Cena de Uma Família Normal (Reprodução)

Créditos da imagem: Cena de Uma Família Normal (Reprodução)

Filmes

Crítica

Uma Família Normal é Adolescência com amargor adicional de crítica ao privilégio

Adaptação sul-coreana de Herman Koch chega em momento oportuno aos cinemas brasileiros

Omelete
4 min de leitura
02.05.2025, às 09H33.

O que os seus filhos fazem quando ninguém está olhando? Crias de uma era de saturação midiática e banalização da violência, onde o real e o irreal se confundem mais do que nunca dentro de um cérebro em formação, as gerações que já nasceram na internet são mais propensas à violência, mais virulentas ou extremas em seus atos catárticos de agressão? Ou os problemas que sempre existiram continuam a existir, e nós só escolhemos fechar os olhos para eles? Essas foram algumas das questões encarnadas por Adolescência, minissérie britânica que virou fenômeno na Netflix no mês passado com sua narrativa intensa sobre um jovem de 13 anos acusado de um assassinato brutal. Mas a Coreia do Sul já tinha chegado lá, e dois anos antes…

Exibido no seu país natal em 2023, o longa Uma Família Normal finalmente chega aos cinemas brasileiros em momento que não poderia ser mais oportuno, tendo em vista o diálogo cultural suscitado por Adolescência. A trama parte do livro O Jantar, publicado em 2009 pelo autor holandês Herman Koch (e desde então transformado em produções diferentes na Holanda, Itália e EUA), mas dilata os seus limites temporais: aqui, ao invés de discutir sobre um crime cometido por seus filhos durante uma única refeição, os dois casais centrais têm três encontros diferentes à mesa, cada um durante um estágio da perpetuação, investigação e resolução do tal crime.

A mudança, operada pelos roteiristas Park Joon-seok e Park Eun-kyo (Mother: A Busca Pela Verdade), permite que o filme se concentre em uma lenta reversão de moralidades, e no caminho cutuque as noções pré-concebidas que o público pode ter dos personagens. Afinal, é fácil escolher qual dos casais protagonistas tem a nossa aliança a princípio: de um lado o pediatra honesto vivido por Jang Dong-hun, e sua esposa filantropa (Kim Hee-ae) que ainda cuida da sogra acometida de Alzheimer; de outro, o advogado inescrupuloso de Sul Kyung-gu e sua esposa-troféu (Claudia Kim), uma mulher muito mais jovem que é pintada logo no início do filme como uma socialite obcecada por manter a forma. Nenhuma das duas famílias é pobre, mas uma delas definitivamente está em posição de maior privilégio do que a outra.

De forma tipicamente sul-coreana (os fãs do cinema de Bong Joon-ho certamente podem atestar), Uma Família Normal desenha muito de seus personagens assim, a partir das relações de poder e ressentimentos que se estabelecem em suas classes sociais. E diante disso, é claro, o elenco de veteranos que compõe o núcleo principal transforma cada olhar de soslaio, cada alfinetada que trai décadas de picuinhas silenciosas, em uma refeição dramática completa - me perdoem o trocadilho. É aí que se sobressaem as mulheres, Kim Hee-ae e Claudia Kim, que desde a primeira cena estabelecem entre si uma dança verbal hipnotizante, uma deixando revelar o que inveja e o que deseja na outra conforme o momento de tomar decisões radicais por suas famílias se aproxima.

É verdade que, nas mãos do diretor Hur Jin-ho, até aqui mais conhecido por dramas delicados como Um Belo Dia de Primavera e Natal em Agosto, Uma Família Normal vai ganhando contornos novelísticos conforme a intensidade dos confrontos se eleva, e chega a flertar com o kitsch em seu retrato social exacerbado. Os seus choques - do incidente de trânsito que abre o filme até o último e violento jantar do quarteto principal - se estendem para além do realismo, entendendo que não existe ponto de trazer esses dramas para a tela se eles não forem ser colocados sob a lente de aumento da ficção. É aí, é claro, que o filme sul-coreano se afasta de Adolescência, com sua dedicação aos takes contínuos e sua dívida com o kitchen sink realism da ficção inglesa.

Mas Uma Família Normal é um bom companheiro de sessão para a série da Netflix, ou uma boa pedida de cinema para quem se viu mexido por ela, justamente porque estica as garras da discussão sobre a violência midiatizada e radicalizada da nova geração para o contexto da hierarquia social. Se a “machosfera” explorou até o ressentimento de gênero de um menino de classe trabalhadora, como é possível ensinar empatia a quem foi criado para acreditar que sua vida vale mais do que a de quase todo mundo ao seu redor? E quem foi que os ensinou assim, o mundo ou os pais? Uma Família Normal, como é habitual para os bons filmes, não tem respostas - mas faz perguntas urgentes com uma eloquência extraordinária.

Nota do Crítico
Ótimo

Uma Família Normal

Botong-ui Gajok

Ano: 2023

País: Coreia do Sul

Duração: 116 min

Direção: Hur Jin-ho

Roteiro: Park Eun-kyo, Park Joon-seok

Elenco: Kim Hee-ae , Jang Dong-gun , Sul Kyung-gu , Claudia Kim

Onde assistir:
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