Chocantemente competente, Screamboat sabe entregar o que seu público quer

Não dá para dizer que Screamboat: Terror à Bordo desperdiça o nosso tempo. A cena de abertura do longa, que se estende por pouco mais de seis minutos, mostra como o ratinho grotesco interpretado por David Howard Thornton foge de seu calabouço no porão da balsa de Staten Island (EUA) e imediatamente assassina dois funcionários incautos do local com requintes de crueldade. Daí em diante, o filme de Steven LaMorte (também responsável por O Malvado: Horror no Natal, o ótimo “slasher d’O Grinch” lançado em 2022) dificilmente passa mais de 10 minutos sem nos mostrar outro banho de sangue causado pelo personagem, um ritmo do qual poucos exemplares do gênero podem se vangloriar. 

É a evidência de um slasher classe-C que sabe muito bem a fundação cambaleante em que foi construído. Isso porque Screamboat é, obviamente, uma adição à recente onda de filmes de horror inspirados em personagens e produções infantis icônicas que caíram no domínio público - no caso, o curta-metragem O Vapor Willie (1928), que introduziu Mickey e Minnie Mouse ao mundo. Exatamente como fez em O Malvado, LaMorte (também roteirista do longa, ao lado de Matthew Garcia-Dunn) salpica o diálogo e a “mitologia” do seu longa com referências safadas ao catálogo da Disney, brincando no precipício entre a negabilidade plausível e a possibilidade bem real de um processo por direitos autorais do estúdio do Mickey. 

É um humor fácil, desenhado para gerar a risadinha desconfortável do reconhecimento combinado com a vergonha alheia - e funciona, principalmente porque sincroniza bem com a capenguice técnica que se apresenta na tela. A ideia que define Screamboat como produto visual é fazer o seu Mick– quer dizer, Willie ter o tamanho de um rato normal (para os padrões Nova York, pelo menos), desenhando um confronto remanescente do absurdo de um Brinquedo Assassino entre ele e os humanos. Mas Screamboat não tem o dinheiro de Chucky, nem a sabedoria de confiar inteiramente em animatrônicos, de forma que LaMorte se limita a diminuir David Howard Thornton digitalmente, de acordo com as necessidades de cada cena, e evitar mostrá-lo na mesma tomada que suas vítimas.

E não importa o quanto Thornton (elevado a ícone do horror por sua performance excelente como Art na franquia Terrifier) tente nos convencer como Willie, há falhas óbvias nessa estratégia. O vilão, por exemplo, aparece empunhando armas coerentes com a sua estatura - sejam eles facas, lançadores de arpões ou bastões afiados na ponta, os instrumentos do assassino parecem diminutos como ele, porque foram diminuídos junto com ele na pós-produção. Quando chega a hora de atacar os humanos, no entanto, o que poderia ser só um palitinho de dente nas mãos do assassino se torna, é claro, uma arma de tamanho apropriadamente letal. Mas a mudança acontece tantas vezes, e o filme a trata com tanta sem-vergonhice, que o espectador se vê obrigado a rir dela ao invés de denunciá-la como uma quebra de protocolo cinematográfico.

Essa talvez seja a chave para entender Screamboat, e também o ethos de LaMorte como melhor autor dessa leva recente do cinema de terror trash independente americano. Diante de festivais de tédio como Ursinho Pooh: Sangue e Mel e Mouse Trap - A Diversão Agora é Outra, que se perdem em uma pose insustentável de horror hardcore ou em referências que não fazem ideia de como honrar, LaMorte parece ter sido o único que leu as letrinhas minúsculas no contrato que um filme como esse faz com o seu público. Ele entrega diversão barata, com piadas baratas, efeitos baratos, e uma simulação de jornada emocional ainda mais barata do que tudo que listamos aí atrás. 

Screamboat traça muito porcamente a ideia de ser um daqueles filmes sobre Nova York como a cidade dos sonhos, mas o coração do roteiro claramente não está nisso - e não está em lugar nenhum, a bem dizer. Pelo contrário, o longa deixa essa história de coração de lado para entregar, de forma até bastante cerebral, exatamente o que seu público quer: sangue, tripas e piscadelas óbvias para o catálogo da Disney. Para o que Screamboat pode ser, com o orçamento que tem e o nicho em que se encontra, já é mais do que o esperado.

Screamboat: Terror a Bordo

Screamboat

Ano: 2025

País: EUA

Duração: 102 min

Direção: Steven LaMorte

Roteiro: Steven LaMorte, Matthew Garcia-Dunn

Elenco: David Howard Thornton , Amy Schumacher , Jesse Posey , Jesse Kove , Brian Quinn , Tyler Posey , Allison Pittel

Onde assistir:

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