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O Que Fazer em Caso de Incêndio? | Crítica

Se pretende ser revolucionário, o longa acaba se acomodando mais que seus protagonistas

18.06.2003, às 00H00.
Atualizada em 14.11.2016, ÀS 09H00

Antes de tudo, o trailer de O Que Fazer em Caso de Incêndio? (Was Tun, Wenns Brennt?, 2001) anuncia a "transgressão", que poderia ser o slogan deste filme. Mas não é. No ano de 2001, seis ex-anarquistas berlinenses precisam se reunir, pois uma bomba caseira instalada pelo grupo no longínquo 1989, que parecia ter falhado, acaba de explodir. Nestes doze anos muita coisa mudou. Agora, apenas Tim (Til Schweiger) e Hotte (Martin Feifel) seguem a ideologia, enquanto os demais viraram advogados, publicitários egocêntricos, mães, patricinhas. Se a lavagem de roupa suja não fosse obstáculo suficiente, o grupo ainda deve se preocupar com a polícia, que  investiga a explosão.

Mas não demora muito até que o público conheça a resposta à pergunta do título: "Em caso de incêndio, deixe queimar!", gritam os seis em coro, ao relembrar os velhos tempos. Com isso, o filme alemão assume de vez a sua vocação rebelde. Uma comédia inusitada que aborda a transformação política pós-queda do muro. Promissor, não?

Mas cuidado. Se você comprou a proposta do diretor alemão Gregor Schnitzler, é bem possível que se decepcione diante da expectativa criada.

O prólogo do filme anuncia o tom, ao exibir imagens do suposto ano de 89. Como nas introduções das histórias de Asterix, uma lupa detalha no mapa de Berlim a rua Machnow, onde reside a brava "resistência" contra os capitalistas e as grandes corporações. Até aí, ok, o filme tomará a defesa dos anarquistas de maneira bem humorada. Mas logo a trama descamba para uma abordagem periférica, na qual não faltam os clichês mais desprezíveis das comédias românticas hollywoodianas.

Primeiro, as caracterizações do publicitário Maik (Sebastian Blomberg), do advogado Terror (Matthias Matschke), da mãe devotada Nele (Nadja Uhl) e da loirinha Flo (Doris Schretzmayer) seguem um esquema de caricaturas e obviedades. Segundo, se já não há indícios de aprofundamentos nas discussões ideológicas e políticas, o clima amoroso entre Flo e o canastrão Tim toma o primeiro plano. Esse filme você já viu. Um amor mal-resolvido no passado ganha a chance de redenção anos depois.

Não à toa, O Que Fazer em Caso de Incêndio?, segundo longa de Schnitzler, tem distribuição da Columbia Pictures. A fórmula pronta vem embalada por uma linguagem de cortes secos, câmeras aceleradas e medalhões na trilha-sonora, como Richard Ashcroft (ex-The Verve). Enfim, toda espécie de pieguice moderninha que, em teoria, não combinaria com o ideário anarquista.

O ápice da nostalgia infantil acontece quando o grupo decide construir uma nova bomba usando a carcaça de um extintor de incêndio. Ao abrir o cilindro, uma chuva de espuma consuma a amizade colorida do grupo, como num comercial de xampu, ao som de "No Surprises", do Radiohead. Uma música de letra aparentemente conformista, cuja irônica tristeza, conclui-se, não foi captada por Schnitzler. Ou o diretor é muito cruel em relação aos utopistas ou é muito ingênuo.

Passadas as reconciliações, chega o acerto de contas com a polícia, a segunda parte do filme. E o vaivém de fugas e perseguições mostra-se tão previsível quanto a porção emotiva. Não é de se estranhar: o detetive inteligente e compreensível, prestes a se aposentar, que precisa aturar as ordens de um jovem chefe convencido, é a cara do Tommy Lee Jones. No clímax da vez, o grupo de anarquistas piqueteiros se vinga ao tomar um tanque e direcionar um jato de água sobre os policiais. Sem dúvida, simpático. Mas chega a ser patético.

Quer outro exemplo do reacionarismo? No começo do filme o grupo ataca uma fábrica da Mercedes Benz; no desfecho, um carro da montadora serve de veículo para a fuga dos heróis. Enfim, para um filme que pretende ser rebelde, a fórmula utilizada é bem mais do que preguiçosa. E isso estraga a obra inteira.

Nota do Crítico
Regular
O Que Fazer em Caso de Incêndio
What to do in Case of Fire
O Que Fazer em Caso de Incêndio
What to do in Case of Fire

Ano: 2002

País: Alemanha

Classificação: LIVRE

Duração: 101 min

Onde assistir:
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