Sentimentos que Curam | Crítica
Mark Ruffalo estrela comédia condescendente que trata o transtorno bipolar como excentricidade
Traço de diversos filmes indie americanos que fazem o circuito de festivais, a condescendência bate ponto em Sentimentos que Curam (Infinitely Polar Bear, 2014), comédia dramática com Mark Ruffalo e Zoë Saldana que pega o transtorno bipolar emprestado para falar de homens eternamente adolescentes.
O roteiro de Maya Forbes (Monstros vs. Alienígenas, O Roqueiro), estreante na direção, coloca Ruffalo e Saldana nos papéis de dois pais que precisam criar suas filhas em Boston nos anos 1970. A ressaca da década que marcou o fim das ideologias se abate sobre os dois como crise doméstica: o marido sofre de bipolaridade, é internado e afastado da família, mas precisa voltar como "dono-de-casa" quando a mulher decide trabalhar fora para se sustentar.
Desde o início, é com um misto de graça e excentricidade que o filme lida com a doença do protagonista. A escolha equivocada por Ruffalo, um ator que criou dentro desse gênero a imagem de homem acima de tudo charmoso, não consegue dar ao personagem um senso de perigo que é intrínseco ao seu transtorno. Forbes tenta evocar com Ruffalo aquelas figuras masculinas voláteis e frágeis dos dramas domésticos de John Cassavetes nos anos 1970, mas seu filme nunca se arrisca fora da sua zona de conforto - e o risco sempre foi o ingrediente principal dos filmes de Cassavetes.
De modo geral, é como se a bipolaridade surgisse em cena apenas como um pretexto para Sentimentos que Curam reabilitar, sempre de forma condescendente, o velho homem que só entende de vícios e trabalhos manuais e de repente se desestabiliza com mudanças de papéis de gênero. Trechos com canções pop fofas e planos quietos de contemplação ajudam a diluir a carga dramática, de tempos em tempos, e contribuem para a impressão de que estamos neste filme a passeio.
Nos seus melhores momentos, como na cena do churrasco, Maya Forbes consegue ironizar o drama dos pais que tornam tudo tão complicado que não enxergam a independência despertada em suas filhas. Nessa hora, pelo menos Sentimentos que Curam acerta na comédia geracional, e para isso a contribuição das atrizes-mirins Imogene Wolodarsky e Ashley Aufderheide - aí sim um casting certeiro - não é pequena.