A Lenda de Beowulf, épico 3-D dirigido por Robert Zemeckis
(Beowulf
Jolie
Beowulf
Beowulf
Grendel
Se o resultado em Expresso Polar parecia estranhíssimo, como se cadáveres estivessem animados, aqui, alguns anos depois, a tecnologia finalmente mostra a que veio. Desta vez, muito mais movimentos são capturados e até pequenas sutilezas encontram seu caminho na detalhada "pele" 3-D dos atores. Até o movimento dos globos oculares (!) respeita os movimentos dos olhos dos protagonistas!
Beowulf, porém, não é apenas um exercício tecnológico. É também um filme com narrativa bastante competente. O superastro dos quadrinhos Neil Gaiman e o co-roteirista de Pulp Fiction Roger Avary trabalharam mais de 10 anos no texto, que adapta para o cinema (pela enésima vez) a história de Beowulf. Trata-se de uma das obras mais antigas da língua inglesa, contada por cerca de 700 anos apenas na forma oral por bardos e registrada como poema por monges séculos atrás. O próprio Gaiman brinca, dizendo que pensa em histórias como se fossem animais: "há as antigas, feito os tubarões e répteis; as mais novas, como as pessoas; e outras em exinção ou há muito desaparecidas". Beowulf beirou a extinção. Durante séculos foi esquecida até que foi redescoberta no século 16 em um único manuscrito com marcas de fogo - que atualmente está no Museu Britânico. Aos poucos, a história foi sendo contada novamente e voltou à vida. Agora, com o filme, ganha corpo e alcança o grande público.
O mais interessante da história é que antes de seu registro ela era quase uma brincadeira de "telefone sem fio" - cada pessoa que a contava dava a ela sua própria versão. Mesmo os monges que a transcreveram também o fizeram, colocando elementos cristãos na história. Assim, Gaiman e Avary sentiram-se bastante confiantes em "preencher as lacunas" dessa trama viva, já que o poema, leitura obrigatória em diversas escolas na Inglaterra e Estados Unidos (e considerada extremamente maçante pelos estudantes), é repleto delas.
Os escritores optaram então por relacionar elementos dos dois momentos narrativos do filme, separados por quase 20 anos. A decisão funciona bem nas telonas, com uma história bem amarrada e interessante. Nela, o reino de Hrothgar (Anthony Hopkins) é assolado por uma criatura disforme chamada Grendel (Crispin Glover). Para livrá-los do monstro, que os ataca em momentos de festa, o rei faz um apelo: Eles precisam de um herói. Surge então o corajoso nórdico Beowulf (Ray Winstone), caçador e aniquilador profissional de criaturas. Ele se oferece para eliminar Grendel, sem saber que, à sua maneira, a mãe do monstro (Angelina Jolie) é um problema ainda pior.
A reconstituição da história funciona muito bem. Nada parece gratuito ou desconexo. Avary até brinca, dizendo que não tem certeza se a versão à qual eles chegaram não é a original, antes de ser corroída pelos séculos. Pode até ser... para um filme caro (150 milhões de dólares) cujo apelo é também a ação (há longas e ótimas cenas de batalhas vertiginosas), o texto tem preocupações que vão além do blockbuster normal. É o caso da caracterização do disforme Grendel, por exemplo. Ele fala em incompreensível inglês antigo e seu exterior reflete sua psicologia complicada - algo que fará sentido lá adiante no filme. Isso tudo, porém, é disposto em camadas narrativas - só as encontrará quem busca em seu entretenimento semanal algo mais que um mero descanso.
As opções técnicas são igualmente interessantes para os atores. Para eles, porque as filmagens não envolvem qualquer tipo de preparação. Basta pregar os pontinhos no corpo e pronto. Hopkins, Jolie, Winstone, Robin Wright Penn, John Malkovitch, Brendan Gleeson - excelente elenco! - e os demais podem fazer suas cenas de maneira ininterrupta e uma vez só. O diretor não precisa de "coberturas" (cenas rodadas por vários ângulos) pois os ângulos e enquadramento, sem falar na iluminação, são selecionados depois, na pós-produção dentre infinitas possibilidades (está tudo registrado em 3D, de maneira espacial). Sim, trata-se de um método completamente novo de trabalho.
O veterano Hopkins comparou a novidade a um ensaio de teatro. Os atores trabalham sem qualquer figurino, sem maquiagem e num ambiente limpo. Precisam apenas de suas próprias habilidades. É tudo muito rápido. Toda a participação de Jolie, por exemplo, foi gravada em apenas dois dias e meio!
Zemeckis está empolgadíssimo com esse terreno que está desbravando. Tanto que já anunciou seu próximo filme no gênero, o Conto de Natal, de Charles Dickens, com Jim Carrey interpretando Scrooge e todos os fantasmas. Chegam a ser um pouco assustadoras as possibilidades dessa tecnologia... imagine onde ela chegará em mais cinco, dez anos com base em alguns detalhes do próprio Beowulf:
-
Winstone tem 50 anos e é barrigudo. Beowulf tem por volta de trinta e um corpo heróico perfeito.
-
Hopkins tem seus próprios traços, mas está gordo e baixinho no filme.
-
Glover vive um monstro com 3 metros de altura.
-
Quase todos os atores envelhecem 20 anos na segunda metade do filme.
Trata-se de uma evolução tecnológica surpreendente, portanto. Comparável à que Peter Jackson promoveu em O Senhor dos Anéis com seu Gollum. Mas Zemeckis a leva a um novo patamar. Sem dúvida, se tivesse a oportunidade, ele faria toda a Terra-Média utilizando a técnica que deu vida ao hobbit viciado no Um Anel. Extrapolando... imagine atores interpretando versões suas em seu auge físico (Arnold Swarzenegger tem guardados modelos 3-D de seu corpo de anos atrás), ou mesmo vivendo astros e estrelas do passado (Bruce Lee, Humprey Boggart...) ou personagens famosos (Brad Pitt interpreta Pato Donald?). Isso tudo já é possível hoje... bastam surgir os projetos certos.
Mas a revolução não pára por aí. Outro importante elemento de Beowulf é a projeção 3-D. A versão a que assisti, em IMAX 3D digital, é surpreendente. Na telona monstro, com sei lá quantos andares de altura, dragões voavam pela sala e lanças chegavam a centímetros dos meus olhos. Alguns ângulos de câmera, cuidadosamente pensados para maximizar esses efeitos, dão até tontura em quem é mais suscetível. De fato, durante as batalhas, o cérebro pede até um descanso. Zemeckis fala sério quando diz que quer fazer cinema para tirar as pessoas de casa. Simplesmente não há como repetir essa experiência na sua sala.
O problema é que salas como o Imax 3D ainda são raríssimas fora dos Estados Unidos. Mesmo salas equipadas com 3D Digital, com projeção tridimensional e tela de tamanho normal, não são fáceis de encontrar (no Brasil há apenas quatro). E ver Beowulf em projeção 2D normal, sem dúvida tem muito menos graça. Se quiserem continuar tirando pessoas de suas casas para ir ao cinema, em tempos de filmes que chegam antes ao mercado pirata que às telonas, o investimento em novas salas e experiências é urgente. Zemeckis já está fazendo história... cabe agora ao mercado acompanhá-lo.
Assista a essa empolgante novidade em 3-D Digital em pré-estréia exclusiva do Omelete. Clique aqui.
Comentários (0)
Os comentários são moderados e caso viole nossos Termos e Condições de uso, o comentário será excluído. A persistência na violação acarretará em um banimento da sua conta.
Faça login no Omelete e participe dos comentários