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Entrevista

Omelete entrevista: José Roberto Torero, diretor de <i>Como fazer um filme de amor</i>

Omelete entrevista: José Roberto Torero, diretor de <i>Como fazer um filme de amor</i>

01.11.2004, às 00H00.
Atualizada em 22.11.2016, ÀS 01H04

Como fazer um filme de amor
Brasil, 2004
Comédia Romântica - 84 min.

Direção e Roteiro: José Roberto Torero



Elenco: Denise Fraga, Cássio Gabus Mendes, Marisa Orth, André Abujamra, Paulo José, Ana Lúcia Torre, Abrão Farc, José Rubens Chachá, Ilana Kaplan, Carlos Mariano, Maria Manuela

Antes de ser diretor, José Roberto Torero - o diretor de Como fazer um filme de amor - já era jornalista e torcedor do Santos (não necessariamente nesta ordem). Mas o cinema também sempre fez parte de sua vida. É dele, por exemplo, o roteiro de Uma história de futebol, que em 2001 foi indicado ao Oscar na categoria de curtas-metrages. Além de escrever scripts para longas (Pequeno dicionário amoroso, Memórias póstumas e Celeste estrela), programas de televisão ("Retrato falado", quadro do Fantástico), teatro (Omelete - ótimo nome, não acha?) e livros (Terra Papagalli, O chalaça, Xadrez, truco e outras guerras: Ira), ele dirigiu seis curtas. Agora, Torero finalmente consegue superar o limite de tempo (e dinheiro) e estréia como um cineasta de longas. Calmo, meio acanhado até, o jornalista que muito tempo assinou uma coluna sobre futebol na Folha de S. Paulo troca de lugar e responde a algumas perguntas.

Você já fez curtas antes, mas este é seu primeiro longa. Tem alguma diferença no processo, você tem que pensar em mais coisas, como é?

A condição de produção é completamente diferente. São dois meses de pré-produção e um mês filmando, mesmo para um filme rápido como este.

Até que ponto a literatura influencia seu cinema e o cinema influencia a literatura que você faz?

Não vejo o cinema influenciando a literatura, pois ela é baseada em imagens desde seu começo.

Mas neste filme, a ligação entre cinema e literatura vem desde o começo. Há muito tempo, eu e mais três amigos começamos a ler aqueles livros Júlia, Bianca e Sabrina. Percebemos que havia uma fórmula fixa nestes livros românticos baratos: o cara é mais velho que a mocinha, ela quer subir na profissão ou mudar, tem um mentor, um primeiro encontro ríspido, uma rival, uma primeira noite sem sexo, um encontro num lugar idílico... Esta fórmula vem desde o século 19 e se perpetua. Daí a gente passou a ver filmes românticos e viu que a fórmula estava lá também e tirou algumas coisas dali para fazer o roteiro.

Qual foi o custo da produção?

A pergunta é difícil porque o custo foi bastante diluído com empresas que deram apoio e depois acabaram virando sócias. Transformando estas co-produções em dinheiro, seria 1,5 milhão de reais.

E quanto você acha que vai ganhar com o filme?

Com tantos sócios, vou acabar ganhando nada! (risos)

Mas qual a expectativa de público?

Tem um número chave que é 100 mil espectadores. Um filme nacional que chega a este número tá bom. Ano passado, o melhor independente (sem Globo Filmes) foi Amarelo Manga, com 135 mil. Logo abaixo, ficou o Cristina quer casar, com 125, 130 mil.

Você não chegou a falar com a Globo Filmes para tentar a parceria?

Eu tenho uma parceria, mas é o acordo B, de desconto em comerciais - o mesmo que o De passagem e o Benjamim tiveram. Eles fazem isso com poucos filmes, mas acho que facilitou um pouco [o fato de] estar lá. Não é a grande exposição com cross-media. Esta, não tem preço. Aí, o fracasso faz 700, 800 mil, como Sandy e Casseta.

Quais foram suas influências cinematográficas?

Várias. Woody Allen eu gosto muito. Gosto muito também do Ettore Scola, Bergman...

Tem muito de Mel Brooks ali também, não?

Ele fez bastante paródia, né, então tem um pouco, sim. Mas o jeito de filmar, acho que não. Eu uso o plano-seqüência narrativo, como nos filmes do Woody Allen, que é mais invisível.

