Cena de Presença (Reprodução)

Créditos da imagem: Cena de Presença (Reprodução)

Filmes

Crítica

Presença justifica formato inovador com história que funciona melhor por ele

Soderbergh nos faz observadores em trama sobre tudo o que ignoramos no dia a dia

Omelete
4 min de leitura
03.04.2025, às 09H20.

Gostaria de te lembrar que você tem dois filhos”, alfineta Chris (Chris Sullivan) em conversa com a esposa Rebekah (Lucy Liu) perto do terceiro ato de Presença. A essa altura do filme, até o espectador mais leniente deve achar que a ironia do marido é bem direcionada, já que personagem de Liu passa boa parte do longa ignorando, com obstinação de ferro, os problemas da filha mais nova. Chloe (Callina Liang) tem sofrido para superar o luto após o aparente suicídio de uma de suas melhores amigas. Muito mais dedicada ao filho mais velho, Tyler (Eddy Maday) – a tal ponto que ignora as tendências cada vez mais egoístas e misóginas do rapaz –, Rebekah é uma mulher alfa dada ao prático, que guarda segredos potencialmente sombrios e não se sente equipada ou disposta a lidar com as preocupações humanas de ter uma filha sensível e traumatizada.

É assim que o roteiro de David Koepp (Jurassic Park, Missão: Impossível) se constrói, a partir da observação de personagens que escolhem com muito cuidado, e com pouco escrúpulo, o que devem ver e o que devem ignorar no seu dia a dia. Presença nos apresenta à família em seu centro nos termos de quais deles escolhem o caminho mais fácil - o da anestesia emocional, da redução da vida a uma série de tarefas organizacionais destinadas a potencializar o sucesso - e quais escolhem o caminho mais difícil. E o elemento do terror, dessa tal assombração que vaga pela casa para a qual a família se muda no início da trama, funciona como uma literalização das muitas coisas inexplicáveis ou irredutíveis que essas pessoas preferem ignorar.

Entra em cena o diretor Steven Soderbergh, que tem formado uma dupla formidável com Koepp nos últimos anos (além deste filme, eles fizeram juntos Kimi: Alguém Está Escutando e Código Preto). A dinâmica da parceria tem consistido, basicamente, em Soderbergh se apropriando dos textos maduros e centrados do seu colega roteirista para extrapolar alguma experimentação visual ou brincadeira de gênero: o thriller hitchcockiano atualizado para a era da paranóia digital (em Kimi), a aventura de espiões injetada com subtons adultos e sensuais (em Código), e por aí vai. Mas a quebra de expectativas em Presença talvez seja a mais radical de todas, uma vez que o cineasta escolhe gravar a história de terror familiar de Koepp inteiramente do ponto de vista da própria assombração.

Não é um recurso inteiramente original (David Lowery fez algo parecido com o seu Sombras da Vida, em 2017), mas é uma boa forma de Soderbergh – também diretor de fotografia do projeto – tomar para si a responsabilidade de escrever com a câmera tanto quanto Koepp escreveu com a caneta. Colocando o espectador no lugar da tal presença, o cineasta nos faz observadores inclementes de tudo o que os próprios personagens tentam ignorar, ilustrando na própria imagem as desconfianças que têm uns dos outros, os desapontamentos amargos que só vão saindo na forma de espinhos em conversas mais acaloradas, o perigo que vai, literalmente, rondando cada um deles conforme tomam decisões levianas que poderiam ser evitadas com um diálogo mais aberto. Soderbergh transforma subterfúgio em realidade ao abraçar a perspectiva voyeur que é prerrogativa de uma narrativa que se embrenha tanto na intimidade de uma família.

Conforme o filme nos mostra tudo isso, sua câmera pairando como um fantasma por cima das movimentações da família ou correndo pelos corredores da casa para alcançar alguma conversa secreta que quase perdemos, Presença vai se tornando cada vez mais angustiante. Filmados muitas vezes de longe - são poucos os close-ups do filme, por necessidade do conceito -, os atores que formam o núcleo principal se veem numa posição muito mais teatral do que cinematográfica, expressando os personagens tanto pelos movimentos dentro do ambiente quanto pelo rosto. E Liu brilha nesse sentido, construindo cuidadosamente a montanha de repressões e estresses que define Rebekah, só para deixar que ela desmorone em seus segundos finais na tela.

Talvez aí que Presença se consolide como a colaboração mais frutífera entre Koepp e Soderbergh até agora. Este é, afinal, um filme genuinamente co-autorado entre eles - dois artistas eloquentes e destemidos trabalhando juntos no mesmo sentido expressivo, com a mesma preocupação sobre os efeitos do não dito, do não visto, em vidas que podem ser desarranjadas com facilidade impressionante. Que o filme consiga passar essa mesma apreensão para o público é testamento de sua potência como cinema.

Nota do Crítico
Ótimo

Presença

Presence

Ano: 2024

País: EUA

Duração: 84 min

Direção: Steven Soderbergh

Roteiro: David Koepp

Elenco: Julia Fox , West Mulholland , Eddy Maday , Callina Liang , Chris Sullivan , Lucy Liu

Onde assistir:
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