Filmes

Entrevista

Festival de Gramado | "Captei com lucidez uma fortuna que se perdeu em 1964", afirma diretor de Barata Ribeiro 716

Filme de Domingos Oliveira é exibido no evento

02.09.2016, às 12H47.
Atualizada em 01.12.2016, ÀS 01H07

Depois de sete dias de filmes nacionais e hispânicos inéditos, a disputa pelo Kikito de melhor longa-metragem no 44º Festival de Gramado chega ao fim nesta sexta (02), coroada pelo regresso à Serra Gaúcha de um veterano do evento: o cineasta carioca Domingos Oliveira. Único dos diretores em concurso a gozar do status de mestre, o realizador de Separações (2002) volta ao páreo da estatueta gramadense com a comédia de tintas românticas Barata Ribeiro 716, uma recriação poética do Rio dos anos 1960. Com tintas autobiográficas, a produção traz Caio Blat como uma espécie de alter ego do diretor em sua juventude. O elenco conta ainda com Sophie Charlotte, Pedro Cardoso e Sergio Guizé. Na entrevista a seguir, Domingos fala sobre esta volta no tempo e comenta sua love story com Gramado. 

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Omelete: O que você descobriu (ou reviu) do seu próprio passado ao voltar à Barata Ribeiro idílica dos anos 1960?

Domingos Oliveira: Neste estágio do campeonato, com mais de 70 anos, um cineasta não tem descobertas, nem decepções, nem euforias. Sempre toquei cinema de ouvido. Penso que o valor de uma obra de arte está diretamente ligado ao benefício prático do espectador. Se o filme te ensina algo que você pode usar dali por diante, ele é bom, muito bom, ótimo, genial. O BR 716, meu novo filme, é vivo. Foi escrito ao vivo diante de uma turma de alunos de dramaturgia em algumas dezenas de dias. Quando vi o filme acabado na tela, percebi que talvez fosse mais que isso... que os primeiros jovens convidados e os próprios atores antes não sabiam o que era uma vida de turma, nem o que era viver no estado de paixão, de procura pelo amor total ,não sabiam também que para serem utéis a sociedade não bastava entrar nas lutas mortais. Penso que captei com lucidez e alegria uma fortuna que se perdeu em 1964. Fiz um filme bastante original, embora não passe de uma crônica de bêbados. O filme talvez resgate uma certa noção de fidelidade a si mesmo ,que os jovens de hoje perderam no temporal das atualidades .Não fiz o filme,ele foi se fazendo. Quando a lente abre aparece diante dela em quase todos os planos dezenas de pessoas .Que somente querem celebrar a vida e amar sem limite  .Se você não fizer isso na juventude, vai fazer quando?

Omelete: A primeira projeção pública de Barata Ribeiro, 716 será em Gramado. Mas quem viu o filme em sua edição ou finalização arrisca que ele traz a melhor atuação da carreira de Caio Blat, premiado com o Kikito de melhor ator em 2010, por Bróder, e em 2011, por Uma Longa Viagem. Ele faz mesmo seu alter ego?

Oliveira: BR 716 é meu filme jovem, com grandes atores. Caio não é meu alter ego. Ele é meu ego. O outro é que sou eu. Não falamos nenhuma palavra sobre essa caracterização, mas quando o Caio aparece no filme, milagre! Sou eu! Não posso falar de cada um ,mas devo registrar que Sophie Charlotte é a mais aparelhada atriz do cinema de todos os tempos. E linda, tanto quanto é possível ser. A saudade do passado que se revela no final, é como uma onda de espuma do mar.

Omelete: Critica-se muito a comedia brasileira de hoje. Você, como um mestre do gênero, encara como esse filão do riso? O quanto Barata Ribeiro se alinha com o gênero?

Oliveira: Chamo o que faço de comédia comovente (tipo o cinema de François Truffaut ou de Woody Allen).Talvez seja um gênero inventado por mim , para que eu consiga fazer cinema. Meu cinema muitas vezes é medíocre, porém minha visão de mundo é deslumbrante. Aos 80 sei que o sentido da vida é a alegria de viver.

Omelete: De todos os longas em concurso em Gramado este ano, o teu é o único a ter a assinatura de um medalhão. Você sobe a Serra Gaúcha com o status de mestre. Como você avalia essa obra que lapidou sua maestria como cineasta?

Oliveira: Medalhão é coisa de olimpíada, eu não mereço. Mais que tudo, antes de tudo ,sou um diretor jovem. Alguém que não consegue envelhecer e que do passado só tem arrependimentos. Porque poderia hoje fazer muito melhor exatamente tudo que fiz.

Os vencedores de Gramado serão conhecidos neste sábado. Até agora, Elis, de Hugo Prata, e O Silêncio do Céu, de Marco Dutra, são os mais cotados a prêmios. 

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