E Monty Python?

Eu não lembro qual o jeito deles filmarem, mas de humor, sem dúvida. Acho eles excelentes!

Antes de fazer as pesquisas para o filme, você era consumidor de comédias românticas?

De comédia, sim. De comédia romântica, nem tanto. Mas, por pressões externas, às vezes.

E você acha que o filme é mais cômico do que romântico exatamente por causa disso?

Ele é uma comédia sobre comédias românticas. Quem for mais ingênuo, pode achar que é realmente uma comédia romântica. Pô, os caras acabam juntos, tem um clipe no meio, o mal acaba vencido no final... Mas o espectador mais esperto vai ver que tem uma crítica ali. Acho até que este cara vai se divertir mais.

As comédias românticas, em geral, procuram causar empatia nos espectadores. Como você fez para criar isso, afinal, o filme é justamente uma crítica a todos estes clichês e jargões destes personagens. Como você fez para equilibrar isso?

O personagem da Denise, que é uma atriz muito gostada, é feito para você se identificar. É um personagem de classe-média, que é simpática. Tem uma mãe cega que é simpática - e um golpe baixo, pois eu fiz todos trocadilhos possíveis (risos)

Tem também o conflito amoroso. Não tem jeito, você sabe que no final eles vão acabar juntos, mas mesmo assim você fica torcendo de qualquer jeito. Até eu caio nessa.

Além disso, tem outras coisas que não geram identificação, mas laçam o espectador: humor e surpresa. Colocar umas surpresas de vez em quando acorda o pessoal e é sempre um bom anzol.

Quais os critérios para a escolha do elenco?

Tem diretor que gosta muito de caçar atores totalmente desconhecidos, como o Beto Brant e o Roberto Moreira, que eu acho ótimo. Mas eu me sinto inseguro. Eu gosto de trabalhar com gente que eu conheço, que sei o que vai fazer e que seja bom. A Denise, eu já conhecia muito bem e fiz o filme pensando nela. As filmagens aconteceram nas férias dela.

Depois que tem o primeiro, você vai montando o elenco em função disso. Se fosse a Mariana Ximenes, a vilã e o mocinho teriam que ser mais novos. Daí, eu fiz uma pesquisa entre as moças e o Cassio [Gabus Mendes] teve uma aceitação muito boa e é um cara muito bem humorado. E como era um filme de baixo orçamento, todo mundo tinha que estar muito afim. Não podia chamar um cara que ia querer um trailer separado. É um filme de turma.

O Paulo José, eu também pensei nele desde o começo. Eu já fiz curtas com ele como ator e como narrador. O cara é sensacional! Ele dá idéias boas, entende todas as piadas e ainda inventa outras novas. A Marisa e o André, eu escolhi ao mesmo tempo. Fui para Gramado em 2002 e jantei com eles. Os dois fizeram tantas piadas malvadas durante o jantar que pensei "puxa vida, eles são os vilões."

A receita do Torero é humor, metalinguagem e Paulo José?

Paulo José, infelizmente, nem sempre. E metalinguagem acho que também, não. Mas humor é quase sempre, em graus diferentes. Só às vezes, na Folha, eu escrevia de mau-humor quando o Santos perdia (risos). Em livros, por exemplo, o Ira não é tão engraçado. Mas quando não tem metalinguagem, tem quebra de fantasia. Tem a tal da identificação projetiva, que é quando você lê um romance e pensa que está na história. Ou então quando você se esquece que está vendo um filme e só pensa na história. Eu acho muito honesto, bacana e inteligente quando você quebra isso, quando você vê um filme o tempo todo sabendo que está no cinema.

Com que propósito você pensa isso? É para levar o espectador à reflexão?

Um pouco é isso, o cara pensa mais e tem um pouco de honestidade. Se eu sei que estou lendo um livro, a razão fala mais alto do que pela emoção. E permite mais jogos também. Se você está preso à fantasia, você não pode fazer certas coisas. Se você tem um narrador presente, você pode brecar o livro e voltar a cena. Numa comédia romântica de verdade, se você faz isso com a Meg Ryan e o Tom Hanks, você estraga o filme, né? (risos)

Então, se um apaixonado por comédias românticas sair bravo do seu filme, você não vai ficar chateado, né?

