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Selma - Uma Luta pela Igualdade | Crítica

A voz dos fantasmas

Omelete
3 min de leitura
05.02.2015, às 13H29.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H43

Desabonado na corrida do Oscar por seus rivais, por cometer supostas injustiças históricas no seu retrato do presidente Lyndon B. Johnson, Selma - Uma Luta pela Igualdade (Selma, 2014) não tem o que reclamar de fatores extrafilme. São justamente eles que se somam para dar força ao longa da diretora Ava DuVernay, lançado no calor de Ferguson e dos demais embates da população negra contra a violência policial nos EUA em 2014.

Ademais, Selma se constrói consciente de registros históricos, escorado em documentos da CIA usados como cartela, para tentar tornar seu drama mais agudo. Seguimos os manifestantes liderados por Martin Luther King Jr. (David Oyelowo, certeiro na reprodução dos trejeitos do pastor) nos dias de marcha de Selma a Montgomery, capital do Alabama, em favor do direito ao voto da população negra no Estado. O paralelo com os dias de hoje, impresso nas demonstrações de desobediência civil, permeia Selma do início ao fim.

Mais do que um filme político, trata-se de um filme politizado, em que a noção de drama que MLK evoca para justificar os atos públicos do seu grupo é pega de empréstimo pela diretora, como uma carta-branca. Tudo em Selma opera sob a lógica do discurso mediado ("até mesmo Jesus conseguiu sua coroa diante de um público", diz a canção de John Legend e Common indicada ao Oscar), em nome de um propósito.

Isso fica claro em cenas como a conversa de MLK com o garoto que liderará a marcha pela ponte na manhã seguinte. A câmera os acompanha dentro de um carro pela noite mas não mostra a vizinhança. Ficamos limitados aos close-ups dos dois homens porque o que importa é o discurso, a marcha (inscrita no mover-se do carro). Não há contexto a ser dado aqui (por onde dirigem, que vizinhança é essa?) porque o contexto na verdade já extrapolou Selma em todo esse extrafilme histórico e geográfico comentado acima.

Se Selma funciona bem dentro dessa estrutura bastante restritiva, até mesmo alienante, é porque a parceria de Ava DuVernay e Oyelowo - iniciada no primeiro longa dela, Middle of Nowhere, de 2012 - aproveita ao máximo a presença do ator, sua impostação de voz. Discurso e propósito precisam de uma fisicalidade, afinal. Se nos filmes de Clint Eastwood como Menina de Ouro o jogo de sombras e luz é feito para pontuar as escolhas morais dos personagens, o chiaroscuro em Selma é antes de tudo uma opção política pela silhueta, pela projeção: o corpo enquanto potencial de ação.

Há muitos corpos em Selma fazendo valer essa promessa de ação. É a multidão na marcha, são as crianças amontoadas depois do atentado. E a câmera hiperlenta nas cenas de violência está ali para sacramentar esses corpos, pronta a congelar a imagem para que jamais esqueçamos deles ou de suas vozes. Em Selma, o martírio - particularmente o assassinato de Martin Luther King, outra memória que assombra o filme sem ser mostrada - é o ato político por excelência.

Selma | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Bom
Selma: Uma Luta Pela Igualdade
Selma
Selma: Uma Luta Pela Igualdade
Selma

Ano: 2014

País: EUA, Reino Unido

Classificação: 10 anos

Duração: 128 min

Onde assistir:
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