Invasão de Domicílio
Filme se divide em drama de adultério e crônica social para falar de socorro e solidão
Aliar estética com compromisso social é o sonho de todo urbanista. Em Invasão de Domicílio (Breaking and Entering, 2006), Will Francis (Jude Law) tem a caminho um projeto para fazer de King's Cross um lugar mais seguro e agradável, com ponte, espelhos-d'água e tal. O problema é que o bairro londrino não colabora - mal instala seu escritório em um barracão por lá, o arquiteto tem todos os seus iMacs roubados, duas vezes.
Certa noite, ele decide atocaiar o ladrão. Descobre um garoto, imigrante sérvio, que veio morar na Inglaterra junto com a mãe, Amira (Juliette Binoche). Cheio de boas intenções, Will vai atrás do menino pensando em ajudá-lo, mas acaba interessado na mulher. O casamento do arquiteto com Liv (Robin Wright Penn) não ia bem mesmo, a traição é como um reflexo motor. O problema é que Amira sempre pensará primeiro na proteção de seu filho - e isso expõe Will.
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Drama de adultério com crônica social, o filme de Anthony Minghella se beneficia, desde o começo, da boa escalação de elenco, especialmente Binoche, com quem ele já trabalhou em O Paciente Inglês. Law continua apenas um cara esforçado. E Wright Penn desde sempre teve o mais profundo dos olhares naqueles olhinhos pequenos. É da entrega das duas atrizes aos seus personagens que Invasão de Domicílio captura a atenção do espectador em um primeiro momento.
Esquivando-se da tentação de fazer cinema ongueiro - acolher os personagens mais sofridos com um misto de paternalismo e zelo, sem necessariamente remediar-lhes a fragilidade - Minghella aborda o tema da solidão na grande metrópole de dois prismas distintos. O primeiro é o drama doméstico de Will, isolado dentro de seu próprio núcleo familiar e instado a procurar conforto extraconjugal. O segundo prisma é o do estrangeiro, a mãe e o filho sérvios que não conseguem se encontrar mesmo em uma das cidades mais cosmopolitas do mundo.
A frase que Law mais repete é "eu não sei"; o bordão de Binoche é "isso é complicado". É realmente muito difícil achar solução para os problemas sociais e existenciais que o filme aborda - e o arquiteto não demora a descobrir que espelhos-d'água não bastam.
Minghella se esmera em diagnosticar o conflito. Antes de nos dar respostas, ele faz o espectador cair na realidade, perceber a complexidade do assunto, por meio da subtrama do adultério. Mesmo por trás da melhor intenção há sempre a expectativa da recompensa - esse é o fato cristalino que Invasão de Domicílio faz vir à tona, e que, a partir do momento em que o aceitarmos, quando esse fato furar a cortina de falsas filantropias em que vivemos, começará a facilitar nossa convivência.