Já teve uma, agora no Festival de Biarritz. Uma moça veio falar comigo no fim do filme e me disse [brava] "olha, eu não gostei do seu filme!" e eu falei "não?" [voz de apaixonada] "é que eu adoro tanto as comédias românticas..."

Mas este é o extremo. Em geral, as pessoas que gostam do gênero gostam do filme. O ideal é este cara que curte mesmo não chegar a tanto. No máximo ficar desconfiado e pensar "ah, então tem tudo isso, todos estes clichês e uma fórmula que eles usam só para me enganar".

Em São Paulo, o filme está entrando em cartaz junto com a Mostra. O que aconteceu, foi um erro de estratégia ou um acaso?

Não tem jeito. Se não fosse a Mostra teria um outro filme gigante, com 300 cópias. O que salvou um pouco é que a gente entra no meio da Mostra. Mas não sei se divide tanto o público. Eu acho que ele fica no meio do caminho entre o popular e o...

Cabeça?

Sofisticado. Pensei em falar cabeça, mas é feio, né? (risos)

Você falou uma vez sobre a incapacidade de imitação do brasileiro. Você pensa em fazer um filme mais normal, sem metalinguagem, desconstruções, mas com uma narrativa clássica e tal?

Eu acho que não vou fazer este clássico, não. Mas eu acho muito boa esta teoria do Paulo Emílio Sales Gomes, nosso supercrítico, para explicar o cinema brasileiro. Ele diz que a gente não consegue fazer igual o americano. A gente não faz um musical, mas sim uma chanchada. E quando tenta imitar, geralmente não dá certo. A gente faz sucesso quando faz coisas diferentes. Mesmo o Cidade de Deus, por exemplo é diferente. Bacalhau , por exemplo, que fez muito sucesso em Santos, era uma paródia do Tubarão e muito engraçada. Eu gosto disso, acho excelente.

Você pretende continuar fazendo filmes?

Tem um que eu quero fazer que é Como fazer um filme de aventuras (risos) Porque o filme de herói também tem uma fórmula fixa. Talvez mais conhecida e engessada do que a das comédias românticas.

Tenho também a idéia de fazer um filme sobre o Terra Papagalli, que é um livro meu sobre o descobrimento do Brasil, mas seria muito caro. O roteiro já tá feito, ganhou o mesmo concurso que o Cidade de Deus. Fui com o Bráulio lá fazer o curso e tal, só que o CDD já foi feito e o Terra Papagalli tá lá no papel porque é um filme caro. Custaria uns 4 milhões de reais.

O cinema brasileiro é muito pobre, né?

Eu só consegui fazer este porque agora existem os concursos públicos. Pela lei do audiovisual, não conseguiria fazer o filme. Em 1994, 1995 seria a época de passar para o longa, porque eu já tinha feito curtas, mas não. Por captação - lei do audiovisual e Rouanet - o que você tem que ter é contato. Não importa se o roteiro é bom, ou não.

Mas estes anos de Folha e Globo não te abriram portas?

Nada! É muito melhor você ser primo do diretor de marketing. (risos)

É verdade que as filmagens começaram em 11/11 e terminaram em 12/12?

E a produção, começou em 9/9 (risos)

Tem alguma numerologia envolvida, qual é a destes números?

Na verdade, foi uma piadinha, porque a gente ganhou o concurso dia 5/5. Daí começamos a ver que dia nós íamos começar a pré-produção, ia ser em setembro e acabamos escolhendo 9/9. E quando procurávamos uma data para começar a filmagem, decidimos entre 11/11 e 12/12.

Como torcedor fanático você logicamente tem as suas mandingas, mas e como diretor?

Como diretor, não. Eu tinha uma camisa, que eu considerava a minha "camisa da sorte", achava que com ela eu parecia mais inteligente. Mas ela furou por excesso de uso (risos)

Mas de torcedor, eu tenho muitas. Eu sou ateu convicto, mas nesta hora, tudo é importante. Em 2002, por exemplo, eu vi todos os jogos [do Santos] na casa de um amigo meu. E deu sorte! Um dia, mesmo ele não estando, eu fui lá. (risos)

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