (LaBruce nunca foi absorvido pelo mainstream de Hollywood, mas não dá para dizer o mesmo de Araki, Haynes e Van Sant, por exemplo), o que antes era cria do underground agora acontece à luz do dia. Harry Styles está por aí gravando cenas de sexo gay para um draminha de época, séries nem um pouco indie como Deuses Americanos são elogiadas pela sensualidade de seus encontros homossexuais, Kristen Stewart está se pegando com Katy O’Brian nos fundos de uma academia em Love Lies Bleeding, e a cinebiografia de Elton John discursa poucas e boas sobre a vida sexual do ícone do rock.

O próprio LaBruce, diante desse cenário, admite que talvez o grande momento do choque como estratégia de ativismo tenha passado. Não que ele, pessoalmente, ache que sua carreira de subversor tenha acabado - mas existe um valor, aponta o cineasta, no cinema LGBTQIAPN+ que não centra o sexo, uma avaliação compartilhada por Baume.

Há uma vantagem na existência de cineastas queer que estão fazendo filmes que chegam a uma audiência mais mainstream, que não ‘assustem’ tanto as pessoas”, reflete o autor. “Talvez esses filmes façam com que um casal do interior, que vive uma vida mais isolada, se tranquilize um pouco sobre a possibilidade do seu filho ser gay. Não estou dizendo que não precisamos de sexo - definitivamente precisamos! Mas também precisamos de algo mais palatável, para que as pessoas possam superar as suas desconfianças. É como um convite para que elas possam entrar no nosso mundo”.

Katy O'Brian e Kristen Stewart em cena de Love Lies Bleeding (Reprodução)
Katy O'Brian e Kristen Stewart em cena de Love Lies Bleeding (Reprodução)

Mas há de se tomar cuidado, avisa ele, com o quanto nos deixamos “dessexualizardiante da câmera: “Eu acredito que as pessoas queer sempre precisam prestar atenção a algumas coisas, politicamente falando, e uma delas são iniciativas para tentar controlar nossos corpos. É sempre um sinal de alerta quando vemos legislações que tentam controlar onde podemos usar o banheiro, a mão de quem podemos segurar na rua, onde podemos nos beijar, esse tipo de coisa. É por isso que eu acho que é importante traçar a linha e dizer que sim, sexo faz parte das nossas vidas. Sexo, desejo, olhar, romance, companheirismo - nós somos humanos, isso faz parte da experiência humana, então é claro que experimentamos tudo isso. Se você sanitiza toda a nossa vivência, está trilhando um caminho perigoso”.

O cineasta Marcelo Caetano arremata o assunto ao resgatar um filme do próprio LaBruce. “No Skin Off My Ass começa com um skinhead mijando na banheira onde ele está tomando banho. Eu acho super erótico aquilo, mas na época que ele filmou provavelmente pensou que ia chocar o mundo”, brinca. “Agora, em 2024, nesse momento em que discutimos fetiche o tempo todo, em que o golden shower entrou no vocabulário popular, não choca mais tanto. E que bom que a gente não tem mais que trazer a imagem do sexo para chocar, e sim como forma de explorar a nossa relação com o prazer, com o deleite da imagem. O sexo é para isso! Acho que estamos caminhando com bons passos, mas também pode ser que estejamos fechados dentro de uma bolha diferente do resto do mundo. Talvez todo o resto do mundo continue achando No Skin Off My Ass horrível”.

O dilema atrás das câmeras nem de longe se limita só às cores do arco-íris, no entanto. Não é curioso, afinal, que tenhamos citado só diretores homens aí em cima?

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