Uma comunidade rural isolada, rituais religiosos, lendas locais, símbolos misteriosos: todos os elementos para um folk horror tradicional estão presentes em O Senhor do Caos. É por isso que é tão frustrante ver o novo terror de William Brent Bell (Boneco do Mal, A Orfã 2) colapsar em si mesmo. Nesta história, que acompanha o desaparecimento de uma garota em um pequeno vilarejo inglês, o que falta é mistério - e toda a atmosfera sinistra e surreal que deveria vir com ele.
Quem lidera a narrativa é Rebecca (Tuppence Middleton), nova reverenda da igreja de Berrow, que se mudou há menos de um ano para a cidade e ainda se acostuma com as tradições locais. A principal delas, um ritual anual pela colheita, encena a expulsão do espírito maligno Gallowgog e, com isso, abençoa as plantações para o próximo ano. É precisamente nesta encenação que a pequena Grace, filha de Rebecca, some, e partimos em uma investigação do que de fato se passou com a garota. Os habitantes de Berrow, pretensos aliados da reverenda, ajudam até a página dois, quando Rebecca percebe que seu isolamento parece ir muito além do geográfico.
Tudo poderia funcionar muito bem se, talvez, Bell apostasse no bem que vem com a confusão do público. Mas as evidências são entregues ao espectador sem nenhuma cerimônia, desde a introdução sinistra de Jocelyn Abney (Ralph Ineson), que literalmente diz que Grace foi levada por uma entidade, até os rituais pagãos que todos os cidadãos praticam em frente às câmeras. Ao invés de deixar o mistério se desenrolar por si só - e nos deixar confusos ao lado de Rebecca - O Senhor do Caos não é nada caótico, e simplesmente nos coloca para assistir à pobre protagonista, sem nenhuma pista, bater com a cara em cada rejeição que recebe dos habitantes de cidade.
Nesse contexto, não há trilha de cordas sinistra que acompanhe a densa floresta de Berrow ou símbolos misteriosos o suficiente para sustentar um real assombro de O Senhor do Caos. Mesmo que auxiliado por um ótimo elenco - Tuppence Middleton é perfeitamente empática e Ralph Ineson é sempre um deleite de assistir (e ouvir) - e uma história promissora, a falta de atmosfera sinistra é um pecado para um suposto terror folk. Para completar, o filme cai na armadilha inevitável de remeter a A Bruxa (pela história, gênero, cenário e a escalação de Ineson) - e essa é uma comparação que seria injusta para a enorme maioria dos filmes de terror.
O Senhor do Caos também não tem vontade de preencher seu terror com truques mais fáceis e, sem nem um jumpscare, acaba funcionando mais como mistério fajuto do que um filme assustador. É uma pena, porque tinha todos os recursos para funcionar. No fim das contas, Brent Bell acabou provando que não é riscando checklist que se faz um bom terror.
Ano: 2023
País: Reino Unido/Irlanda
Duração: 104 min
Direção: William Brent Bell
Roteiro: Tom de Ville
Elenco: Ralph Ineson, Tuppence Middleton