Sonhadora | Crítica
Sonhadora
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Filmes são retratos de sua época. E mesmo uma despretensão como Sonhadora (2005) - daqueles a que se assista com a avó, no sofá, depois do almoço de sábado - reproduz idéias e mensagens de seu tempo.
O estábulo da família Crane é o único que não possui cavalos em toda Lexington, no Estado de Kentucky. É com esse fio de desapontamento que a pequena Cale Crane (Dakota Fanning) começa a contar a história de sua família. O pai Ben (Kurt Russell) e o avô Pop (Kris Kristofferson) um dia administraram um belo haras, mas tropeços acabaram com o negócio e com a relação dos dois. Cale não entende por que seu pai nunca a levou no emprego que ele arrumou desde então. Talvez ele não se orgulhe do que faz.
Ben treina cavalos de corrida para o inescrupuloso Palmer (David Morse), administrador dos puro-sangues de um príncipe árabe residente na cidade. No único dia em que o pai aceita levar a filha para a pista, Ben sente que a vencedora Sonya não está se sentindo bem. Sugere poupá-la. Palmer exige que a fêmea corra. No meio da competição Sonya cai, arrebenta uma pata dianteira. Não há salvação para ela. Diante da filha, Ben se nega a sacrificar Sonya. Perde o emprego e compra o animal condenado.
Não é difícil imaginar o que vem depois disso - mesmo porque as marcas são evidentes. O título em inglês, Dreamer: Inspired by a True Story, já indica que vem superação por aí (história real só vira filme se for história de vitória ou lição de moral). Sonya, Ben logo explica à filha, enquanto luta pela vida da fêmea em recuperação, é abreviação de soñador. Dream, sonhos, sonhar, serão, a partir daí, as palavra que mais se repetem na película. Porque sonho todo mundo tem o seu, e nesse tipo de filme não fica um sem se realizar.
Certeza de vencer é o que falta, hoje, ao desacredito american way. E ver os desígnios de ricos árabes afetarem os destinos do Mundo de Marlboro não deixa de ser uma ponte irônica com a realidade. Que Ben e Cale invertam a lógica maquiavélica a certa altura do filme, quando mais precisam de dinheiro, é o que Sonhadora tem de mais subversivo. De resto, a lógica que vale é tão velha, arraigada na nostalgia americana, que chega a ser irreal: os filhos dos nossos campos nascem prontos, joguemos todas as economias em suas vontade, pois não há páreo para aqueles que sabem competir.
Como se disse, é filme ideal para um sábado à tarde. Não agride visualmente nem faz pensar demais. Qualquer ousadia no jeito de filmar ou qualquer personagem que escape demais ao estereótipo que lhe cabe já começa a inquietar a digestão. São os filmes mais perigoso, porém. Você dá aquele cochilo para acompanhar a avó e guarda, como memória, o plano aberto do sol poente, da menina loira montada, agarrada na crina sedosa, correndo precoce em direção a uma vida de conquistas. Mesmo dormindo, lhe ensinam a apostar - porque não há como perder - na terra da predestinação.



