Não há dúvida de que Os Bombeiros tem uma história valorosa para contar. Não só o filme dirigido e escrito por Kwak Kyung-taek mergulha nos dramas de uma das profissões mais patentemente nobres da humanidade, como também escolhe se aproximar da realidade ao ficcionalizar um incêndio histórico que ocorreu em 2000 numa vizinhança pobre de Seul, capital da Coreia do Sul, galvanizando a luta por melhores condições de trabalho para os bombeiros do país. Difícil pensar em melhores intenções, e de fato Os Bombeiros demonstra força dramática inerente quando se entrincheira nos dramas únicos às vivências de seus personagens principais.
O protagonista da trama é Choi Cheol-woong (Joo Won), um bombeiro novato que entra na corporação em um momento de crise financeira e ainda precisa lidar com dois incidentes letais durante suas primeiras missões em campo. O chefe de bombeiros local, Jeong Jin-seob (Kwak Do-won), culpa (ao menos, em parte) o novo recruta pelos acontecidos, ao mesmo tempo em que é pressionado pela esposa para se aposentar. Ao redor dessas duas figuras principais, Os Bombeiros vai tecendo outras histórias que têm, todas, alguma propulsão dramática - por exemplo: um dos rapazes da trupe tem uma irmã que está se casando com outro bombeiro, e por isso considera se transferir para um papel administrativo a fim de minimizar os riscos à família.
O roteiro de Kwak vai entrelaçando essas tramas, de início, sem muita dificuldade. Não falta experiência ao cineasta - figurinha carimbada do cinema sul-coreano desde o final dos anos 1990, Kwak foi aos poucos se tornando especialista em dramas humanos com algum elemento de suspense ou ação, como Tufão (2005) e A Face Obscura do Crime (2018). A dosagem de gêneros é comedida, e Os Bombeiros aos poucos mostra que sua aposta é mais no vai e vem dos relacionamentos entre os personagens do que nas missões de resgate em que eles se envolvem. Até porque o orçamento, a julgar pela qualidade dos efeitos nos grandes incêndios, claramente não permite que o filme se torne uma sucessão de cenas de adrenalina.
De fato, o diretor parece entrar no modo de controle de danos quando as coisas esquentam (perdão pelo trocadilho), manejando os seus cenários e ângulos para não revelar o verdadeiro escopo do que a produção é capaz de pagar. O resultado, infelizmente, são cenas estendidas de salas esfumaçadas com iluminação levemente alaranjada, pelas quais os personagens andam com muita dificuldade à procura de vítimas para resgatar. Falta senso de espaço, de urgência, e portanto falta senso de perigo. O risco de cada aventura para dentro dos prédios em chamas se perde, enfim, diante da falta de um ambiente realmente cinematográfico para elas se desenvolverem.
E, conforme o filme se aproxima do terceiro ato, fica mais difícil relevar essa insuficiência técnica. As linhas narrativas estabelecidas pelo roteiro, afinal, vão todas se encaminhando na direção de um clímax explosivo… no sentido literal, mesmo. É aí que Os Bombeiros vai perdendo a aliança do espectador, porque sabemos o que esperar dessa última escalada de tensão, e nos vemos querendo que os créditos subam logo. Essa trama não termina bem para a maioria dos personagens, como qualquer um inteirado da história real poderia esperar, mas a verdadeira tragédia de Os Bombeiros é a de um filme que deixa boas histórias escaparem por seus dedos, por não conseguir se esticar o bastante para contê-las.
*Os Bombeiros foi exibido na 14ª Mostra da Cinema Coreano no Brasil.
Os Bombeiros
소방관
Ano: 2024
País: Coreia do Sul
Duração: 106 min
Direção: Kwak Kyung-taek
Roteiro: Kwak Kyung-taek
Elenco: Joo Won , Lee Jun-hyuk , Lee Yoo-young , Kwak Do-won
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