La León (2007) é um caso típico de filme mal-classificado. Em mostras e festivais, como o do Rio, a produção acaba entrando na seleção gay. Mas para tanto, bastam aos organizadores duas cenas rápidas de nu frontal e uma seqüência de sexo entre dois homens, vestidos, entre alguns arbustos. O resultado de tal seleção: decepção para o público gay e menos bilheteria para o filme, já que tal rótulo costuma afastar o grande público.
A produção conta a história de Alvaro. Ele leva uma vida humilde numa ilha remota da Argentina. A pesca e o corte de cana-de-açúcar são suas únicas fontes de renda. A sua homossexualidade o torna tão estranho a este ambiente quanto o seu amor pelos livros. A única ligação entre a ilha e o continente é o pequeno barco El León, comandado pelo marinheiro El Turu. Rude e violento, Turu vê em Alvaro uma ameaça aos valores da pequena comunidade. O conflito entre os dois provará que a agressividade de Turu é apenas um modo de esconder a sua própria confusão emocional.
O tema, porém, foi mero mecanismo para que diretor Santiago Otheguy pudesse realizar claramente uma obra artística sobre o desejo latente e as suas conseqüências. Ele concentra sua câmera na força dos olhares, no clima sombrio e em tomadas com uma aura de mistério. Barcos trafegam por um lugar ermo e pouco explorado, envolto por florestas densas. Metaforicamente esse é o universo dos personagens em relação aos seus anseios mais nuviosos.
Percebe-se que muitas barreiras precisam ser rompidas. Isso fica claro nas seqüências em que Alvaro desmata a floresta para seu sustento. Ao mesmo tempo, uma forma de apresentar que certas raízes antiquadas precisam ser arrancadas. O lugar é praticamente habitado por homens. A única forma de expressar o desejo é rompendo tabus. E todo cuidado é pouco. Um olhar para a pessoa errada pode acabar em tragédia.
Interessante que o roteiro, também de Otheguy, cria um clima de atração em uma sociedade pobre e arcaica. Até o futebol se faz presente aumentando o contraste, já que esse esporte sempre é associado a heterossexuais. Por nenhum instante a narrativa cai no lugar comum. São cenas de poucos diálogos em que o espectador precisa estar atento. Entender suas intenções é um exercício de meditação.
Tecnicamente o diretor apostou no preto e branco com uma forte presença do cinza, para criar uma atmosfera de nebulosidade cênica. Isso reforça a expressão das personalidades dos personagens. Nesse clima misterioso Otheguy demonstra como a solidão pode criar um desejo que contraria convicções.
Um filme para poucos pelo seu formato artístico, mas com certeza, não direcionado especificamente para o público gay.
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