Lua de Júpiter | “Este é um filme sobre o milagre da liberdade”, diz diretor
Kornél Mundruczó fala ao Omelete sobre thriller futurista húngaro sobre homem voador
Lua de Júpiter estreia nesta quinta-feira no Brasil, um ano depois de ter disputado a Palma de Ouro em Cannes como uma narrativa de ação, sci-fi e fantasia sobre um imigrante ilegal capaz de flutuar pelos céus. Dirigido por um especialista em contos morais, Kornél Mundruczó (Delta), a produção húngara impressionou a crítica na Croisette com a sofisticação técnica de sua engenharia de efeitos visuais, mas também pelo teor inflamável de seu roteiro.
Misto de aventura, suspense e análise geopolítica, Jupiter’s Moon (seu título original) acompanha a ciranda de perigos em que o refugiado sírio Aryaan (Zsombor Jéger) se envolve após ser baleado gravemente e descobrir que pode regenerar suas feridas e flutuar. Um médico alcoólatra e decadente, incumbido de cuidar de imigrantes ilegais, o Dr. Stern (Merab Ninidze), tentará tirar proveito dos dons de Aryaan, seu paciente. De cara, ele tem a ideia de cobrar dinheiro de ricos que conhece para apresentar a eles os poderes de seu jovem amigo. Mas, aos poucos, os dois vão travar uma amizade cerzida a desabafos que expõem as feridas abertas da Europa.
O diretor Kornél Mundruczó falou ao Omelete sobre o seu projeto. Confira abaixo a entrevista:
Omelete: De que maneira o homem voador de Lua de Júpiter dialoga com a tradição dos filmes de super-herói?
Kornél Mundruczó: Não é daí que eu tirei a inspiração para o filme, mas sim de uma lenda que corria entre as crianças da Europa quando eu era garoto de que havia um sujeito capaz de voar destinado a nos salvar de nossas misérias morais. Era um conto muito infantil, uma fábula. Mas o que interessa é a metáfora de que, do alto, há meios de se vislumbrar a esperança. Este é um filme sobre o milagre da liberdade.
Omelete: Histórias em quadrinhos na Hungria trazem personagens ou tramas como as de seu filme?
Kornél Mundruczó: Minha relação com a fantasia não se dá pelas HQs mas sim pelos romances soviéticos de ficção científica e pelas ilustrações que grandes artistas gráficos da URSS faziam. Delas eu tirei a imagem do anjo sem asas.
Omelete: Em Cannes, as sequências de perseguição e de ação de Lua de Júpiter foram comparadas a Velozes & Furiosos. Como foi a construção das cenas de violência de seu longa-metragem?
Kornél Mundruczó: Filmando tiroteios, correrias e brigas com um olhar realista bem parecido com uma perspectiva documental. Se eu não me convencer de que uma situação de suspense é tensa o suficiente, eu não consigo filmá-la. Por isso, para dar verossimilhança à narrativa, evitei usar muitos adereços de set como holofotes, trilhos ou carrinhos e deixei a câmera captar a emoção dos atores. Usei uma tropa de 40, 50 policiais para bloquear as ruas e poder realizar as perseguições sem ferir ninguém.
Omelete: Qual é o sentido político que há por trás de Lua de Júpiter?
Kornél Mundruczó: Levantar perguntas sobre o papel estratégico de uma nação pobre como a Hungria dentro do cenário de deslocamento dos refugiados políticos. Não faz sentido o tratamento desumano dado a eles. Mas é estranho entender como alguém que foge da Síria possa escolher um território tão cheio de dificuldades econômicas e de corrupção governamental como a Hungria para viver. Nada na política da Europa é transparente. Mas no caso de uma pátria empobrecida como a minha, as dificuldades e as contradições são ainda mais graves.